07 janeiro 2019

Quem é Fátima Bezerra, a única mulher eleita para governar um estado no Brasil

Fátima Bezerra (PT/RN) com o ex-Presidente Lula

Nova Palmeira ainda era um povoado paraibano, na segunda metade dos anos 1950, quando por muito pouco não foi cenário de uma tragédia. A tarde seguia sem pressa até o instante em que um caminhão baú em alta velocidade atravessou o sertão e passou por cima de uma das filhas do artesão Severino e da parteira Luzia.

De sobressalto e em estado de choque, a família correu em desespero imaginando o pior, ao mesmo tempo em que o motorista sumia na caatinga sem rumo e sem prestar socorro.

Deitada, sem se mexer, a pequena Fátima abriu os olhos devagar quando viu os irmãos, os pais e amigos aglomerados ao redor dela. O corpo da menina tinha ficado posicionado entre as rodas do caminhão. A “neguinha” de seo Severo, como o pai chamava a filha, saiu ilesa.

“Foi milagre!”, gritou a mãe, parteira do povoado e devota de Santa Luzia.

Seis décadas depois, a filha de Severino e Luzia, dada como morta por poucos e intermináveis segundos naquela tarde dos anos 1950, é motivo de festa mais uma vez em Nova Palmeira, embora o destino a tenha levado para o vizinho Rio Grande do Norte, onde construiu uma trajetória que começou na sala de aula, passou pelo movimento sindical, chegou ao legislativo estadual, seguiu pela Câmara dos Deputados e Senado até desembarcar no cargo político mais importante do Estado.

Nesta terça-feira (1º), Fátima Bezerra [PT/RN] consolida esse percurso. Será empossada como a única mulher eleita em 2018 para administrar um estado no país pelos próximos quatro anos. E com um adendo, como costuma enfatizar desde a campanha eleitoral: será a primeira governadora de origem popular no Rio Grande do Norte, estado que já contou com outras duas mulheres na chefia do Executivo (Wilma de Faria e Rosalba Ciarlini), mas ambas ligadas à famílias tradicionais e oligarquias locais que se revezavam no poder até as eleições deste ano.

Em 63 anos, mudou muita coisa no país, na região Nordeste, no Rio Grande do Norte e na vida da governadora eleita pelos potiguares. Os seis filhos de Severino Bezerra de Medeiros e Luzia Mercês do Amaral – Preta, Sebastião, Bêu (já falecido), Conceição, Fátima e Terezinha – dormiam nos colchões de palha e lã feitos pelo pai, inicialmente dentro da própria casa da família. Depois, em um galpão vizinho. Luzia muitas vezes se ausentava por horas ou virava a noite para ajudar outras mulheres a serem mães também.

Apesar da vida partidária de Fátima, a política não chega a ser uma novidade para a família Bezerra. Preta, a irmã mais velha, foi vice-prefeita e vereadora de Nova Palmeira. E a própria mãe, dona Luzia, tinha o respeito dos políticos da região em razão do carinho popular conquistado pelos partos gratuitos que realizava nas redondezas.

Quando Fátima confrontou Carlos Eduardo Alves (PDT) num dos debates do 2º turno, afirmando  que ele não sabia o que era uma seca de verdade, a senadora e então candidata ao Governo olhava para o próprio passado e voltava para um cenário conhecido, marcado pelos efeitos que a estiagem deixava no chão de Nova Palmeira.

A irmã Conceição conta que quando eram criança, ainda na Paraíba, a região sofria com uma longa seca:

“Às vezes nossa mãe chegava nas casas e não tinha nem açúcar pra fazer uma garapa pra dar força nas mulheres. Ela levava a comida, um pedacinho de carne pra fazer pirão e só voltava pra casa quando a mulher descansava”, relata.

Ceição, como é chamada, vê algo da matriarca na irmã mais famosa. “Fátima hoje é essa mulher que – eu digo muito a ela – faz o que minha mãe fazia, só que de outra forma, com outra roupagem. A vida dela é trabalhar pelo povo”, diz com orgulho da mãe e da irmã. (...)

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