Por Ricardo Kotsho*
Foram tantas as boçalidades proferidas por este ex-militar bronco e
inculto no programa Roda Viva de segunda-feira que fica até difícil
escolher uma só para abrir esta matéria sobre a entrevista de Jair
Bolsonaro, o candidato das trevas.
Minha filha Mariana, também jornalista, me mandou essa:
“Se você, por exemplo, aumentar o número de empregos no Brasil a tendência de alguém procurar um hospital diminui…”.
Como assim? Quem trabalha não fica doente, pergunta a Mariana, que conclui:
“Pior do que os absurdos dele é ter quem acredite e concorde”.
É verdade. O maior problema político do Brasil hoje não é ter um tipo
como Bolsonaro favorito nas pesquisas presidenciais sem o nome de Lula.
O grande perigo de um brutal retrocesso está nos milhões de
Bolsonaros que o apoiam e declaram voto nele porque pensam como ele,
este projeto de nazista tupiniquim.
Por isso, o grande mérito dos jornalistas entrevistadores do último
Roda Viva da série com os presidenciáveis foi expor a exótica figura
durante uma hora e meia em rede nacional de televisão para que ninguém
depois diga que foi enganado.
Além das barbaridades que falou sobre direitos humanos, as agressões
contra pessoas da maior dignidade, como o ex-ministro da Justiça José
Gregori, a ofensa à família de Vladimir Herzog ao colocar em dúvida seu
assassinato no DOI-CODI, o que mais me chamou a atenção na entrevista
foi a total incapacidade dele de juntar duas frases com sentido e não
conseguir responder nem às perguntas mais simples, sem nenhum
compromisso com a lógica ou com o país.
Debochado e leviano, Bolsonaro seria reprovado em qualquer exame psicotécnico de admissão num emprego.
Para ninguém pensar que estou exagerando (vale a pena ver a integra
do programa no site da TV Cultura), vou reproduzir só um trecho do
diálogo de surdos entre o candidato e a repórter Maria Cristina
Fernandes, do jornal Valor:
MCF: Qual a sua proposta para que a mortalidade infantil deixe de subir?
JB: Quando se fala em mortalidade infantil, isso tem a ver com os
prematuros. É muito mais fácil um prematuro morrer do que um bebê que
cumpriu uma gestação normalmente. Medidas preventivas de saúde…
MCF: Isso não tem muito mais a ver com saneamento básico?
JB: Tem um mar de problemas (…) Muita gestante não dá bola para a sua
saúde bucal ou não faz os exames do seu sistema urinário com
frequência.(…) Agora, eu vou dar a missão. Quem for para o ministério da
Saúde, tem que realmente cuidar da saúde e não da doença,
prioritariamente.
MCF: E como o senhor vai fazer isso reduzindo os gastos?
JB: O que acontece… Não só a Inglaterra… Você, você, você vai
conjugar também com desburocratização, desregulamentação… Que é o
inferno da vida de quem quer empreender no Brasil. Quem quer ser patrão
no Brasil em sã cosnciência?
MCF: Eu tô falando de saúde, deputado.
JB Você falou de economia… Como vai reduzir impostos e vai entender
economia (???) Se você, por exemplo, aumentar o número de empregos no
Brasil, a tendência de alguém procurar hospital vai diminuir.
Dá para acreditar no que ele respondeu quando a pergunta foi sobre saúde pública?
Foi assim o programa inteiro: ele não entendia as perguntas e
respondia qualquer coisa sem se importar com a veracidade dos fatos e
números citados, chutando para todo lado.
Pode ser o tema que for, ele usa os mesmos jargões que repete nos
discursos gritados em cima de carros de som nos aeroportos por onde
passa.
O que mais me assusta é encontrar cada vez mais gente que fala e
pensa como ele, numa mistura explosiva de desinformação e má fé, mesmo
pessoas com curso superior e bom padrão de vida.
Nesta campanha eleitoral, pior do que tudo, estamos criando uma
legião de Bolsonaros que vieram para ficar, cheios de certezas,
verdadeiras hordas de seguidores fanáticos que se caracterizam pela
violência e ignorância.
Foi a eles que o candidato se dirigiu no Roda Viva, sem dar a menor
satisfação aos jornalistas e ao público em casa, o resto do eleitorado
que não professa a sua fé num trabuco para resolver todos os problemas
nacionais.
É impossível resumir num post todas as sandices, estultices, mentiras
e canalhices que ele foi capaz de proferir, às vezes rindo dele mesmo,
como se estivesse falando com um bando de retardados.
Bolsonaro tornou-se a melhor expressão do que sobrou da Operação Lava
Jato deflagrada para acabar com o antigo “sistema político corrupto e
viciado” para pregar a renovação nas eleições de 2018.
O personagem para encarnar o novo que encontraram é esse deputado
profissional de sete mandatos, que se apresenta como o Trump nativo
contra “tudo isso que está aí”.
Lançado por um partido nanico, sem alianças nem tempo de TV, sem
qualquer programa de governo, candidato do “eu sozinho contra o mundo”,
aquele que manda perguntar no Posto Ipiranga (seu assessor Paulo Guedes,
um ultraliberal guru do ex-capitão nacionalista e estatista) quando não
sabe as respostas.
Estamos bem de candidato favorito, o homem que tem entre 17 e 19% nas pesquisas de intenção de voto a 70 dias da eleição.
O que já está péssimo, sempre pode piorar. Preparem-se.
E vida que segue.