22 setembro 2012

Poema



Marília de Dirceu

Lira IV

Já, já me vai, Marília, branquejando
Louro cabelo, que circula a testa;
Este mesmo, que alveja, vai caindo
E pouco já me resta.

As faces vão perdendo as vivas cores,
E vão-se sobre os ossos enrugando,
Vai fugindo a viveza dos meus olhos;
Tudo se vai mudando.

Se quero levantar-me, as costas vergam;
As forças dos meus membros já se gastam,
Se vou andar pela  casa uns curtos passos,
Pesam-me os pés, e arrastam.

Se algum dia me vires desta sorte,
Vê que assim me não pôs a mão dos anos:
Os trabalhos, Marília, os sentimentos,
Fazem os mesmos danos.

Mal te ver, me dará em poucos dias
A minha mocidade o doce gosto;
Verás burnir-se a pele, o corpo encher-se,
Voltar a cor ao rosto.

No calmoso Verão as plantas secam;
Na Primavera, que aos mortais encanta,
Apenas cai do Céu o fresco orvalho,
Verdeja logo a planta.

A doença definha a quem padece;
Mas logo que a doença faz seu termo,
Torna, Marília, a ser quem era dantes,
O definhado enfermo.

Supõe-me qual doente, ou mal a planta,
No meio da desgraça, que me altera;
Eu também te suponho qual saúde,
Ou qual a Primavera.

Se dão esses teus meigos, vivos olhos
Aos mesmos Astros luz, e vida às flores,
Que efeitos não farão, em quem por eles
Sempre morreu de amores?

                    Tomaz Antônio Gonzaga 

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