12 outubro 2009
Comunicação em debate
Lula, o mito do Brasil
*Por Leonardo Brant
O que acontece com a política para o audiovisual brasileiro quando Luiz Carlos Barreto se junta à Rede Globo para lançar o filme com a história de um presidente que é um mito, num ano de eleições? Talvez nada demais. Mas se observarmos a composição ministerial deste presidente e evidenciarmos a indelével presença de ministros e funcionários da mesma Rede Globo atuando em prol dos seus interesses, a análise tende a ficar um pouco mais complexa.
A pré-estreia do filme da família Barreto sobre a história de Lula foi adiada por medo da pirataria. O Ministério da Justiça apressou-se para lançar um plano, junto com a Ancine, de combate à venda ilegal de DVDs pelos camelódromos de todo o país. Isso só reforça a política audiovisual brasileira, que distribui mais dinheiro às majors norte-americanas do que à produção nacional. Desde a adoção do artigo 3º, que dá isenção fiscal às empresas de cinema norte-americanos, nenhum filme brasileiro independente conseguiu lugar nas telonas. Todos os filmes com mais de 1 milhão de expectadores, desde então, pertecem às chamadas majors.
Não é de hoje que a política de comunicação brasileira atende aos interesses do maior conglomerado de comunicação da América Latina. Nosso ministro das comunicações, Helio Costa, foi seu funcionário, assim como o ministro da propaganda, Franklin Martins. Isso sem contar a presidente da TV Brasil, Tereza Cruvinel, que refez toda a incômoda estrutura moldada por Eugenio Bucci e gerida politicamente Orlando Senna, apagando de vez o rastro do participativo Fórum de TVs Públicas.
O país levou a serio a necessidade de criar o seu próprio arsenal simbólico, ou neste caso, mitológico. As oligarquias regionais, sobretudo do nordeste, formaram sua rede de proteção sob as barbas do nosso messias. Fernando Collor, Sarney e companhia limitada, têm algo mais em comum. São donos de repetidoras da Globo em seus estados.
Não quero com isso tudo dizer que o Lula é o responsável por esse imbricamento entre Estado e mídia, muito pelo contrário. A maior vítima histórica disso tudo é o próprio Lula, quem não se lembra da cobertua global das eleições de 1989? Mas parece haver um misto de conformismo com os poderes já estabelecidos, misturado com um certo cabotinismo, próprio do poder. O que antes servia a interesses escusos, agora é válido, pois serve aos interesses do Brasil e sua necessidade de gerar novos herois e mitos.
Há dois elementos dessa discussão que gostaria de ampliar e compartilhar com os leitores e participantes ativos de Cultura e Mercado. O primeiro é o webdocumentário que venho desenvolvendo desde o começo do ano e que será lançado na Espanha no começo de dezembro. Seu nome provisório é Te Están Grabando, mas deve, por sua imprevisível tendência a abordar as novas mídias, a mudar de nome para Ctrl V :: Video Control.
O webdoc traz uma discussão sobre o fenômeno Hollywood, dimensões e efeitos do imbricamento dessa indústria com o Estado norte-americano (yes, nós temos banana), sobretudo nas relações internacionais, culminando com a publicação da Convenção da Unesco pela Diversidade Cultural, coisa que estive intimamente ligado como ativista internacional (vide Divercult.net).
E a outra é a publicação de um artigo encomendado pela YP, da Espanha, sobre a evolução histórica do audiovisual no Brasil, de D.João aos dias de hoje. Ali traço um paralelo entre o cinema e os meios de comunicação de massa em sua relação com mercado e poder central. Para lê-lo (em castellano) na íntegra, basta acessar: www.ypsite.net e dirigir-se à biblioteca.
E, ainda, dois fatos mundiais de extrema importância. Ao escrever este, acompanho de perto a movimentação do Senado argentino, que tenta mudar a lei de comunicação, que permite o monopólio e concentra poder nas mãos dos conglomerados de mídia. O Brasil ensaiou discutir este assunto, que voltará à baila na já conturbada Conferência de Comunicação, marcada para o início de 2010.
Os artistas e profissionais da cultura precisam participar dessa discussão!
*Leonardo Brant - Pesquisador e consultor de políticas culturais. Presidente da Brant Associados, autor do livro "O Poder da Cultura", entre outros. Documentarista, diretor de "Te Están Grabando".
**Fonte: sítio Cultura e Mercado http://www.culturaemercado.com.br
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