04 julho 2019

Lula: ‘Quem não quer que eu saia daqui é a Globo. Ela poderia mandar o Bial, mas só faço ao vivo’


Lula: “Quando eu fui eleito eles não quiseram me entrevistar ao vivo?” (Foto: Guilherme Santos/Sul21)
Por Marco Weissheimer, no Sul21*
Na segunda parte da entrevista concedida ao Sul21, quarta-feira (3), em Curitiba, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva comenta o episódio da prisão de um militar que participava da comitiva de apoio ao presidente Jair Bolsonaro, com 39 quilos de cocaína, em um avião da FAB. “Investigar isso é papel do Moro e da Polícia Federal, não do general Heleno. Mas eles não estão achando nem o Queiroz”, diz Lula. O ex-presidente também fala da recente decisão do STF que negou mais uma vez a sua liberdade e reafirma sua disposição para provar a sua inocência “100 por cento”:

“Não adianta querer tirar o Lula daqui, mandar ele pra casa e colocar uma tornozeleira no bicho. Eu não quero sair daqui por caridade e minha canela não é canela de pombo. Não aceito tornozeleira. Eu quero sair daqui com 100% da minha inocência. Fora disso, esqueçam”.

Lula questiona também o papel desempenhado pela Rede Globo na sua prisão e, agora, para, segundo ele, inviabilizar a sua libertação: “Não venham me dizer que eu sou contra a Lava Jato. Eu sou contra transformar uma operação de investigação em uma ação política e foi o que fizeram em relação a mim. Eu acho que quem não quer que eu não saia daqui nunca é a Globo. A Globo poderia vir aqui fazer uma entrevista comigo, como você está me entrevistando. Ela poderia mandar o Bial e transmitir ao vivo. Com a Globo, como eu não confio, eu não faço gravando, só ao vivo. Ou poderia mandar o William Bonner e fazer no Jornal Nacional. Quando eu fui eleito eles não quiseram me entrevistar ao vivo?”.
Primeira parte da entrevista com Lula:O Moro está se transformando em um boneco de barro”
Sul21: O senhor participou de muitas reuniões do G-20 e de outros encontros de cúpula internacionais. Neste último encontro do G-20, houve um episódio que teve grande repercussão internacional, que foi a prisão de um militar brasileiro que acompanhava a comitiva do presidente Bolsonaro, com 39 kg de cocaína. O general Augusto Heleno, do Gabinete de Segurança Institucional, falou desse episódio como uma falta de sorte. Com a experiência que o senhor tem envolvendo os protocolos de segurança em viagens presidenciais, a ocorrência de algo do tipo pode ser associada à falta de sorte?
Lula: O que é preciso perguntar para o general Heleno, aquele que dá murro na mesa quando se trata de falar do Lula, se foi falta de sorte porque acharam. Se não tivessem achado, não teria sido falta de sorte. Eu não sou mesquinho de querer envolver o presidente da República numa coisa dessas, porque o presidente nem sabe quem viaja no SCAV, o avião reserva. O presidente sabe quem são os ministros que viajam com ele. Mas tem uma coisa que não dá para aceitar. A base aérea onde fica o avião presidencial, seja em Brasília, no aeroporto de Congonhas, em Cumbica ou no Rio de Janeiro, é controlada pelos militares. O coronel Joseli, que hoje é ministro do Superior Tribunal Militar, é quem tomava conta do avião durante os oito anos do meu governo. Ele viajava comandando os pilotos e toda a tripulação. Foi no meu governo e no da Dilma. Na base, tem um coronel que toma conta. O avião normalmente é comandado por militares.
“Como é que esse rapaz conseguiu entrar com uma mala com 39 quilos de cocaína sem que ninguém percebesse?” (Foto: Guilherme Santos/Sul21)
Há uma sala de embarque por onde normalmente entra o presidente da República, a sua esposa e o ajudante de ordens. Há outra sala para os ministros e para todas as outras pessoas que acompanham a viagem. Todos eles têm que chegar antes do presidente nesta sala e as malas deles já chegaram três ou quatro horas antes para serem embarcadas. Como é que esse rapaz conseguiu entrar com uma mala com 39 quilos de cocaína sem que ninguém percebesse? Ele chegou por último? Entrou com a mala na mão e colocou lá dentro? Não é possível. A impressão que tenho é que querem jogar toda a culpa no sargento, mas ele não fez isso sozinho. Qual é o esquema que está por trás dele? Quem facilitou? Quem seria o dono e quem seria o receptor? O povo brasileiro precisa de respostas. Há algum tempo atrás, a Polícia Federal pegou um helicóptero com 400 quilos de coca em Minas Gerais e até hoje ninguém sabe quem é o dono da coca.
Veja que estou sendo muito objetivo. Não acredito que o atual presidente da República soubesse de alguma coisa porque a gente não sabe direito nem quem vai na parte de trás do avião. Tem o chefe do cerimonial que cuida dos civis e tem os militares. Alguém sabe como é que esse cidadão embarcou.  Investigar isso é papel do Moro e da Polícia Federal, não do general Heleno. Mas eles não estão achando nem o Queiroz…O Queiroz enganou o Ministério Público, a Polícia Federal, está desaparecido, ninguém sabe onde está. Esse mesmo ministro, quando juiz teve a pachorra de mandar a Polícia Federal na minha casa pra pegar a minha família inteira, agora não consegue achar o Queiroz? Até agora não sabe também como um vizinho do Bolsonaro tinha 100 rifles em casa. Um contrabandista, ligado às  milícias e ao Queiroz…Ora, meu deus do céu. Até quando vai se mentir para a sociedade?
Acho engraçado que a Rede Globo de televisão finge que não é com ela. Se ela não puder puxar o saco, falar mal ela não fala. O esforço que eles estão fazendo para fingir que não tem nada de errado e para dizer que, quem está acusando o Moro é contra a luta anti-corrupção, é muito grande. O Ali Kamel deve ser um artista para tentar ficar inventando uma proteção descabida para o Moro neste instante. Todo mundo sabe que o Glenn é um jornalista respeitado no mundo inteiro. Agora querem quebrar o sigilo da renda dele, quando o Moro não tem coragem de mostrar o celular dele. Eles tiveram a coragem de pegar um tablet do meu neto de três anos e ficaram um ano com ele aqui na Polícia Federal. E agora o ministro se recusa a entregar o seu telefone para a Polícia Federal? O Dallagnol também não tem coragem de entregar o celular dele? O que eles têm para esconder? A sociedade brasileira precisa começar a acompanhar tudo isso de perto por que a democracia é um valor incomensurável que a gente não pode perder. (...)
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