22 abril 2017

Uma lista suspeita



Por Paulo Muzell*
A partir da Ação Penal 470, mas especialmente com o início da Lava Jato, o país assiste a uma sucessão de vazamentos seletivos que antecedem shows midiáticos. Os alvos são, invariavelmente, Lula e o PT.
Depois de um suspense que durou meses, Rodrigo Janot enviou ao Supremo e algumas semanas depois Fachin liberou a lista completa dos delatados pelas empreiteiras investigadas na operação Lava Jato.
Numa relação de mais de duzentos nomes só constam políticos, nenhum membro do judiciário, do ministério público ou da polícia federal. É muito estranho que não conste o nome de nenhum magistrado. A ex-ministra do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e ex-presidente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Eliana Calmon sentenciou: “delação da Odebrecht sem pegar judiciário não é delação”. Coincidentemente, nas últimas décadas a Odebrecht foi beneficiada por sentenças favoráveis em praticamente todas suas demandas judiciais.
A lista Janot-Fachin é uma verdadeira “salada de frutas”: mistura tudo. Há denúncias de doações de campanha, caixa 2, propina para obtenção de benefícios fiscais, propina para fraudar licitações e para aprovação de Medidas Provisórias (MPs), dentre outras ilicitudes, abrangendo um período de vinte anos. O anúncio teve o efeito de uma bomba que atingiu um Executivo e um Legislativo já muito fragilizados. O conluio mídia-Supremo-Janot/Ministério Público gerou um monstro cuja missão inicial era acabar com Lula e o PT. Acontece que este “moedor de carne” se descontrolou, passou a atacar e a atingir mortalmente também os partidos do centro-direita. A consequência foi que Judiciário, Ministério Público e mídia ganharam crescente protagonismo e vão ocupando o centro da arena política. Os políticos dos mais diversos partidos deverão secundarizar – pelo menos temporariamente – suas diferenças ideológicas e, como classe, iniciar o contra-ataque. Aumenta a tensão, o confronto dos poderes. É perigoso e indesejável que servidores públicos, agentes do Estado – que existem para zelar e assegurar o cumprimento da constituição e das leis, com poderes de punir e reprimir – passem operar como agentes políticos com total apoio e cobertura de uma mídia que representa o que de pior existe na oligarquia brasileira. Uma mídia concentrada nas mãos de meia dúzia de famílias poderosas, entreguista, sem nenhum compromisso com a verdade ou com um projeto de construção nacional. Uma mídia que defende com unhas e dentes os vergonhosos privilégios da Casa Grande.
O listão coloca no mesmo saco suspeitas “leves”, sobre as quais não existe prova, junto com delitos graves, comprovados ou sobre os quais há indícios fortes, comprometedores. Os prejuízos são evidentes porque mesmo que depois de feita a apuração se constate a total inocência de um suspeito listado, que sequer se tornou réu, seu nome já foi lançado ao descrédito. É ato ilegal e irresponsável que a condenação pública preceda a apuração dos fatos.
Não é possível confiar na imparcialidade de um Supremo que tem como ministros Alexandre Moraes, Gilmar Mendes, Luiz Fux, Dias Toffoli e Roberto Barroso, só para citar os piores. Ou num Procurador Geral da República que luta para emplacar um terceiro mandato e que defende uma “conveniente” interpretação da Constituição que protege Michel Temer, que não pode ser investigado por atos anteriores ao seu mandato. Não se pode confiar nos operadores da Lava Jato que acusam sem provas, baseados em “convicções” e vazam delações, gravações clandestinas, ilegais, denúncias não fundamentadas, deixando o mundo político de joelhos, à sua mercê.
Vivemos num país em que a sonegação atinge o montante de 500 bilhões de reais por ano e em que o peso maior da carga tributária é suportado pelos assalariados e pela população mais pobre. Os episódios de sonegação fiscal são “esquecidos” pela mídia por que ela deles participa. Nos 70 investigados na operação Zelotes lá estão os grandes bancos (Santander, Bradesco), a Gerdau e a RBS. Alguns anos atrás a Globo criou uma empresa fantasma em um paraíso fiscal para sonegar milhões de impostos num contrato de transmissão dos jogos da Copa. Recentemente tivemos o escândalo envolvendo uma decisão do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (o CARF) que beneficiou o Itaú. O banco se recusou recolher 25 bilhões de impostos no episódio de fusão com o Unibanco. Um jogo com cartas marcadas: o relator do processo foi Luiz Fabiano Penteado, representante da Confederação Nacional das Instituições Financeiras no Conselho. Há, também, o “presentão” do governo Temer às Teles. Sob o pretexto de estimular os investimentos em telefonia o Senado aprovou e Temer pretende sancionar um projeto de lei que as beneficiaria com a transferência de patrimônio público e perdão de multas num montante que atingiria os 105 bilhões de reais!
Sob o pretexto de combater a corrupção a Lava Jato com o apoio do Ministério Público e do Supremo colocou no governo o que Ciro Gomes classifica como um “bando de ladrões”. A corrupção, que sempre existiu e que já era grande, aumentou.
Falando sobre o circo midiático armado com a divulgação do listão Janot-Fachin, Emílio Odebrecht, o velho patriarca da empresa declarou estranhar que só agora fossem anunciadas com grande alarde e como novidade as supostas ou reais ilicitudes. “Isso tudo é muito velho, é feito há muitos e muitos anos. Por que não fizeram isso há 10, 20, trinta anos atrás? A mídia sabia, a Globo sabia”, declarou.
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*Paulo Muzell é economista. - via Sul21

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