13 junho 2025

Fim do genocídio em Gaza demanda que países rompam relações com Israel, diz Fepal; ato em SP cobra medida do Brasil neste domingo (15)*

Mais de 30 movimentos populares se reúnem às 11h, na Praça Roosevelt, em ato pela unificado pela Palestina

Mulheres palestinas aguardam a distribuição de refeições quentes em Nuseirat, região central da Faixa de Gaza, em 4 de junho de 2025 - Eyad BABA / AFP

Mais de 30 movimentos populares, organizações e coletivos devem se reunir neste domingo (15), em São Paulo, em um grande ato unificado pela Palestina. A mobilização ocorre na Praça Roosevelt, a partir das 11h, e tem como objetivo pressionar o governo brasileiro a adotar medidas práticas diante do massacre promovido por Israel contra o povo palestino, especialmente na Faixa de Gaza.

Em entrevista ao programa Conexão BdF, da Rádio Brasil de Fato, o presidente da Federação Árabe Palestina do Brasil (Fepal), Ualid Rabah, argumenta que a forma mais eficaz de pressionar o regime israelense é seguir os mesmos caminhos usados historicamente contra outros regimes de apartheid e genocídio, como o da África do Sul. “Parar o genocídio acontece quando o governo brasileiro rompe relações com Israel. E essa é a pretensão desse grande movimento global”, declara.

Os meios, segundo Rabah, referem-se àqueles “em que a cidadania global se insurgiu em todo o mundo, tomou as ruas, pressionou os seus governos, os seus estados, os seus regimes, as suas figuras públicas”. “O mesmo foi feito contra a Alemanha, de 1933 a 1939, antes da Segunda Guerra Mundial“, acrescenta.

O dirigente destaca que o protesto busca dar visibilidade internacional ao que classifica como o “maior genocídio de todos os tempos”. “O mundo enxerga o genocídio que acontece na Palestina, notadamente na sua parcela territorial chamada Faixa de Gaza”, afirma Rabah. Segundo ele, o impedimento da ajuda humanitária e os ataques ilegais em águas internacionais, como o caso do barco Madleen, da Flotilha da Liberdade, também serão denunciados.

Rabah relaciona a violência atual em Gaza ao genocídio da Segunda Guerra Mundial. “Na Palestina, em Gaza, Israel mata 3,55 vezes mais que todo o período hitleriano da Segunda Guerra Mundial”, compara.

Brasil já adotou medidas concretas contra Israel

Questionado sobre a postura do governo federal, Rabah reconhece a firmeza dos posicionamentos públicos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), e avalia que medidas concretas também vêm sendo tomadas, ainda que pouco divulgadas. Entre os exemplos, ele cita o cancelamento de uma licitação de R$ 1 bilhão com a empresa bélica israelense Elbit Systems, o congelamento de acordos de cooperação na área militar e tecnológica com Israel, e a ratificação de acordos com a Palestina, incluindo um de livre comércio no âmbito do Mercosul.

“Estamos sem embaixador em Tel Aviv há um ano. As credenciais para o embaixador israelense no Brasil não foram entregues. E o Brasil apoiou a petição da África do Sul contra o genocídio na Corte Internacional de Justiça”, lembra o presidente da Fepal. Ele destaca ainda que o assessor especial da Presidência, Celso Amorim, afirmou em reunião com parlamentares e representantes de movimentos sociais que o governo estuda novas medidas em resposta aos ataques de Israel.

Para ouvir e assistir

O jornal Conexão BdF vai ao ar em duas edições, de segunda a sexta-feira, uma às 9h e outra às 17h, na Rádio Brasil de Fato98.9 FM na Grande São Paulo, com transmissão simultânea também pelo YouTube do Brasil de Fato.

11 junho 2025

Bolsonaro, o imbecil

E imaginar que esse minúsculo já ocupou a cadeira mais importante da República. Uma lástima! Que venha logo a cadeia!

Jair Bolsonaro é interrogado pelo ministro do STF Alexandre de Moraes durante oitiva sobre trama golpista (Foto: Fellipe Sampaio/STF)

Por Marcelo Uchoa*

Ainda no início da gestão Bolsonaro, quando ele já não escondia seu franco desequilíbrio para presidir o país, pelas bobagens que dizia internamente e pelos conflitos desnecessários que criava unilateralmente no cenário internacional, escrevi um texto de muita circulação no país intitulado “Interdição, já!”

Estava na cara que o Brasil era um navio à deriva, a ponto de afundar. Depois do texto vieram um sujeito fantasiado de Bolsonaro jogando bananas para os jornalistas no cercadinho do Palácio da Alvorada, a desastrosa reunião ministerial onde cada subordinado dizia os impropérios que queria dizer, a crise política aberta com a debandada do Moro e as fortes denúncias de tentativa de aparelhamento da Polícia Federal, a pandemia e suas centenas de milhares de mortes. Por fim, as ameaças golpistas, as tumultuadas eleições de 2022 e a tentativa frustrada de se manter no poder à força.

Alguém que não é da área jurídica e que assistiu a oitiva do ex-presidente ontem, no Supremo Tribunal Federal, deve ter se impressionado com a covardia, a voz trêmula, o gaguejar. Sem dúvida alguma, espantou-se com a inexistência do outrora super-herói, autovangloriado “imorrível, imbroxável e incomível”.

Eu, que sou do meio jurídico, vi um pouco mais. Vi um imbecil. Um sujeito a tal ponto desqualificado, que foi incapaz de entender que ali estava havendo um dos mais solenes e importantes atos processuais de sua própria ação. Um desconhecedor inequívoco da liturgia judiciária.

Imaginando ser muito engraçado (e desconsiderando a inelegibilidade já consumada) realizou a proeza de convidar o juiz relator para ser seu vice em 2026. O soco veio seco: - declino. Com um cérebro não maior do que um caroço de azeitona, disse, com a audácia de achar que alguém se sensibilizaria, que aos 70 anos já estava, segundo alertado pelo médico, no “bico do urubu”. Justificou que falava palavrões, porque era típico de seu linguajar, mas que vinha tentando melhorar, tarefa complicada, posto que, com 70 anos (novamente a desculpa da idade), era “difícil mudar tanta coisa”.

Para completar o show de horrores, chamou seu público presente no quebra-quebra do 8 de janeiro, em Brasília, de malucos e ainda fez piadinha sem graça com os recursos de 17 milhões de reais que lhes foram doados via Pix, acrescidos de um “pingado” de 1 milhão, que ele, novamente às gargalhadas, comentou que gastava e ainda ajudava a manter a vida do filhote mimado nos Estados Unidos. Pasmem, não é mentira. Soltou a pérola: “nem eu esperava que ia me eleger presidente, tendo em vista quem eu era”.

Pois bem. Minha análise é de que ontem vimos não apenas um covarde mentindo descaradamente, jogando para os outros a responsabilidade de sua própria culpa, mas um elemento imaturo, de cognição limitada, infantilizada, emocionalmente instável, sem qualquer compostura para sentar sequer num banco de réu... E imaginar que esse minúsculo já ocupou a cadeira mais importante da República. Uma lástima! Que venha logo a cadeia para aliviar um pouco a consciência coletiva.

*Advogado, membro da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD) e do Grupo Prerrogativas. Doutor em Direito Constitucional com estudos de Pós-Doutorado em Direitos Humanos. - Fonte: Brasil247

10 junho 2025

Minimizou tentativa - Bolsonaro trata plano golpista como ‘crítica’ estudada dentro das ‘quatro linhas’ em depoimento ao STF

'A dúvida e a crítica fazem parte da democracia, mas sem nenhuma intenção de afrontar o Poder Judiciário', afirmou

Bolsonaro é o quarto réu na ação penal sobre tentativa de golpe a prestar depoimento ao STF nesta terça (10) - Fellipe Sampaio/STF


Por Caroline Oliveira*

Em depoimento à Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), Jair Bolsonaro (PL) afirmou, nesta terça-feira (10) que uma intervenção no processo eleitoral de 2022 foi estudada “dentro das quatro linhas” da Constituição e após a multa imposta pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) ao Partido Liberal

Em dezembro daquele ano, a sigla foi multada em R$ 22,9 milhões por litigância de má-fé ao acionar a Justiça “de maneira irresponsável”. Na ocasião, o PL indicou possível fraude das urnas eletrônicas e pediu a auditoria do resultado. “Um dos grandes desafios da democracia é combater teorias conspiratórias e qualquer outro tipo de conteúdo manipulado ou falso que tem como objetivo influenciar o resultado de votações, criando um cenário desastroso de ruptura social”, disse o então presidente do TSE, Alexandre de Moraes, na época. 

No depoimento, Bolsonaro afirmou que, diante de um recurso, a multa poderia aumentar, o que desencorajou o partido a continuar com a tese no tribunal. Como alternativa, o ex-presidente e seus aliados passaram a estudar outra forma de questionar o resultado. O assunto foi tratado em duas reuniões, em 7 e 14 de dezembro. 

“Essas reuniões que ocorreram foram em grande parte em função da decisão do TSE. Quando peticionamos o TSE sobre possíveis vulnerabilidades, fomos surpreendidos com uma multa de R$ 22 milhões”, disse. “Tratamos, por exemplo, da GLO [Garantia da Lei e da Ordem]. Estudamos possibilidades outras dentro da Constituição. Ou seja, jamais saindo das quatro linhas. Em poucas reuniões, abandonamos qualquer possibilidade de intervenção constitucional.”

“O que existiu na prática era que, como fomos impedidos de recorrer ao TSE, devido à possibilidade de aumentar a multa, nós buscamos alguma alternativa na Constituição. Achamos que não procedia e encerramos a discussão. Em nenhum momento, nós pensamos em fazer algo ao arrepio da nossa Constituição”, disse o ex-presidente. 

Crítica

O ex-presidente também tratou o plano de golpe como uma “crítica”. “Vou buscando colaborar com o TSE para que não haja dúvida. Mas acho que a dúvida e a crítica fazem parte da democracia, mas sem nenhuma intenção de afrontar o Poder Judiciário.”

Na primeira reunião, com o ex-ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira, o ex-comandante do Exército Marco Antônio Freire Gomes e Jair Bolsonaro, o então comandante da Marinha, Almir Garnier, teria dito que colocaria a sua tropa à disposição do ex-presidente.

Na ocasião, de acordo com as investigações, foi apresentada a chamada “minuta do golpe”, que seria utilizada para instalar um estado de sítio no país. Antes, no entanto, a minuta teria sido “enxugada” por Bolsonaro, mantendo a prisão de Alexandre de Moraes e preservando outras autoridades. 

Sobre isso, Bolsonaro afirmou que a minuta, na verdade, seria composta apenas de alguns “considerandos” que foram exibidos na televisão durante a reunião. “Deve ter considerandos apenas. Isso deve ter sido mostrado numa tela de televisão rapidamente. Alguns levantaram a ideia de estado de sítio. Estado de sítio, como reza a nossa constituição, começa com a convocação dos conselhos, o que não foi feito. Ninguém foi convocado para uma proposta de estado de sítio”, afirmou em depoimento.

“Foi passado na tela os considerandos de forma bastante rápida. Não havia da nossa parte uma gana. O sentimento de todo mundo era que não tinha mais nada o que fazer. Então tínhamos que entubar o resultado das eleições”, concluiu.

A respeito de a reunião envolver militares, Bolsonaro disse que foram chamados por fazerem parte da mesma academia que ele, militar reformado. “Sabíamos que nao podia dar em nada. Conversamos a título de desabafo”, respondeu.

8 de janeiro

O presidente também voltou a defender os bolsonaristas que invadiram e depredaram os prédios dos Três Poderes, em 8 de janeiro, em Brasília (DF), em nome de uma “intervenção” para manter Bolsonaro no poder.

“Eu não consigo entender certas penas para pessoas que mal sabiam o que estavam fazendo naquele momento”, disse o ex-presidente. “Eu fico até arrepiado quando falam que 8 de janeiro foi tentativa de golpe. Aquilo não é golpe. Não foi encontrada uma arma. Da minha parte nunca se falou em golpe. O golpe até seria fácil de começar, o after day [dia seguinte, em inglês] que seria difícil de cogitar.”

Ainda tratando o plano golpista como uma “crítica”, Bolsonaro também citou um suposto documento da Associação Nacional dos Peritos Criminais, que falaria em “fraude sistêmica facilitada” e que “todo sistema eletrônico e computacional possui vulnerabilidades”.

Atualmente inelegível, Bolsonaro afirmou que as suas declarações ao longo de 2022 foram dadas no sentido de “aperfeiçoar” o sistema eleitoral para que “não houvesse dúvidas” sobre as urnas eletrônicas. “Se não houvesse dúvida, não estaríamos aqui hoje”, disse Bolsonaro. Em resposta, Moraes afirmou que “não há dúvidas” e que o inquérito “não tem nada a ver com urnas eletrônicas”.

“Vossa Excelência não me viu desrespeitar nenhuma ordem do senhor. Eu joguei dentro das quatro linhas da Constituição o tempo todo. No meu entender, fiz aquilo que tinha que ser feito”, disse Bolsonaro em outro momento.

Entenda

O ex-presidente é réu na ação penal sobre a tentativa de golpe de Estado no país. Em março deste ano, a Primeira Turma do STF decidiu pelo acolhimento da denúncia oferecida pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra Bolsonaro e outras sete pessoas, que integram o primeiro núcleo de acusados da tentativa de golpe abolição do Estado Democrático de Direito.

No total, os crimes dos quais Bolsonaro é acusado podem somar até 43 anos de prisão: dano qualificado com uso de violência e grave ameaça (6 meses a 3 anos), deterioração de patrimônio tombado (1 a 3 anos), tentativa de abolir o Estado Democrático de Direito (4 a 8 anos), tentativa de golpe de Estado (4 a 12 anos) e organização criminosa (3 a 8 anos, que pode chegar a 17 anos a depender dos agravantes).

Antes de Jair Bolsonaro, Almir Garnier, ex-comandante da Marinha, Anderson Torres, ex-ministro da Justiça, e Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), prestaram depoimento ao STF. Na sequência, devem ser ouvidos Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa; e Walter Braga Netto, ex-ministro e candidato a vice na chapa para a reeleição do ex-presidente.

Concluída a fase dos interrogatórios, a defesa e a acusação poderão pedir diligências complementares. Depois será aberto um prazo de 15 dias para que as partes apresentem um resumo com as alegações finais favoráveis ou contrárias aos réus. Por fim, os ministros votarão pela condenação, com a fixação de penas, ou pelo arquivamento do caso. Diante das duas decisões, será possível apresentar recursos dentro do próprio STF.

05 junho 2025

Pesquisa mostra apenas o Brasil que passa na TV

'Pesquisas são apenas o produto sujo do serviço feito diariamente na edição das laboriosas manchetes da mídia tradicional'

Luiz Inácio Lula da Silva (Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/Agência Brasil)

Por Denise Assis*

Contratada pela Genial Investimentos, a empresa Quaest divulgou nova pesquisa nesta quarta-feira (04/06) em que entrevistou presencialmente 2.004 brasileiros de 16 anos ou mais entre 29 de maio e 1° de junho. Segundo ressalta a empresa, a pesquisa tem índice de confiança de 95% e não trouxe boa notícia para o governo.

Os números colhidos apontam para a continuidade da trajetória de queda da popularidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), ainda que em ritmo mais lento, e os que desaprovam o governo oscilaram de 56% em março para 57%, a maior marca desde o início da atual gestão. Já a taxa dos que aprovam o desempenho do Executivo federal variou de 41% para 40%. Surpresa? Nenhuma. Susto? Tampouco. A disparidade entre os índices econômicos e a percepção do grande público, do trabalho do governo, é um sintoma da modernidade, assombrada pelo tsunami reacionário.

Todos nós nos lembramos do que houve nos Estados Unidos recentemente. Uma onda ultradireitista levou o país a acreditar, a partir da força da grana que “ergue e destrói coisas belas”, (como cantou Caetano), que Donald Trump era a melhor opção para o país, ainda que Joe Biden, tenha conseguido reerguer a economia e reduzir a inflação. Não é mais a economia, estúpidos. Agora é o discurso – ou aquela palavrinha que me recuso a usar -, de preferência disseminado nas redes das big techs, dos mega empresários, que tal como acontece nos desfiles das grandes grifes, disputaram a primeira fila na posse de Trump. Sim, ele chegou lá, empurrado por esses senhores que agora moldam o mundo, independente do desempenho do governo anterior.

Por aqui o que se vai delineando é o mesmo jogo de 2018, quando os movimentos inaugurados em junho de 2013 – conforme artigo de Leonardo Attuch, nesse portal: https://www.brasil247.com/blog/o-8-de-janeiro-de-2023-e-o-filho-bastardo-de-junho-de-2013-8axsgykz -, apontava na direção do então candidato pelo PSDB, Geral do Alckimin, na época o representante da “terceira via”. Como o mundo capota, e não apenas gira, quis o destino que Alckmin viesse a aportar na chapa vencedora de 2022, ao lado de Luiz Inácio Lula da Silva e tudo vai muito bem, obrigada. Geraldo Alckmin surpreendeu como vice e Lula hoje o chama de “companheiro Alckmin”, dado o nível de camaradagem entre ambos.

Como se sabe, em 2018 Lula foi tirado do pleito por um twitte escrito pelo Alto Comando do Exército (liderado pelo general Eduardo Villas Boas) e, em seu lugar, na urna eletrônica, foi colocado o nome de Fernando Haddad. Embalados por uma mídia alinhada com o mercado financeiro e distante da realidade do país, os ecos de 2013 aportaram tão fortes no ano da disputa, que os efeitos dos editoriais e matérias acabaram por parir não a vitória da terceira via, mas a de um candidato fascista – com direito à slogan reproduzido e tudo. E assim amargamos quatro anos de horror, com aquele que se tornou inelegível.

E o que isso tem a ver com a pesquisa da Quaest, e com a eleição estadunidense? Tudo. Enquanto lá, as big techs trataram de fazer o trabalho sujo do convencimento de que, apesar do que se havia visto de Trump, ele era “o cara” do momento, aqui a mídia, esquecida de tudo que passou – sim, eles também tiveram a sua cota de desaforos -, volta à carga sobre Lula. O país que passa na TV e é mostrado em alguns grupos nas redes não é o país que se vê ao vivo, nos encontros de Lula com o povo, e nos indicadores. Pouco importa se o desemprego de 6,6% é a menor taxa para o trimestre desde o início da série histórica, em 2012. Pouco importa se o rendimento cresce 3,2% em um ano. E muito menos importa se o PIB do trimestre foi de 1,4. “Ninguém come PIB”, repetem alguns analistas, virando a pobre Conceição Tavares do avesso, para uso ao bel prazer. Estivesse por aí e ela passaria em todos uma “espinafração”, termo que adorava usar.

O resultado é que, de novo, da maneira mais irresponsável com a democracia, porque é disso que se trata, a mídia volta a se alinhar com o mercado e os altos interesses da elite e faz carga sobre um pretenso e ainda não decidido candidato, Tarcísio de Freitas, e agora já dá mostras de que embarcará ou irá tolerar, o filhote de cruz credo, do inelegível, Flávio Bolsonaro, o “menos radical”!

A pesquisa até tenta atenuar o que vem abaixo, com a seguinte explicação: “Trata-se de um cenário de estabilidade em relação ao de três meses atrás, considerando a margem de erro de dois pontos percentuais para mais ou menos, mas que ajuda a prolongar um ciclo de deterioração da imagem do governo, que começou a se revelar nas pesquisas há quase um ano. São cinco rodadas seguidas de escalada do índice de desaprovação, desde julho de 2024”. Só falta terminar o parágrafo com um “Huhuuu”.

A pesquisa falseia com a verdade? Não. Devem ser esses os dados que colheram da boca dos leitores nas ruas. Não é possível ter cenário diferente, quando diariamente as “manchetes” são do tipo: “MapBiomas vê avanço no desmatamento, mas alerta para retrocessos”. Já sei. O problema do Lula são as adversativas...

E assim, de mas, porém, todavia, contudo, vamos traçando o rumo para o retorno dos que não foram, porque eles estão sempre ali, à espreita. E aí, surgem nas pesquisas questões como esta: “Hoje também há mais brasileiros que acham o atual governo “pior” que o anterior, de Jair Bolsonaro (PL). São 44% os que compartilham dessa avaliação, contra 40% que consideram a atual gestão “melhor”, e 13% que veem os dois governos como “iguais”. Já na comparação com as duas passagens anteriores de Lula pelo Planalto, a maior parte da população (56%) considera que o desempenho do petista está inferior agora”. Boa mesmo era a fase do negacionismo, das 700 mil mortes, dos sete anos sem reajuste do salário, da fila do osso...

E o erro não necessariamente está nas pesquisas. Elas são apenas o produto sujo do serviço feito diariamente na edição das laboriosas manchetes. Desde que se ouviu falar que jornalistas precisam ter espírito crítico, que os da mídia tradicional incorporaram o espírito de porco. Consideram que atacar o governo de plantão é seguir a cartilha, já obsoleta, como o diploma, cancelado pelo ministro Gilmar Mendes. Diploma? Para quê? Basta ter curso intensivo de alienação das desigualdades desse Brasil.

*Denise Assis é jornalista e mestra em Comunicação pela UFJF. Trabalhou nos principais veículos, tais como: O Globo; Jornal do Brasil; Veja; Isto É e o Dia. Ex-assessora da presidência do BNDES, pesquisadora da Comissão Nacional da Verdade e CEV-Rio, autora de "Propaganda e cinema a serviço do golpe - 1962/1964" , "Imaculada" e "Claudio Guerra: Matar e Queimar".

Fonte: Brasil247

04 junho 2025

O PT e o futuro

O maior partido de esquerda do Brasil vive com intensidade a mecânica de renovação das direções em nível municipal, estadual e nacional

   Foto: Joana Berwanger/Sul21


Por Luiz Marques (*)

O maior partido de esquerda do Brasil, o PT (Partido dos Trabalhadores), vive com intensidade a mecânica de renovação das direções em nível municipal, estadual e nacional. O debate interno que envolve milhares de filiados, em última instância, diz respeito à melhor estratégia na conjuntura atual para alcançar uma sociedade mais justa, pluralista e igualitária, com políticas públicas para dirimir as graves iniquidades socioeconômicas e culturais que afligem a população há priscas eras.

O processo aciona a “mística” do PT com a solidariedade social como protagonista na constituição de um espírito coletivo nas diversas frentes de mobilização. Confere um significado à existência e objetivos para transcender a realidade em busca de um mundo sem opressão nem exploração. Em 10 de janeiro de 1980, em São Paulo, o fenômeno fez-se presente na fundação do partido e de núcleos para a capilaridade dos ideais socialistas de Norte a Sul, no campo e nas cidades, entre estudantes e trabalhadores. Vê-se ainda na estrela que ilumina a saída dos labirintos. A religiosidade não é um requisito para a epifania. A manifestação do divino no cotidiano também é sentida por agnósticos e ateus que se comovem ao desbravar os caminhos da emancipação, envoltos em disputas e utopias.

A mística pode estar no poema Cantares de Antonio Machado e na canção de amor Volver a los diecisiete de Violeta Parra. Na saudação Camarada! do conto de Máksim Górki e nas fotografias de Sebastião Salgado na exposição Êxodos. Em um seminário com Marilena Chaui na FPA (Fundação Perseu Abramo) e na memória do ambientalista Chico Mendes, da antirracista Lélia González, da feminista Nalu Faria e da Parada do Orgulho LGBT. Nas vezes em que Luiz Inácio Lula da Silva acessou a rampa do Palácio do Planalto e em que Dilma Rousseff vestiu a faixa da presidência da República. Sintetiza as pungentes emoções de humanismo, dignidade, perseverança. No momento, oportuniza a retomada política da aura revolucionária original. Sem medo de ser feliz, na manhã. 

A participação popular

O surgimento do PT coincide com uma virada anticivilizacional: a hegemonia político-ideológica hiperindividualista alicerçada no totalitarismo da mercadoria. A sensação de libertação ao navegar em geografias distantes, on-line, simula a ilusória decolonização e empresta a conotação positiva à globalização neoliberal especulativa. Os deslumbres castellsianos endossam a promessa enganosa da democracia digital na webesfera, encobrindo com um verniz a troca no padrão de acumulação. 

Na contramão, experiências da esquerda em Porto Alegre/RS e Santo André/SP reatualizavam um autêntico “sentimento de comunidade”. O modo petista de governar (1992), sob a coordenação de Jorge Bittar, já destacava “o tema da participação popular, pela importância que tem para o projeto político do PT”. As elites do retrocesso temem a vocação democrática da legenda e desmontam as estruturas e a agenda de sociabilidade do OP (Orçamento Participativo). O Papa João Paulo II e o cardeal Joseph Ratzinger fizeram o mesmo com a Teologia da Libertação e as CEBs (Comunidades Eclesiais de Base), de atuação nas periferias. O preconceito é o pecado que corrompe o Vaticano.

Um estreito laço prende a consciência de classe e a consciência de comunidade, na configuração das identidades políticas. Os historiadores das heroicas greves operárias no ABC paulista (1978-1981) convergem sobre a logística do “movimento contra a carestia” em bairros e favelas, com a coragem indômita das mulheres, para o suporte às atividades dos paredistas que afrontavam a ditadura civil-militar. Com uma “intuição programática”, lideranças alquimistas ergueram um partido de massas e uma central sindical, aplicando as fórmulas históricas de resiliência e autossuperação para avançar. 

A comunidade e a classe

No capítulo “Comunidade e classe”, em Paris, Capital of Modernity (2003), o geógrafo britânico David Harvey anota: “Os marxistas que se recusam a reconhecer a relevância da comunidade para a formação da solidariedade estão equivocados, assim como cegos estão aqueles que afirmam que a solidariedade da comunidade nada tem a ver com classe social. Os signos de classe e consciência de classe são tão importantes no espaço de vivência quanto no trabalho. O posicionamento de classe pode ser expresso tanto pelos modos de consumo, quanto pelas relações com a produção”. A lide dos promotores de mudanças tem dinâmica integradora, abrange do local de moradia aos locais de estudo e labor. Pesquisas eleitorais mostram a conexão; os votos costumam preservar a coerência.

Prefeitos reacionários interrompem o fluxo de empatia entre a comunidade e a classe, de uma forma burocrática. Providências para eximir o poder público das obrigações no cuidado das praças nunca visam uma cogestão do espaço com as associações periféricas. Empresas e lojas comerciais são as priorizadas. O comunitarismo é esvaziado em favor do “clube dos ricos” que, no léxico do bravo Pepe Mujica, remete aos rastaqueras que preenchem o vazio da alma com a ostentação de bens de luxo. Os fetiches servem para ofuscar personalidades medíocres, de contribuição restrita à Forbes

Contratações de artistas da sofrência com exorbitantes cachês, cotejados às receitas dos municípios, explicam-se. Afora possibilitarem “rachadinhas”, sinalizam um símbolo de empreendedorismo dos vencedores na guerra de todos contra todos. O poder do dinheiro é consagrado no espetáculo, com o elogio subliminar de uma dominação. Os cidadãos ativos de direitos se convertem em consumidores passivos, ensimesmados. O lema é “Sofro, logo existo”. A moral é “Sou dependente de drogas”; a saber, dos aplicativos de transporte e alimento, terceirizações e baixos salários. A música sertaneja comercial traduz a privatização das desditas sociais na subjetividade de perdedores que sangram para viver. Como se o Estado não contasse; só contassem os indivíduos e suas errâncias afetivas.

Desenvolver a vanguarda

A necropolítica resume a saga da extrema-direita. A liberdade que vale é a da circulação do capital improdutivo. O valor da igualdade é tratado como um estorvo socialmente. Para as finanças e as Big Techs (a plutocracia), as desigualdades, as fake news e a pós-verdade são bem-vindas. A competição é a conduta prescrita para o povo. Acima impera a monopolização da riqueza e das informações; do mando e das regalias; do bem-estar e do conhecimento. A fraternidade institucional é abjurada por governanças conservadoras que exaltam os ajustes fiscais da austeridade. O capitalismo realmente existente precisa da ação dos modernos “capitães do mato” para a gentrificação e a financeirização. 

Sequer a gentileza sobrevive nas urbes. A impaciência com carros velhos e pedintes na via pública sintomatiza a aporofobia contra pobres. Assaltantes do Erário continuam soltos. A mídia corporativa esconde-os da sociedade porque apoia o monetarismo do Consenso de Washington, a autonomia do Banco Central, as agências financeiras, o agronegócio, o extrativismo e o mega varejo. Conquanto a força do leão tenha se debilitado, a raposa com astúcia lança o lawfare à resistência dos comuns. A aliança da imprensa protofascista com o neoliberalismo mantêm a velha ordem. Mas estamos aqui. 

O presidente Lula empenha-se em desbloquear a multipolaridade e dar um rumo contra-hegemônico aos embates no patamar internacional. O país deve ser uma alavanca no combate à crise climática. A COP-30 (Conference of the Parties30th edition) é uma linha de contenção à insensatez predatória, exceto para o Executivo estadunidense, o Congresso brasileiro e os arquibilionários que dobram a aposta na destruição para proteger seus apocalípticos privilégios. A proliferação dos Data Centers vorazes no consumo de energia (água potável, eletricidade) traz riscos ecológicos imensos à vida.  

Toca aos progressistas a responsabilidade para deter a hecatombe social e ambiental no século XXI. A novidade é que o novo sujeito da história não se reduz a uma classe; agora é composto por 99% da humanidade. O FSM (Fórum Social Mundial) reorganizado é capaz de desenvolver a vanguarda. “A rosa já se faz flama / no gume do coração”, alerta o poeta do Amazonas na Cantiga de Claridão

(*) Docente de Ciência Política na UFRGS; ex-Secretário de Estado da Cultura no Rio Grande do Sul - Fonte: Sul21

02 junho 2025

VÍDEO: Chico Buarque visita Gil no show Tempo Rei em encontro histórico

Os dois fizeram uma interpretação arrebatadora de “Cálice”, canção composta por eles em plena ditadura militar, marcada como um grito contra a censura e a repressão


Um dos momentos mais memoráveis da música brasileira se reencenou na noite deste domingo (1º), no Rio de Janeiro. Durante apresentação da turnê Tempo ReiGilberto Gil surpreendeu o público ao receber Chico Buarque no palco da Marina da Glória para uma interpretação arrebatadora de “Cálice” — canção composta nos anos 1970, em plena ditadura militar, e marcada como um grito contra a censura e a repressão.

A aparição de Chico não estava anunciada, o que intensificou a emoção da plateia ao vê-lo surgir para dividir os vocais com Gil em um dos mais emblemáticos hinos da resistência cultural do país. A performance, carregada de significado histórico, foi também um reencontro de duas figuras centrais da música popular brasileira.

A noite de domingo deu continuidade à sequência de encontros especiais que vêm marcando a nova turnê de Gil. No sábado (31), foi a vez de Djavan se juntar ao anfitrião no palco. Juntos, eles interpretaram “Estrela”, balada lançada por Gil em 1997 e que ganhou nova vida na voz de dois mestres da MPB.

Turnê celebra legado e promove encontros inéditos

A Tempo Rei é mais do que uma celebração da obra de Gilberto Gil: é um tributo vivo à música brasileira. Com apresentações iniciadas em Salvador e já realizadas também em São Paulo e no Rio de Janeiro, a turnê segue agora para Brasília, Belo Horizonte, Curitiba, Belém, Porto Alegre, Fortaleza e Recife.

Um dos principais atrativos da série de shows tem sido justamente a presença de convidados surpresa. Nomes como Sandy, Marisa Monte e Arnaldo Antunes já subiram ao palco ao lado de Gil, proporcionando ao público experiências únicas em cada cidade.

Aos 82 anos, Gil segue renovando sua conexão com o público e com outros artistas, relembrando canções históricas e reafirmando a força da música como expressão política, cultural e afetiva. A apresentação ao lado de Chico Buarque, neste domingo, foi mais uma prova disso: um momento raro e potente em que memória e arte caminham juntas no presente.

*Por Julinho Bittencourt na Fórum