Por
Wladimir Pomar*
O
Brasil parece estar atravessando um momento político especial. Há um esforço
concentrado dos partidos de direita, de centro e mesmo de esquerda para impor
uma derrota ao PT nas eleições municipais, todos já tendo em vista as eleições
de 2014. Ao lado disso, ou mais provavelmente articulado a isso, a Procuradoria
Geral da República e o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do chamado
mensalão, viram-se na contingência de fazer vista grossa às leis vigentes no
país, sobre as quais julgaram casos idênticos precedentes, e de substituí-las
por uma jurisprudência corporativa própria.
O
exemplo mais emblemático dessa quebra de procedimentos legais foi o julgamento
de Luiz Gushiken, antigo dirigente do PT e ministro do primeiro governo Lula.
Desde o início considerado inocente das acusações que lhe faziam, na CPI, na
polícia e no Ministério Público, por alguma razão que a própria razão parece
desconhecer, Luiz Gushiken foi arrolado pelo procurador e pelo relator. Assim,
embora reconhecidamente inocente, foi julgado por todos os membros do tribunal,
cujo único propósito parece ter sido dar à imprensa a dica para divulgar que
ele foi julgado inocente por falta de provas. Na verdade, o correto seria dizer
que todas as provas demonstraram sua inocência. O que, no mínimo, coloca a
Procuradoria Geral da República, o STF e os órgãos de imprensa diante da
possibilidade de um processo de retratação e ressarcimento por danos morais.
Independentemente
de se considerar se há ou não réus culpados, fica cada vez mais evidente que
esse julgamento não se pauta por parâmetros jurídicos, mas por parâmetros
políticos. Ele não se dirige apenas a condenar tais réus. Procura suscitar,
politicamente, não apenas a existência de uma organização criminosa incrustada
no PT, mas a suposição de que o próprio PT pode ser tal tipo de organização.
Não é por acaso que tal figura jurídica, inexistente na legislação brasileira
sobre a qual esses réus estão sendo julgados, tenha sido reiterada verbalmente
pelo procurador e por alguns juízes, e divulgada deliberadamente na imprensa.
Nessas
condições, os petistas que supunham superada a época das lutas de classes, e
consolidados os processos democráticos civilizados no país, talvez precisem
rever suas ilusões. Eles se encontram em meio a um turbilhão de aspectos
políticos de vulto que, mais uma vez, pretendem destruir esse partido, seja
fazendo-o mudar sua natureza, seja minguando-o social e politicamente. Exemplos
dessas tentativas, na atualidade, podem ser encontrados nos esforços da grande
burguesia, apesar do fracasso da experiência neoliberal, em convencer o governo
de que qualquer privatização é superior a qualquer intervenção estatal. É
lógico que ela não quer que o governo feche os financiamentos estatais a ela.
Mas, fora isso, não deseja que o Estado se meta em mais nada, pressionando o PT
a aceitar essa situação como irrecorrível.
Além
disso, a grande burguesia se empenha em monopolizar todos os projetos
apresentados pelo governo. Com isso, na prática funciona como um freio e coloca
em risco a redistribuição e renda, um dos programas chave do governo e do PT.
Ela também se empenha em provar que o chamado Custo Brasil está associado
principalmente ao custo dos salários, procurando desregulamentar a legislação
trabalhista e aumentar as taxas de exploração da força de trabalho, procurando
fazer com que o PT se volte contra sua própria origem.
Ao
mesmo tempo, os representantes políticos da burguesia, não só os da oposição,
se esforçam em demonstrar que os problemas relacionados com a infraestrutura e
com o fenômeno da desindustrialização resultam da lerdeza e ineficiência dos
governos Lula e Dilma, e não da quebradeira provocada pelos governos
neoliberais, em especial do período FHC. E, a rigor, os representantes
políticos da burguesia, fora e dentro do governo, atuam ideológica e
politicamente contra qualquer medida democrática e popular proposta pelo
governo, enquanto a grande mídia opera, abertamente, como agência escrachada de
propaganda marrom, seguindo à risca a hipocrisia de Demóstenes Torres.
Portanto,
a pressão para o PT mudar de caráter, ou simplesmente ser destruído, continua
na pauta da burguesia brasileira e aumentou de intensidade. A dificuldade da
burguesia consiste em que continua politicamente dividida por não possuir um
projeto alternativo comum de desenvolvimento capitalista. A grande burguesia
das corporações nacionais e estrangeiras pretende manter seu oligopólio sobre a
economia, para impor preços administrados e obter alta lucratividade. Isto, por
sua própria natureza, é impedimento ao crescimento dos demais setores
burgueses, que pretendem um desenvolvimento que atenda também seus interesses
de lucratividade e baixo risco.
Embora
estes setores não queiram, ou temam, romper com os setores oligopólicos, essa
divisão abre chances para que os trabalhadores e os setores populares e
democráticos da sociedade brasileira implantem um projeto de desenvolvimento
econômico e social que, embora ainda sob a égide capitalista, expanda os médios
e pequenos empresários industriais, comerciais e de serviços, imponha a
concorrência aos setores oligopolistas, reforce o setor estatal da economia e,
mais do que tudo, gere milhões de empregos para recompor a força social da
classe trabalhadora.
Porém,
para isso, não basta que a esquerda no governo prepare e procure implantar
projetos de desenvolvimento. É fundamental que os discuta com todas as forças
populares e democráticas, de modo a criar um apoio social consistente para esse
embate crescente.
*Wladimir
Pomar é escritor e analista político.