31 dezembro 2013
A reaparição do Subcomandante Marcos nos 20 anos do levante zapatista
Às vésperas de se completarem duas décadas do levante zapatista, o subcomandante Marcos reapareceu com um novo e extenso comunicado
San Cristobal de las Casas – A prosa está intacta. Sutil e envolvente como o sol da tarde que envolve a praça central de San Cristobal de las Casas. Às vésperas de se completarem duas décadas do levante zapatista, o subcomandante Marcos reapareceu com um novo e extenso comunicado semeado com a ideia da “memória e da rebeldia”.
Na abertura, Marcos cita a novela do escritor norte-americano Herman Melville, Moby Dick. Encontro de uma prosa com outra: “Me parece que temos confundido muito esta questão da Vida e da Morte. Me parece que o que chamam de minha sombra aqui na terra é minha substância autêntica”, diz a prosa de Melville. A de Marcos completa o resto do comunicado. O subcomandante, que há uns cinco anos não aparecia em público, escreve: “É território zapatista, é Chiapas, é México, é América Latina, é a Terra. E é dezembro de 2013, faz frio como há 20 anos, e, como então, hoje há uma bandeira que nos cobre: a da rebeldia”.
Em outro momento de seu comunicado, Marcos acrescenta: “Porque a rebeldia, amigos e inimigos, não é patrimônio exclusivo dos neozapatistas. Ela é patrimônio da humanidade. E isso é algo que é preciso celebrar. Em todas as partes, todos os dias e em todas as horas. Porque a rebeldia é também uma celebração. Não são poucas nem débeis as pontes que, desde todos os rincões do planeta Terra, se estenderam até estes solos e céus. Às vezes com olhares, às vezes com palavras, sempre com nossa luta, temos nos cruzado para abraçar esse outro que resiste e luta”.
Ao longo do texto em que se alternam parágrafos poéticos, guerreiros ou irônicos, o Subcomandante zapatista presta homenagem a todos aqueles que, de uma maneira ou de outra, acompanharam o levante de 20 anos atrás: “Aos que, durante a noite, colocaram nas costas a mochila e a história, aos que tomaram com as mãos o relâmpago e o trovão, aos que calçaram as botas sem futuro, aos que cobriram o rosto e o nome, aos que, sem esperar nada em troca, morreram na longa noite para que outros, todos, todas, em uma manhã ainda por vir, possam ver o dia como é preciso fazê-lo, ou seja, de frente, de pé, com o olhar e o coração erguidos. Para eles, nem biografias nem museus. Para eles, nossa memória e rebeldia. Para eles nosso grito: Liberdade! Liberdade! Liberdade! Saúde e que nossos passos sejam tão grandes como nossos mortos”. (...)
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A revolta de Chiapas, 20 anos depois
San Cristóbal de las Casas, Chiapas – Gaspar Morquecho Escamilla se recorda como se fosse ontem, na praça central de San Cristóbal de las Casas. Passaram-se 20 anos daquele 1º de janeiro de 1994. A madrugada assomava no céu quando, no meio do entrevero da praça ocupada pelos zapatistas, apareceu o Subcomandante Marcos. Foi o primeiro jornalista que falou com ele naquele nascente ano novo que iria marcar para sempre a história do México e da América Latina.
Já se passaram anos e anos, e também balas e mortos, prisões e injustiças. Ocorreram críticas e zombarias, mas Marcos e os zapatistas seguem aqui, presentes. Há quem diga que estão mortos, esquecidos, caídos no poço da história. Mas não. Felipe Arizmendi Esquivel, bispo da diocese local, diz: “muita gente pergunta se ainda existe o Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN) e eu lhes digo que não só existe, como tem presença, força, planos e projetos, não é algo do passado, nem semi-morto”.
Ocorreram tantas coisas que seria preciso detalhá-las por ordem alfabética. Isso pode ser visto, a céu aberto, de um lado da praça, em frente à catedral. Agora instalaram uma pista para patinar sobre o gelo e um tobogã para deslizar-se no presente. A rua Real de Guadalupe é uma miniatura da oferta ultra-liberal. As marcas internacionais tem seu lugar, se oferece “pão europeu”, há bares com nomes em inglês, não menos de quatro restaurantes argentinos e uma infinidade de butiques de luxo que vendem roupa e essa pedra suave como a lua que é o âmbar. “Os indígenas surfam entre essas modernidades”, diz com um tom de lucidez neutra um jovem em um dos muitos bares da moda que se esparramam ao longo da Real Guadalupe.
Em um mundo muito diferente deste, Gaspar Morquecho Escamilla se encontrou na praça com o Subcomandante. Este jornalista se instalou em San Cristóbal e sempre trabalhou com comunidades e povos indígenas “com a pretensão de criar organizações sociais e políticas para fazer a revolução neste país”. E precisamente neste lugar “1994 nos agarrou”’. Gaspar lembra que em 1993 o tema dos movimentos armados em Chiapas era frequente. Em dezembro daquele ano, a agitação se tornou mais visível, mas ninguém calculou que a ofensiva iria explodir tão rapidamente. Escamilla lembra que uma mulher das comunidades indígenas perguntou a ele: será que haverá guerra? E houve, apesar das condições adversas que naquele momento predominavam para lançar uma guerra contra o governo do então presidente Carlos Salinas de Gortari.
Chiapas foi e é pobre. Os frutos da reforma agrária aplicada depois da revolução de 1910 não chegaram a estas terras. Marcos e os zapatistas tomaram as ruas para exigir uma repartição mais equitativa das riquezas e a propriedade das terras que nunca esteve nas mãos dos camponeses. Na declaração da Selva de Lancadona (1993), os zapatistas expressaram claramente os objetivos: “luta por trabalho, terra, moradia, alimentação, saúde, educação, independência, liberdade, democracia, justiça e paz...conseguir o cumprimentos destas demandas básicas de nosso povo formando um governo de nosso país livre e democrático”.
Em uma carta do Subcomandante de fevereiro de 1994, Marcos ampliou os objetivos com essa poesia e ironia verbal que o caracteriza: “Tomado do poder? Não, apenas algo mais difícil: um mundo novo”. Em dezembro de 1993, o Exército Zapatista de Libertação Nacional apelou ao artigo 39 da Constituição mexicana como argumento para a derrubada do presidente Carlos Salinas de Gortari, a quem acusavam de ter vencido as eleições de 1988 com uma “fraude eleitoral de enormes proporções”. Nas primeiras horas de janeiro de 1994, o EZLN ocupou San Cristóbal de las Casas e outros seis municípios. “Neste momento, eu era o único jornalista na praça”, diz Gaspar.
Em vinte anos, o mundo se renovou em Chiapas, mas segundo a ordem imposta pelo consumo universal. As estatísticas são uma constante linha para baixo: quase 79% da população vivem em uma situação de pobreza. A adversidade atinge as etnias tzeltal, tzotzil, tojolabal ou chol, sempre marginalizadas. Os dados não tiram o otimismo de Gaspar Morquecho Escamilla. “Estamos frente a um movimento, o EZLN, que tem 44 anos. Declararam a guerra nas piores condições que podem existir no mundo e localmente enfrentando um cenário adverso para qualquer movimento armado. Mas já levam 20 anos de resistência com uma campanha de contra-insurgência que começou em 1995. E aí estão. É um movimento de resistência com grande capacidade em termos de organização e mobilização, com sistemas de saúde, de transporte, de produção, abastecimento e comunicação”.
Sobre isso não há dúvidas. O EZLN impulsiona há muitos anos um processo que tende a deixar nas mãos do povo a gestão política e as organizações sociais. Assim foram surgindo os municípios autônomos que logo passaram a fazer parte dos cinco caracóis e das cinco juntas de bom governo regidas por sete princípios: 1. Servir e não se servir; 2. Representar e não suplantar; 3. Construir e não destruir; 4. Obedecer e não mandar; 5. Propor e não impor; 6. Convencer e não vencer; 7. Baixar e não subir. “Aqui manda o povo e o governo obedece”, proclama um cartaz de uma zona sob controle zapatista. A utopia tem voz e rosto. E muitas ameaças que a cercam.
Tradução: Marco Aurélio Weissheimer - Via Carta Maior
30 dezembro 2013
Líder da oposição em Minas diz que controle do PSDB sobre a mídia atrasa julgamento do mensalão tucano
Deputado que identificou valerioduto acusa irmã de Aécio de comandar censura em Minas
Por Lúcia Rodrigues, em Belo Horizonte* (do Viomundo)
A explicação para que o mensalão tucano e outros escândalos que envolvem políticos do partido não repercutam em Minas Gerais tem nome, segundo o deputado estadual Sávio Souza Cruz (PMDB-MG), líder do bloco Minas Sem Censura, na Assembleia Legislativa do Estado. Trata-se de Andréa Neves, irmã mais velha do senador Aécio Neves (PSDB-MG).
O parlamentar se refere a ela como a “Goebbels das Alterosas”, em uma clara alusão ao ministro da propaganda nazista, Joseph Goebbels, que exercia forte controle sobre os meios de comunicação da Alemanha.
De acordo com Sávio, Andréa comanda o controle à mídia mineira com mão-de-ferro, para evitar que o irmão e políticos aliados sejam atingidos por notícias desfavoráveis.
Formada em jornalismo pela PUC Rio, Andréa integra desde 2003, quando Aécio assumiu o Executivo, o Grupo Técnico de Comunicação do Governo de Minas Gerais. O núcleo estratégico reúne representantes de empresas públicas e dos órgãos da administração direta, responsáveis pelas áreas de comunicação.
O deputado oposicionista relata que a maioria das empresas privadas sediadas em Minas está concentrada nas áreas de mineração, siderurgia e metalurgia, e que estas normalmente não são grandes anunciantes na imprensa local. Isso confere ao governo mineiro poder e controle sobre a mídia, por ter peso decisivo como anunciante preferencial.
Tudo dominado
É por isso que escândalos como o do mensalão tucano quase não reverberam nas páginas dos noticiários locais. Ao ser anunciante de destaque, o governo cuida de abafar o que o desfavorece. O controle exercido por Andréa evita que em Minas os tucanos apareçam de forma negativa na mídia.
Sávio tem esperança de que a situação se inverta, mas ressalta que a pressão exercida sobre os vários setores do Estado e da sociedade é praticamente total.
“Aqui tá tudo dominado… Produzimos um Aécinho Malvadeza. A Assembleia [Legislativa] está de joelhos. Se o governador mandar pra cá um projeto revogando a Lei da Gravidade, a Assembleia aprova. A imprensa, comprada, sempre disposta a publicar os releases da Andréa Neves. O nosso Ministério Público não denuncia os mal-feitos do governo. E o Tribunal de Contas se converteu em um tribunal do faz de contas”, denuncia. (...)
28 dezembro 2013
Os jornalistas mais reacionários de 2013: minha seleção (Paulo Nogueira)
Bem, final de ano é tempo de retrospectiva.
O DCM acompanhou a mídia com atenção, e então vai montar sua seleção de jornalistas do ano, o Time dos Sonhos do atraso e do reacionarismo, o TS, o melhor do pior que existiu na manipulação das notícias.
A cartolagem é parte integrante e essencial do TS: Marinhos, Frias, Civitas, Mesquitas etc.
À escalação:
No gol, Ali Kamel, diretor de jornalismo da TV Globo. Devemos a ele coisas como a magnífica cobertura da meia tonelada de cocaína encontrada no famoso Helicóptero do Pó, pertencente à família Perrella.
Kamel é também notável pela sagaz tese de que não existe racismo no Brasil, algo facilmente comprovável pelo número de colegas negros de Kamel na diretoria da Globo.
Na ala direita, dois jogadores, porque pela esquerda ninguém atua. Reinaldo Azevedo e Augusto Nunes são os selecionados. Os blogueiros da Veja são entrosados, e pô-los juntos facilita o trabalho de treinamento do TS.
Azevedo se notabilizou, em 2013, por ser comparado por diferentes mulheres a diferentes animais, de pato a rottweiler.
Nunes brilhou por lances de genialidade e inteligência – e total ausência de preconceito — como chamar Evo Morales de “índio de franja” e classificar Lula de “presidente retirante”.
Uma disputa interessante entre Nunes e Azevedo é ver quem utilizou mais a palavra “mensaleiros”. Gênios.
Na zaga, uma inovação: duas mulheres. Temos a cota feminina no TS do DCM. Eliane Cantanhede, colunista da Folha, e Raquel Scherazade, a versão feminina de Jabor.
Ambas defenderam valentemente o país dos males do lulopetismo, e fizeram a merecida apologia de varões de Plutarco da estatura de Joaquim Barbosa, o magistrado do apartamento de Miami.
No meio de campo, três jogadores de visão: Jabor, Merval e Míriam Leitão. Sim, a cota feminina subiu durante a montagem do TS.
Jabor se celebrizou em 2013 pela rapidez com que passou da condenação absoluta à louvação incondicional das jornadas de junho quando seus superiores na Globo lhe deram ordem para mudar o tom.
Merval entrará para a história pelo abraço fraternal em Ayres de Britto, registrado pelas câmaras. Merval conseguiu desmontar a tese centenária e mundialmente reverenciada de Pulitzer de que jornalista não tem amigo.
E Míriam Leitão antecipou todas as calamidades econômicas que têm assaltado o país, a começar pela redução da desigualdade e pelo nível de emprego recorde.
Numa frase espetacular em 2013, Míriam disse que só escreve o que pensa. Aprendemos então que ela é tão igual aos patrões que poderia ser o quarto Marinho, a irmãzinha de Roberto Irineu, João Roberto e Zé Roberto.
No ataque, dois Ricardos, também para facilitar o entrosamento. Ricardo Setti e Ricardo Noblat. Setti foi uma revelação, em 2013, no combate ao dilmismo, ao lulismo, ao bolivarianismo, ao comunismo ateu e à varíola. Noblat já é um jogador provado, e dispensa apresentações. Foi o primeiro blogueiro a abraçar a honrosa causa do 1% no Brasil.
Para completar o trio ofensivo, Eurípides Alcântara, diretor da Veja. Aos que temiam que a Veja pudesse se modernizar mentalmente depois da morte de Roberto Civita, Eurípides provou que sempre se pode ir mais adiante.
Suas últimas contratações são discípulos de Olavo de Carvalho, o astrólogo que enxerga em Obama um perigoso socialista. Graças a Eurípides, em todas as plataformas da Veja, o leitor está lendo na verdade a cabeça privilegiada de Olavo.
Na reserva do TS, e abrindo espaço para colunistas que não sejam necessariamente jornalistas, dois selecionados.
O primeiro é Lobão, novo colunista da Veja e novo olavete também. No Roda Viva, Lobão defendeu sua reputação de rebelde ao fugir magistralmente de uma pergunta sobre o aborto.
O outro é o professor Marco Antônio Villa, que conseguiu passar o ano sem acertar nenhuma previsão e mesmo assim tem cadeira cativa em todas as mídias nacionais.
O patrono do TS é ele, e só poderia ser ele: José Serra.
Mas Joaquim Barbosa pode obrigar Serra a cedê-la a ele, JB, nosso Batman, nosso menino pobre que mudou o Brasil e, nas horas vagas, arrumou um emprego para o júnior na Globo.
*Por Paulo Nogueira (jornalista; fundador e diretor editorial do site de notícias e análises Diário do Centro do Mundo).
...
*NOTA do Blog 'O Boqueirão Online': Em que pese os serviçais, digo, os 'jornalistas' gaúchos do PiG** não terem postura muito diferenciada de seus coleguinhas acima elencados pelo DCM, nenhum deles constou na seleção realizada pelo Paulo Nogueira. Talvez devido ao fato de que suas 'opiniões' não tenham tido o eco que pretendiam, ficando restritas mais às plagas terrunhas (via RBS, ZH, CP etc. e seus satélites locais e regionais), sendo superados olimpicamente pelos rottweilers, digo, 'calunistas' do centro do país. Mas que eles (@s guascas terrunhos, tipo mendelskis, laziers, bahias etc, sim, com letras minúsculas!) merecem também constar numa 'seleção' (específica) do atraso e do reacionarismo sulino, merecem, sem sombra de dúvida... o que acham?!
Contribuições para a formatação dessa 'seleção' podem ser encaminhadas ao Editor do Blog. (Júlio Garcia)
**Pescado do http://o-boqueirao.blogspot.com.br/
'Ninguém pode prender meus sonhos'
Ninguém pode prender meus sonhos
O sonho de um Brasil livre da ditadura me levou à luta, à prisão e anos e anos longe de minha família e meu país.
O sonho de fazer um partido que desse voz aos trabalhadores e lutasse por eles me levou a ser um dos fundadores do PT.
O sonho de tornar um operário presidente da República fez com que eu trabalhasse muito em todo o país.
O sonho que tinha de ser declarado inocente porque nada fiz e não há nenhuma prova contra mim virou uma injustiça com a condenação.
Mas quem sonhou a vida toda por um Brasil melhor, com menos miséria, sem fome, com mais valor aos trabalhadores, não pode parar de sonhar.
O peso da injustiça pode tudo. Só não pode prender meus sonhos.
Que você realize todos os seus sonhos no ano novo.
27 dezembro 2013
Álvaro Garcia Linera: Às esquerdas da Europa e do mundo
Falando no IV Congresso do Partido da Esquerda Europeia, vice-presidente da Bolívia apresentou cinco propostas para a esquerda europeia e mundial.
O IV Congresso do Partido da Esquerda Europeia (PIE) reuniu 30 formações de esquerda europeias em Madri, entre os dias 13 e 15 de dezembro, em busca de um discurso para unificar estratégias frente às políticas de austeridade e de submissão de Bruxelas às exigências dos mercados. Este foi o discurso do vice-presidente do Estado Plurinacional da Bolívia, Álvaro Garcia Linera (foto), convidado para o encontro.
Permitam-me celebrar este encontro da Esquerda europeia e, em nome de nosso presidente Evo, em nome do meu país, de nosso povo, agradecer o convite que nos fizeram para compartilhar um conjunto de ideias, reflexões neste tão importante congresso da Esquerda Europeia.
Permitam-me ser direto, franco, mas também propositivo.
O que vemos desde fora da Europa? Vemos uma Europa que enfraquece, uma Europa abatida, uma Europa ensimesmada e satisfeita de si mesmo, até certo ponto apática e cansada. Sei que são palavras muito feias e muito duras, mas é assim que vemos. Ficou para trás a Europa das luzes, das revoltas, das revoluções. Ficou para trás, muito atrás, a Europa dos grandes universalismos que moveram e enriqueceram o mundo, que empurraram povos de muitas partes do mundo a adquirir uma esperança e mobilizar-se em torno dessa esperança.
Ficaram para trás os grandes desafios intelectuais. Essa interpretação que faziam e que fazem os pós-modernos de que acabaram os grandes relatos, à luz dos últimos acontecimentos, parece que só encobre os grandes negócios das corporações e do sistema financeiro.
Não é o povo europeu que perdeu a virtude ou a esperança, porque a Europa a que me refiro, cansada, a Europa esgotada, a Europa ensimesmada, não é a Europa dos povos, mas sim esta Europa silenciada, encerrada, asfixiada. A única Europa que vemos no mundo hoje é a Europa dos grandes consórcios empresariais, a Europa neoliberal, a Europa dos grandes negócios financeiros, a Europa dos mercados e não a Europa do trabalho.
Carentes de grandes dilemas, horizontes e esperança, só se ouve – parafraseando Montesquieu – o lamentável ruído das pequenas ambições e dos grandes apetites. (...)
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25 dezembro 2013
Edward Snowden: Carta aos brasileiros
CARTA ABERTA AO POVO DO BRASIL
Por Edward Snowden*
Seis meses atrás, emergi das sombras da Agência Nacional de Segurança (NSA) dos EUA para me posicionar diante da câmera de um jornalista. Compartilhei com o mundo provas de que alguns governos estão montando um sistema de vigilância mundial para rastrear secretamente como vivemos, com quem conversamos e o que dizemos.
Fui para diante daquela câmera de olhos abertos, com a consciência de que a decisão custaria minha família e meu lar e colocaria minha vida em risco. O que me motivava era a ideia de que os cidadãos do mundo merecem entender o sistema dentro do qual vivem.
"Na NSA, testemunhei com preocupação crescente a vigilância de populações inteiras sem que houvesse qualquer suspeita de ato criminoso, e essa vigilância ameaça tornar-se o maior desafio aos direitos humanos de nossos tempos" |
Na NSA, testemunhei com preocupação crescente a vigilância de populações inteiras sem que houvesse qualquer suspeita de ato criminoso, e essa vigilância ameaça tornar-se o maior desafio aos direitos humanos de nossos tempos.
Em nome da segurança
A NSA e outras agências de espionagem nos dizem que, pelo bem de nossa própria “segurança” –em nome da “segurança” de Dilma, em nome da “segurança” da Petrobras–, revogaram nosso direito de privacidade e invadiram nossas vidas. E o fizeram sem pedir a permissão da população de qualquer país, nem mesmo do delas.
Hoje, se você carrega um celular em São Paulo, a NSA pode rastrear onde você se encontra, e o faz: ela faz isso 5 bilhões de vezes por dia com pessoas no mundo inteiro.
Quando uma pessoa em Florianópolis visita um site na internet, a NSA mantém um registro de quando isso aconteceu e do que você fez naquele site. Se uma mãe em Porto Alegre telefona a seu filho para lhe desejar sorte no vestibular, a NSA pode guardar o registro da ligação por cinco anos ou mais tempo.
Amantes e pornôs
A agência chega a guardar registros de quem tem um caso extraconjugal ou visita sites de pornografia, para o caso de precisarem sujar a reputação de seus alvos.
Senadores dos EUA nos dizem que o Brasil não deveria se preocupar, porque isso não é “vigilância”, é “coleta de dados”. Dizem que isso é feito para manter as pessoas em segurança. Estão enganados.
"Esses programas nunca foram motivados pela luta contra o terrorismo: são motivados por espionagem econômica, controle social e manipulação diplomática. Pela busca de poder" |
Existe uma diferença enorme entre programas legais, espionagem legítima, atuação policial legítima – em que indivíduos são vigiados com base em suspeitas razoáveis, individualizadas – e esses programas de vigilância em massa para a formação de uma rede de informações, que colocam populações inteiras sob vigilância onipresente e salvam cópias de tudo para sempre.
Busca de poder
Esses programas nunca foram motivados pela luta contra o terrorismo: são motivados por espionagem econômica, controle social e manipulação diplomática. Pela busca de poder.
Muitos senadores brasileiros concordam e pediram minha ajuda com suas investigações sobre a suspeita de crimes cometidos contra cidadãos brasileiros.
Expressei minha disposição de auxiliar quando isso for apropriado e legal, mas, infelizmente, o governo dos EUA vem trabalhando arduamente para limitar minha capacidade de fazê-lo, chegando ao ponto de obrigar o avião presidencial de Evo Morales a pousar para me impedir de viajar à América Latina!
Asilo político
Até que um país conceda asilo político permanente, o governo dos EUA vai continuar a interferir com minha capacidade de falar.
Seis meses atrás, revelei que a NSA queria ouvir o mundo inteiro. Agora o mundo inteiro está ouvindo de volta e também falando. E a NSA não gosta do que está ouvindo.
A cultura de vigilância mundial indiscriminada, que foi exposta a debates públicos e investigações reais em todos os continentes, está desabando.
Brasil na ONU
Apenas três semanas atrás, o Brasil liderou o Comitê de Direitos Humanos das Nações Unidas para reconhecer, pela primeira vez na história, que a privacidade não para onde a rede digital começa e que a vigilância em massa de inocentes é uma violação dos direitos humanos.
"Nossos direitos não podem ser limitados por uma organização secreta, e autoridades americanas nunca deveriam decidir sobre as liberdades de cidadãos brasileiros" |
A maré virou, e finalmente podemos visualizar um futuro em que possamos desfrutar de segurança sem sacrificar nossa privacidade.
Nossos direitos não podem ser limitados por uma organização secreta, e autoridades americanas nunca deveriam decidir sobre as liberdades de cidadãos brasileiros.
Mesmo os defensores da vigilância de massa, aqueles que talvez não estejam convencidos de que tecnologias de vigilância ultrapassaram perigosamente controles democráticos, hoje concordam que, em democracias, a vigilância do público tem de ser debatida pelo público.
Ato de consciência
Meu ato de consciência começou com uma declaração: “Não quero viver em um mundo em que tudo o que digo, tudo o que faço, todos com quem falo, cada expressão de criatividade, de amor ou amizade seja registrado. Não é algo que estou disposto a apoiar, não é algo que estou disposto a construir e não é algo sob o qual estou disposto a viver.”
Dias mais tarde, fui informado que meu governo me tinha convertido em apátrida e queria me encarcerar. O preço do meu discurso foi meu passaporte, mas eu o pagaria novamente: não serei eu que ignorarei a criminalidade em nome do conforto político. Prefiro virar apátrida a perder minha voz.
Se o Brasil ouvir apenas uma coisa de mim, que seja o seguinte: quando todos nos unirmos contra as injustiças e em defesa da privacidade e dos direitos humanos básicos, poderemos nos defender até dos mais poderosos dos sistemas.
Tradução de Clara Allain
A hipocrisia da mídia e os petistas presos na Papuda
Por Luiz Carlos Azenha*
O texto abaixo é trecho de um post publicado pelo Eduardo Guimarães a respeito da ação da mídia para punir os punidos, ou seja, retirar supostas “regalias” que os condenados do mensalão teriam recebido na penitenciária da Papuda, no Distrito Federal, dentre elas a possibilidade de ler:
A leitura pode ser um bálsamo para o encarcerado que a aprecie. Deveria ser estimulada, aliás. Tira a mente do que não presta. Contudo, a “regalia” que permitia que condenados do mensalão lessem à vontade foi revogada por estarem “lendo mais do que o permitido”.
A tortura psicológica costuma ser vista como até mais intensa e penosa do que a tortura física, que, após algum tempo, o torturado aprende a suportar, até por seu corpo e seus sentidos não resistirem. Já a psique humana é um parque de diversões para o sádico; permite supliciar sem limites.
Se a mídia não quer “regalias” para os condenados do mensalão tais como ler um livro, tampouco quer algum direito constitucional como o de um condenado cumprir sua pena tal como foi preconizada – e nunca de forma mais dura ou mais branda.
O objetivo que excita o sadismo midiático é o de minar o espírito dos dois petistas e o dos companheiros que partilham a dor deles não só por sabê-los condenados injustamente, mas por cumprirem uma pena mais dura do que aquela que deveriam estar cumprindo.
Sob essa sanha pervertida, os sádicos midiáticos já encontraram mais direitos a suprimir enquanto os direitos a preservar são ignorados: os condenados do mensalão poderão ficar com a luz acesa até às 24 horas do dia 24 de dezembro. E, escândalo dos escândalos, após receberem uma “ceia de natal”.
Dizem os instrumentos de tortura conformados em papel impresso que os “mensaleiros” receberão “quentinhas” contendo com arroz, feijão, carne, legumes e verduras. E o luxo é tanto que terão acesso à cantina do presídio, onde poderão comprar cigarros e refrigerante.
Esses “mensaleiros” não se emendam, não é mesmo?
As “regalias” de que desfrutrariam os petistas que atiçam a perversidade midiática, porém, não são regalias coisa alguma. Eles ainda dispõem de alguma diferenciação dos condenados ao regime fechado simplesmente porque estão padecendo sob ele ilegalmente, pois deveriam estar no regime semiaberto.
Isso em um país em que traficantes, estupradores, assassinos e até políticos corruptos conseguem ficar em liberdade contando com a sabida e consabida leniência que o dinheiro ou a influência da mídia podem comprar da Justiça.
*****
Digo eu, Azenha, que desde que O Globo e a Folha, especialmente, passaram a prever rebelião iminente na Papuda, dado o descontentamento de presos com supostos privilégios dos petistas, era óbvio o desenrolar: as autoridades seriam forçadas a agir. Se não agissem e houvesse uma rebelião, seriam condenadas. Se agissem impedindo a rebelião imaginada por O Globo… bem, conseguiram impedir a rebelião, certo?
O que nos choca acima de tudo é que essa gente tente se passar por defensora:
1. Da aplicação rigorosa da lei;
2. Dos presos mais humildes, que não teriam os supostos privilégios dos petistas.
Ora, se é assim, a mídia deveria, em defesa dos presos desprotegidos, denunciar com toda a força o domínio que o PCC tem sobre a maior parte dos presídios paulistas, onde a facção protege alguns, mas explora a maioria.
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24 dezembro 2013
Poema de Natal
Poema de Natal
Para isso fomos feitos:
Para lembrar e ser lembrados
Para chorar e fazer chorar
Para enterrar os nossos mortos —
Por isso temos braços longos para os adeuses
Mãos para colher o que foi dado
Dedos para cavar a terra.
Assim será nossa vida:
Uma tarde sempre a esquecer
Uma estrela a se apagar na treva
Um caminho entre dois túmulos —
Por isso precisamos velar
Falar baixo, pisar leve, ver
A noite dormir em silêncio.
Não há muito o que dizer:
Uma canção sobre um berço
Um verso, talvez de amor
Uma prece por quem se vai —
Mas que essa hora não esqueça
E por ela os nossos corações
Se deixem, graves e simples.
Pois para isso fomos feitos:
Para a esperança no milagre
Para a participação da poesia
Para ver a face da morte —
De repente nunca mais esperaremos...
Hoje a noite é jovem; da morte, apenas
Nascemos, imensamente.
Vinícius de Moraes