Fotos: Prensa Latina, Télam, Twitter/@NormaLopezSF
Por Ângela Carrato*
Em meio às festas de final de ano, muita gente não está acompanhando a tragédia vivida pelos nossos vizinhos argentinos.
Poucos se dão conta de que escapamos por um triz de nos tornarmos uma Argentina, transformada pelo imperialismo estadunidense e pela classe dominante local em laboratório para todas as atrocidades do neoliberalismo.
Javier Milei, o preposto do imperialismo lá, nada mais é do que uma versão portenha de Jair Bolsonaro, outra dessas figuras bizarras criadas no contexto da guerra híbrida e da desinformação, para enganar pessoas, destruir países e se apropriar de riquezas.
Se Bolsonaro e não Lula tivesse vencido as eleições de 2022, seríamos nós e não los hermanos que estaríamos nas ruas protestando e apanhando da polícia.
Uma ditadura estaria batendo à nossa porta, se já não tivesse sido implantada, com todos os aplausos da mídia corporativa. Tal como eles, teríamos um Natal triste e a lamentável perspectiva de um ano novo marcado pela pobreza, repressão e medo.
A vitória de Lula nos livrou de tudo isso. O primeiro ano do atual governo foi excelente sob todos os aspectos e como as perspectivas para 2024 são ainda melhores, a única resposta que a classe dominante consegue dar é tentar impedir que Lula seja reeleito.
Quem está por fora do que acontece na Argentina, também não sabe dessa nova jogada da oposição brasileira, onde um bando de políticos ambiciosos, corruptos e falsamente cristãos articula medida nesse sentido.
A mídia corporativa brasileira, aliada de primeira hora dos golpistas de lá e dos de cá, esconde e naturaliza as atrocidades que Milei está fazendo.
Esconde e minimiza todos os avanços do governo Lula.
Torce e trabalha para que Lula não possa se reeleger, pois percebeu que não há como impedi-lo de fazer um excelente governo, apesar do cerco que lhe foi e continua imposto pela maioria no Congresso Nacional, por setores militares e pelo Banco Central comandado pelos interesses dos rentistas internacionais.
Em menos de 15 dias de desgoverno, Milei baixou 300 decretos, todos retirando direitos da população e possibilitando que o capital estrangeiro passe a mandar no país.
As maldades são requintadas.
Diante, por exemplo, das resistências dos funcionários das Aerolíneas Argentinas, a competente e conceituada estatal aérea, Milei autorizou que todas as companhias privadas estrangeiras possam oferecer viagens domésticas, num exemplo da devastação econômica que o “estado mínimo” proposto por ele poderá produzir.
Como se não bastasse, suas medidas de desregulação provocaram aumentos estratosféricos em todos os preços.
A inflação que era de 140% ao ano, bateu em 100% ao mês.
Os salários, claro, ficam como estão, mas os alugueis, o preço dos combustíveis, dos alimentos e de todos os serviços dispararam.
Canais de TV que apoiam Milei nem se fazem de rogados e sugerem que a população, para enfrentar a crise, “opte” por uma única refeição ao dia!
A Argentina mergulhou num abismo que pode nem ter volta. Infelizmente não se descarta o suicídio de uma nação, cuja maioria acreditou no canto de sereia de um suposto “libertarismo” que é, na prática, sentença de morte para a maioria da população.
Acreditou que todos os políticos eram iguais e preferiu eleger uma figura patética, que se guia pelo clone de um cachorro morto e que tinha como emblema de campanha a motosserra.
Vê-se que não é difícil enganar uma sociedade e fazê-la de otária, mesmo os argentinos sempre tendo sido cultos e combativos.
Também já vivemos, enquanto sociedade, nossa época de otários, com o tal Mensalão Petista, a Operação Lava Jato, as chamadas Jornadas de Junho de 2013 e as denúncias falsas contra Lula.
Até setores pensantes da esquerda caíram nestas armações que se diziam anticorrupção e nada mais fizeram do que destruir nossas empresas, destruir a economia e emponderar o que há de pior.
Sabiamente, em 2022, a maioria dos brasileiros mostrou que aprendeu a lição.mídi
Apostou no que deu certo, na seriedade e competência de Lula. O resultado é que o Brasil, em menos de um ano, saltou duas posições no ranking internacional, ultrapassando o Canadá e se tornando o 9º PIB mundial.
Foi sorte, diz a extrema-direita e os golpistas de plantão na mídia.
Foi competência política e muito trabalho, é preciso rebater.
Mesmo diante do sucesso de Lula e do Brasil, a mídia corporativa não se dá por vencida. Faz cara de paisagem e desconversa.
A manchete da Folha de S. Paulo deste sábado (23), por exemplo, é “Pela 1ª vez, parcela maior da população se declara parda”, um assunto frio para esconder as realizações do governo Lula.
O Estado de S. Paulo segue na mesma toada, enquanto O Globo, de olho apenas no próprio faturamento, faz de sua capa uma enorme chamada publicitária.
Se tivéssemos uma mídia corporativa minimamente séria, ela deveria estar mostrando como Lula conseguiu, apesar de todas as amarras deixadas pelos golpistas, destravar a economia, colocar dinheiro nas mãos dos mais pobres, trabalhar pela despolarização da sociedade, além defender a justiça e a paz no mundo.
Mas não. Esta mídia segue especialista em intrigas, em atuar contra os interesses da maioria e em fazer o jogo do inimigo.
Sem qualquer pudor, defende que é ruim a Petrobras se fortalecer, que é ruim a desconcentração da riqueza, que é ruim trabalhar pela soberania, pela justiça social e pela paz.
Se dependesse dela, programas sociais como Bolsa Família, Minha Casa Minha Vida, Farmácia Popular e tantos outros nunca teriam sequer existido.
Se dependesse dela, o governo deveria apoiar os juros nas alturas do Banco Central dito independente e deixar o preço dos combustíveis como estava.
Se dependesse dela, o Brasil estaria agora passando vergonha ao lado dos Estados Unidos e de muitos países europeus, que não sabem como sair do atoleiro em que se meteram com a guerra na Ucrânia.
Uma guerra, na realidade, por procuração e provocação dos Estados Unidos para com a Rússia.
Se essa mídia fosse minimamente séria, estaria mostrando como as posições belicistas de Joe Biden podem lhe custar a reeleição e jogar o país novamente nos braços do extremista de direita, Donald Trump.
A população estadunidense está indignada por Biden argumentar que não há dinheiro para programas sociais, mas ter enviado bilhões de dólares para uma guerra absurda, ao mesmo tempo em que dá carta branca para o genocida primeiro-ministro de Israel, Benjamin Nethanyaru, assassinar mulheres e crianças palestinas.
Essa mídia é tão patética que, para combater Lula, aceita até perder espaço para o que há de mais reacionário na sociedade brasileira atual: uma infinidade de ditos templos neopentecostais, que não passam de arapucas para manipular e tomar dinheiro de gente ingênua.
Refiro-me à aprovação, na surdina e sem qualquer debate público, do decreto-lei que possibilita a ampliação do número de outorgas de rádio ou TV, por sociedades de qualquer natureza jurídica, inclusive a unipessoal.
A nova legislação amplia de 10 para 20 o limite máximo de emissoras de rádio e de TV que essas sociedades podem ter.
A proposta foi apresentada pelo deputado Marcos Pereira, do Republicanos de São Paulo, e atende aos interesses da Igreja Universal do Reino de Deus (leia-se Edir Macedo).
O texto vai à sanção presidencial e Lula tem a possibilidade de vetá-lo, evitando que a radiodifusão brasileira se torne ainda mais nociva à democracia.
Mesmo optando pelo veto, o risco dele ser derrubado pelo Congresso Nacional é grande. Ninguém pode se esquecer de que no Legislativo estão oportunistas, disfarçados em tementes a Deus, que não fazem outra coisa a não ser trabalhar contra o povo brasileiro.
Prova disso é que a legislação sobre radiodifusão no Brasil data de 1962 e já passou da hora de ser alterada, levando-se em conta o interesse da maioria e a democratização na área.
No entanto, a maioria do Congresso Nacional se recusa a qualquer mudança que implique pluralidade, transparência e democratização do setor.
Um dos ódios da mídia corporativa brasileira em relação a Lula é que ele, mesmo timidamente, criou a TV Brasil, a nossa primeira TV Pública.
Implantou, também regras técnicas para a distribuição das verbas de publicidade do governo federal que, em tese, deveriam agradar a todos. Nem assim essa mídia se deu por satisfeita, deixando claro que o seu problema é o ódio de classe.
Nesse terceiro mandato, Lula tem sido o mais solicito possível com essa mídia.
É para ela, em especial o Grupo Globo, que se destina a parte do leão das verbas publicitárias oficiais.
Edir Macedo, que pôs seus tempos-empresas na campanha eleitoral contra Lula, não gostou e o troco está aí.
Não acredito que apenas o enfrentamento entre dois monopólios anti-Brasil e antipovo brasileiro seja suficiente para mudar o triste cenário reinante na mídia corporativa.
Muito terá que ser feito para termos uma mídia próxima do que existe em países ditos liberais como Estados Unidos e Inglaterra. Em ambos, a propriedade cruzada na mídia continua proibida e a aprovação de um decreto como esse jamais teria lugar.
É óbvio que a correlação de forças no Brasil hoje não é favorável aos setores progressistas, mas não se deve perder de vista que o governo federal dispõe de muitos mecanismos para apoiar e estimular a mídia independente, as TVs e rádios comunitárias e universitárias, além da prerrogativa em conceder novas outorgas de rádios e TVs.
Dito de outra forma, passou da hora de o governo Lula entender que não será com timidez e nem fugindo do problema que os inimigos vão se retrair.
Para ser feliz, como diria os Titãs, o povo brasileiro precisa de comida, bebida, diversão e arte.
Chega de essa velha mídia impor o que assistimos, o que sentimos e o que pensamos. Chega desta mídia safada, que usa o nome de Deus e de Cristo, só ganhar dinheiro e manipular os mais simples.
Muito do que aconteceu de ruim tanto aqui quanto na Argentina se deve ao peso da mídia tradicional e também das redes sociais, ambas usinas de mentiras e desinformação.
Não por acaso, Milei está tentando de todas as formas acabar com a Ley de Medio, a legislação que democratizou a mídia e criou a TV Pública, em 2009.
Não por acaso Milei e a classe dominante argentina odeiam Cristina Kirchner e o peronismo, sempre atentos ao poder da mídia.
Aqui, como não temos legislação democrática no setor, a mídia, oligárquica e comercial quer evitar qualquer avanço. Por isso, seu alvo é Lula.
É por essas e outras que temos muito que comemorar neste primeiro ano do terceiro mandato de Lula.
Comemorações que devem sempre nos lembrar que escapamos por um triz de nos tornarmos uma Argentina e que não podemos e nem devemos deixar a luta em defesa da democracia apenas a cargo do governo.
Passou da hora de os movimentos sociais brasileiros irem para as ruas, em apoio a Lula, à democracia e a ampliação de direitos, inclusive os envolvendo uma mídia democratizada.
Nesse sentido, precisamos fazer do próximo 8 de janeiro, quando comemoraremos a vitória sobre o golpismo, uma data inesquecível.
Precisamos mostrar para todo o mundo que o Brasil optou pela democracia e que não aceitamos retrocessos de quaisquer espécies.
Nesse sentido, los hermanos têm o que nos ensinar.
E nós também podemos ajudá-los nesse momento difícil, colocando a extrema-direita brasileira, que anda meio assanhada e fustigando-os, no seu devido lugar.
*Ângela Carrato é jornalista e professora do Departamento de Comunicação Social da UFMG
**Fonte: Viomundo
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