Helena Chagas, n’Os Divergentes, toca na questão essencial para que se perceba o perigo da escalada de pressões das forças policiais, em várias partes do país, praticamente encostando na parede os governos estaduais para exigir vantagens em suas remunerações.
Não é o “primeiro capítulo”, pois antes já conseguira impor aos governos estaduais uma política de encobrimento dos abusos cometido por parte das forças policiais onde, 99% das vezes, a culpa das mortes fica na conta dos mortos.
Agora, porém, os grupos que se acostumaram a “tocar o terror” nas periferias e favelas parece disposto a usar o mesmo método em cidades inteiras, para cobrar ao Estado recompensa em dinheiro.
Mesmo depois de tudo o que ocorreu, um deputado bolsonarista diz que será recebido pelo Exército – que assumiu parte da segurança pública em Fortaleza, “para negociar”.
É óbvio que não pode haver negociação sem a volta da disciplina e do funcionamento normal.
Mas o que temos, diz bem Helena, é um presidente da República que, diante dos disparos de PMs encapuzados, defende “o excludente de ilicitude para os militares que, neste conflito, matassem alguém”. (Fernando Brito, jornalista)
Estado Policial
Helena Chagas, n’Os Divergentes
Pode-se apontar a família Gomes como chegada a certos destemperos, e até se considerar exagerado o ato do senador Cid Gomes de subir numa retroescavadeira e invadir o batalhão de PMs amotinados. Mas seu irmão, Ciro Gomes, está coberto de razão ao responsabilizar o governo Bolsonaro pelo estado de coisas que levou um bando de policiais mascarados a disparar tiros a esmo. A bala que hoje está alojada no pulmão do senador poderia tê-lo matado – a ele ou a qualquer das pessoas ali presentes. O que se destaca no episódio é a autoconfiança dos participantes de uma greve ilegal, agindo como se o país não tivesse nem governo nem Constituição.
O que se ressalta, acima de tudo, é a incapacidade dos poderes constituídos de fazer cumprir a lei e a mensagem dúbia que é passada pelo próprio presidente da República. Jair Bolsonaro assinou o decreto de garantia da lei e da ordem e mandou o Exército para o Ceará, mas ao mesmo tempo defendeu o excludente de ilicitude para os militares que, neste conflito, matassem alguém.
Faltou pouco para Bolsonaro defender sua aplicação aos PMs que atiraram em Cid Gomes, caso ele tivesse morrido. E ainda disse que “aquele cara lá” (o baleado) não agiu corretamente. Se agiu ou não agiu corretamente, nada justifica que tenha sido atacado a balas por PMs mascarados.
O episódio, que pode se estender a outros estados, mostra que o país começa a entrar perigosamente naquele ponto em que se transforma em Estado policial. Enaltecidos pelo poder federal, ganhando a cada dia mais favores e benesses, os militares abriram o caminho da supervalorização para as forças de segurança. PMs se sentem fortalecidos por Bolsonaro para fazer greves e encarar a briga com os governadores dos estados – aqueles que, em tese, deveriam ser seus comandantes.
A banalização do uso de armas – por militares e civis – é outro ingrediente perigoso introduzido pelo atual governo. E as primeiras escaramuças do Carnaval – normalmente uma festa pacífica – começam a mostrar isso.
Os movimentos das PMs que se alastram pelo país não são mais uma questão orçamentária e salarial. Trata-se agora de um problema institucional, a exigir a intervenção do Legislativo e do Judiciário.
*Via Tijolaço
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