Lula participou do velório de seu neto de 7 anos em São bernardo do Campo (SP) neste sábado de carnaval
A dor do ex-presidente e de seus familiares era intensa, e por diversas vezes Lula caiu num choro profundo. / Miguel SCHINCARIOL / AFP |
“Lula é minha família”, disse Lucas Henrique de Castro, jovem de 26
anos, chorando copiosamente num banco do cemitério Jardim da Colina, em
São Bernardo do Campo, onde Arthur Araújo Lula da Silva, neto do
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, foi cremado neste sábado (2).
Assim como centenas de outras pessoas, incluindo políticos e pessoas
comuns, Lucas veio prestar solidariedade à família Lula da Silva. Aos 7
anos de idade, Arthur faleceu ao meio dia dessa sexta-feira (1), em
decorrência de uma meningite meningocócica.
Detido na Polícia Federal de Curitiba desde 7 de abril de 2018, Lula
foi autorizado a sair da prisão para se despedir de seu neto, direito
previsto no artigo 120 da Lei de Execução Penal (LEP). Abatido, o
ex-presidente chegou por volta das 11h deste sábado ao cemitério, onde
desde 22h do dia anterior, seu neto estava sendo velado.
Lula estava sob forte aparato da Polícia Federal e policiais da
Rocam, além de dezenas de viaturas e policiais militares que chegaram ao
local mais cedo. Apesar da parede de policiamento e grades, a população
conseguiu ver o presidente acenar por alguns segundos antes de
ingressar no velório, que foi restrito a familiares e amigos. Durante
uma hora e meia em que esteve no velório, três helicópteros sobrevoavam o
crematório, na primeira vez em que o ex-presidente saiu do cárcere
nesse um ano de prisão.
O sentimento dos presentes era de luto e de solidariedade, mas também
de indignação pela prisão de Lula, que em breve completará um ano. A
todo o momento, se escutava gritos que entoavam as palavras “Arthur,
presente!” e “Lula Livre!”.
A diarista Diana Dantas, moradora de São Bernardo do Campo, não
desgrudou da grade que separava o caminho por onde o presidente foi
conduzido. "Eu sou vó. É muito triste. Sou eleitora dele [Lula]. Eu sou
Lula. Vim prestar solidariedade e vê-lo também", lamentou.
Da mesma forma a ajudante geral, Patrícia Pereira, disse que além da
solidariedade, o que a trouxe foi o sentimento de amor a Lula. “Amo
muito o presidente Lula. Ele tá preso, mas continua sendo meu
presidente", afirmou.
Solidariedade
A militância teve de ser contida pelo presidente do Instituto Lula,
Paulo Okamoto, após a chegada do petista. Do lado de fora,
simpatizantes, amigos e moradores do entorno tinham a expectativa de ver
o ex-presidente.
Em entrevista ao Brasil de Fato, Okamoto lamentou o fato de Lula ter
que passar por tudo isso sob essas condições. Okamoto considera "uma
falha brutal da nossa justiça" o fato de Lula ter sido impedido de ficar
com sua família durante o último ano.
Okamoto se mostrou desiludido com o Poder Judiciário brasileiro, ao
afirmar que resta apenas "acreditar na justiça divina, porque a justiça
dos homens está muito falha. É lamentável que um país como o nosso tenha
falhado tanto em promover a justiça. Nosso povo está muito
prejudicado".
Diversos políticos, integrantes de movimentos popualres e entidades
sindicais estiveram presentes no velório. Entre os parlamentares, a
ex-presidente Dilma Rousseff, Fernando Haddad, Ivan Valente, Gleisi
Hoffman, Benedita da Silva, Rui Costa, Aloísio Mercadante, Eleonora
Menicucci, Alexandre Padilha, José Genoíno, Eduardo Suplicy, Guilherme
Boulos, os irmãos Paulo e Celso Frateschi, entre outros.
Cerimônia
“Hoje tivemos que cumprir um dos papéis mais difíceis que a gente tem
que fazer na vida. Acompanhar a despedida do presidente Lula de seu
netinho, de 7 anos, que já era bom de bola e partiu de forma trágica. A
determinação da Justiça Federal era que ele poderia ficar apenas uma
hora e meia no recinto, não poderia se manifestar com as pessoas que
estavam aqui e nem haver nenhuma manifestação política. Absurdo! Imagina
se alguém vai num velório fazer comício”, indignou-se João Pedro
Stedile, da coordenação nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais
Sem Terra (MST).
Durante a cerimônia, Lula contou, segundo o dirigente do MST, que o
menino vinha sofrendo muito bullying na escola por seu avô estar preso.
“Lula fez um compromisso com o Arthur, botando as mãos em cima do
menino. Ele disse: ‘Eu prometo a você, ainda haverá justiça nesse
país’”, contou Stedile, que acompanhou o velório próximo ao
ex-presidente.
Ele acrescentou que Lula pediu ao menino que levasse um abraço a Dona Marisa Letícia e que ela cuidaria dele no céu.
Juliana Cardoso, vereadora eleita em São Paulo, também lamentou a
morte repentina Arthur. “A morte de uma criança é sempre muito difícil.
Ao mesmo tempo uma situação como essa, em que o presidente Lula chegou
fazia duas horas no Aeroporto de Congonhas e foi mantido lá, quando
poderia estar na despedida do neto”, afirmou.
Indignação
O ex-ministro da Casa Civil do governo de Dilma Rousseff, Gilberto
Carvalho, mostrou sua indignação em relação aos comentários de ódio
divulgado por alguns adversários políticos, como o deputado federal
Eduardo Bolsonaro (PSL).
“É um absurdo que nessa hora de tanta dor continuem expressando um
ódio que parece não ter fim. Queria pedir que Deus perdoe essas pessoas e
que ao mesmo tempo plante no coração delas pelo menos uma dúvida: se é
justo o que eles estão fazendo. Porque no dia, que Deus me livre, eles
perderem alguém nessas condições, eles vão saber a crueldade que estão
fazendo nesse momento".
Na mesma linha, Guilhermes Boulos, da direção do Movimento dos
Trabalhadores Sem Teto (MTST), ressaltou a importância de separar a luta
política das relações pessoais.
"Quando se comemora a morte de alguém, de uma criança de 7 anos, não
estamos mais falando de política, mas de caráter, de humanidade. O que
aconteceu ontem nas redes sociais serve como uma reflexão para a
sociedade: até que ponto nós chegamos? Abriram a porteira da
insanidade", enfatizou Boulos.
Em janeiro, após a morte do irmão do ex-presidente, Genival Inácio da
Silva, o Vavá, o pedido para saída da PF chegou ao Supremo Tribunal
Federal (STF), em decorrência das negativas em instâncias inferiores da
Justiça. Quando o ministro Dias Toffoli expediu a autorização, o velório
de seu irmão já havia ocorrido e Lula decidiu não deixar a PF,
considerando-se impedido pelo Poder Judiciário de participar desse
momento, conforme prevê a legislação brasileira.
Arthur foi cremado no mesmo local onde foi cremada há dois anos a esposa de Lula, Marisa Letícia.
Edição: Luiz Felipe Albuquerque
Fonte: Brasil de Fato
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