04 maio 2023

Um país refém de um grupo de terraplanistas econômicos

Usam taxas de juros como se fosse elemento inócuo em relação à toda a economia, afetando apenas a inflação, tratando-a como evento autônomo 


Por Luis Nassif* 

É curiosa a reação à ata do Copom. É uma ata completamente fora da realidade do país. Acena com a possibilidade vaga de uma crise internacional como justificativa para juros altos. Apresenta uma leve recuperação do mercado de trabalho como argumento para não reduzir os juros. Lembra, em muito, o desastre da gestão Gustavo Loyolla, no início do plano Real. 

Houve uma corrida contra o Real, o então presidente do BC, Pérsio Arida, jogou os juros para 45% ao ano. Cessada a corrida, o lógico, o racional, o óbvio seria trazer as taxas para níveis normais. Loyolla manteve a taxa, derrubou-a lentamente, destruindo qualquer veleidade de equilíbrio na dívida pública, sob o argumento de que, se derrubasse muito rapidamente a taxa, poderia surgir outra corrida, obrigando-o a aumentar substancialmente novamente. 

Usam as taxas de juros com se fosse elemento inócuo em relação à toda a economia, afetando apenas a inflação. E como se a inflação fosse um evento autônomo, sem nenhuma relação com as demais variáveis econômicas. 

São incapazes de qualquer análise da realidade, de incluir qualquer elemento a mais em seus cenários, mesmo aqueles diretamente relacionados ao tema – como nível de inadimplência, crise do crédito, as recuperações judiciais dos grandes grupos e as quebradeiras das pequenas empresas. 

O mais curioso é que essa política suicida afeta diretamente o sistema bancário, reduz o mercado de crédito, aumenta o risco de inadimplência, afetará diretamente o resultado bancário. Mas o mercado se cala porque a autonomia do Banco Central é um instrumento dele, mercado, ainda que manobrado por pessoas que desmoralizaram completamente o modelo. 

A ata do Copom chega ao ridículo de ameaçar com novas altas na Selic, se o mundo não se comportar conforme seu desejo. 

Foram acometidos da praga da autonomia das corporações não eleitas. Atuam do mesmo modo aqui e nos países centrais. Nos Estados Unidos, bastou o Departamento de Justiça dar poderes especiais à área de crimes corporativos, para praticarem todos os abusos, servindo de matriz para a Lava Jato. Mas havia instâncias que atuavam como freios. O mais abusivo dos procuradores foi condenado por um juiz, com uma sentença clássica, depois de ter arruinado a carreira de um senador com ilações falsas sobre a reforma de um sítio. Depois da quebra da Anderson Consulting o sistema passou a tomar precauções para impedir a morte de empresas. E, principalmente, há uma imprensa muito ativa para apontar exageros de qualquer poder. 

No Brasil, país de democracia pouco sólida, nada disso ocorre. No pós-Constituinte, o primeiro setor a mostrar os músculos, de forma exagerada, foi a mídia. Depois, o MInistério Público Federal mancomunado com Ministros do Supremo Tribunal Federal. Recentemente, o caso escandaloso do CADE (Conselho Administrativo de Direito Econômico), de Bolsonaro, “obrigando” a Petrobras e negociatas sem fim com as refinarias, a pretexto de combater concentração de mercado. 

E, passado o período nebuloso, fica a herança maldita de Bolsonaro, nessa autonomia sem limites do BC, atuando como um bedel desinformado, pretendendo interferir na produção acadêmica. 

A reação virá da pior forma possível para o mercado, mostrando que a substituição do controle ideológico da mídia pelo comando direto das ações foi a forma mais efetiva de desmoralizar a financeirização da economia. 

*Jornalista, Editor do site GGN (fonte desta postagem).

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