24 agosto 2009
Artigo
A Mídia, a Política e a Cultura
*Por Leonardo Brandt
Tempos efervescentes estes em que a mídia, assim como toda a indústria cultural dominante, se vê pateticamente fragilizada diante do poder caótico e incontrolável das novas possibilidades de comunicação da cultura digital. Mas a grande mídia está longe de perder sua pompa e poder. Ela ainda resiste e tenta dialogar com processos mais amplos e participativos. Há muito mais entre a guerra entre Globo e Record, a sucessão presidencial e cultura digital, do que pode imaginar a nossa vã filosofia!
Da pífia sabatina do ministro da Cultura na Folha à guerra declarada entre Globo e Record, não nos resta espaço para discutir, de maneira abrangente, contemporânea, deseologizada ou descontaminada de interesses financeiros, a crise da mídia cultural no Brasil. Este tema é fundamental para os gestores de cultura, pois toca diretamente na constituição do nosso imaginário público e a nossa noção de Estado, nação, povo e país.
O desprestígio e a falta de assunto dos cadernos de cultura é tão grande, que as capas tem sido, sistematicamente, ocupadas por anúncios gigantes da indústria da moda. Os conteúdos não diferem muito disso. Muitas vezes o assunto mais relevante do caderno restringe-se às tirinhas do Calvin ou o horóscopo.
Falta uma compreensão do funcionamento dos mecanismos de financiamento e da lógica da cultura em sua função pública, tanto pela dimensão econômica quanto pela sociocultural. Alguns veículos tentam, feito cegos em tiroteiro, compreender e cobrir essa complexidade, mas não há tempo nem espaço suficiente. Um debate mais profundo faz-se necessário.
Não há como negar o quanto o ministro Juca Ferreira é astuto nesse sentido. Provocou uma discussão rasteira, por saber que a mídia jamais seria capaz de alcançar a sua sutileza e seus desdobramentos conceituais, filosóficos e econômicos. De quebra projetou-se de maneira ímpar na grande mídia, superando até mesmo o seu antecessor, que já era um popstar.
Nos mesmos cadernos vejo com grande insistência o acompanhamento do Ibope e a comparação pelo troféu da mediocriadade entre A Fazenda e o BBB. Até o nosso festival de Gramado foi palco de badalação e disputa entre “astros” da Record e da Globo. O pano de fundo dessa disputa por nosso imaginário é composto por igrejas (sim, ninguém fala da relação entre católicos e Globo), poderes instituídos (executivo, congresso, judiciário, ministério público) e uma vindoura disputa presidencial, capaz de mexer profundamente com todas as peças desse tabuleiro.
Vale observar de perto o tipo de cobertura que a pré-candidata Marina Silva terá. A própria fala do ministro já serviu de ataque à candidatura da ministra, tamanha ameaça ela prenuncia neste cenário de miséria cultural. Isso já demonstra o grande potencial mitológico da ex-ministra, papel amplamente ocupado pelo atual presidente, por sua biografia até então única no cenário político nacional.
Marina foi a única ministra de Lula que implementou políticas coerentes com o seu passado e o com momento peculiar e favorável que o Brasil vive hoje. A única que saiu bem, depois de dialogar ao máximo com todas as instâncias de poder. Note, no entanto, que a repercussão internacional da saída de Marina do governo, e agora do PT, foi mais importante que a cobertura interna.
Semana passada estive em Nova Iorque, gravando entrevistas para um webdocumentário sobre a indústria cinematográfica. Além de ouvir e debater com estudiosos no assunto, usei meu tempo livre para acompanhar a mídia norte-americana, dos jornalões aos notíciários locais.
Percebi de perto o quanto a Era da Cultura Digital, que elegeu o primeiro presidente negro dos Estados Unidos, influencia cada vez as discussões públicas naquele país. Talvez seja um prenúncio de como esses novas possibilidades podem se expandir e se consolidar aqui nas Terra Papagallis.
Às novas possibilidades de participação política, o nosso apoio!
*Editor do sítio 'CulturaeMercado' http://www.culturaemercado.com.br
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