EXTRADIÇÃO DE PAIS DE CRIANÇAS
BRASILEIRAS: ESTA INFÂMIA SE REPETIRÁ?
Há
82 anos, o Supremo Tribunal Federal autorizou o ditador Getúlio Vargas a
extraditar para a Alemanha Olga Benário, grávida de uma filha do líder
comunista brasileiro Luiz Carlos Prestes, sob a alegação de que ela era
militante do Komintern (a Terceira Internacional).
A patética
acusação de crime ideológico sob um regime de exceção que no ano
seguinte viria a promulgar a famigerada Constituição de 1937 (aquela que
instituiu o Estado Novo
absolutista) deu a Vargas a possibilidade de, coerentemente com as
óbvias simpatias que demonstrava pelo nazifascismo, entregar Olga a seus
piores inimigos. Ela morreria aos 34 anos, no campo de concentração
nazista de Ravensbruck, nas cercanias de Berlim.
A filha de Olga e Prestes, nascida naquele local medonho, foi salva graças ao clamor internacional. Recebeu o nome da avó brasileira, Anita Leocádia Prestes, e hoje é uma historiadora de 82 anos.
Agora estamos a
ver uma nova autorização para extraditar-se um preso político, com o
Poder Judiciário, tal como Pilatos no Credo, lavando (ou sujando) as
mãos ao transferir a decisão final para um presidente em fim de mandato,
que só escapou até agora dos processos por corrupção graças à imunidade
do cargo.
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Matteo Salvini, ícone da desumanidade italiana... |
Pior: sabendo
que ele não passaria de uma correia de transmissão, tanto que já
decretou a entrega imediata do extraditando a alguém que tem todas as
características do homem para quem despacharam Olga: Adolf Hitler,
principal responsável pelo desencadeamento da maior carnificina da
história da humanidade, a 2ª Guerra Mundial, na qual morreram cerca de
50 milhões de seres humanos.
Pois quem já anunciou que virá ao Brasil para buscar o delinquente
é o ministro do Interior Matteo Salvini, um neofascista que estarrece o
mundo por sua extrema desumanidade para com os imigrantes, fugitivos da
miséria que ele prefere ver mortos no mar do que vivos em solo
italiano.
As circunstâncias daquela época eram similares as de hoje.
O mundo vivia
os reflexos da grave crise causada pela segunda revolução industrial
fordista, que deslocou o centro de gravidade do capitalismo mundial, e
pelas disputas entre países que aspiravam à hegemonia econômica na nova
ordem que surgia.
Foi quando despontou, na Alemanha que fora muito humilhada após a derrota na 1ª guerra mundial, um pretenso salvador da pátria: Adolf Hitler.
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...diz que virá pessoalmente buscar Battisti... |
Com gestual
belicista; discursos dramáticos; incitação ao poderio militar belicista
que restauraria o orgulho alemão; disciplina rígida; apologia ao
trabalho como forma de salvação econômica; e colocando a culpa das
dificuldades alemãs na corrupção judia que dizia solapar os pretensos
bons valores nacionalistas germânicos, conquistou os alemães, que
engoliram a pílula da sua própria desgraça na época.
O país pagaria alto preço por sua aventura ensandecida.
Ora, se o
culto povo alemão se deixou levar por um fanfarrão desses, por que tal
fórmula não daria certo num país de analfabetos funcionais ou
disfuncionais como o Brasil (contando, ademais, com as possibilidades de
manipulação em massa facultadas pela nova mídia de comunicação
instantânea, a internet)?
A crise
econômica da terceira revolução industrial da microeletrônica é o grande
fator de surgimento de bravateiros de segunda classe, que anunciam o
novo, ainda que sejam uma caricatura tosca do velho.
E, como consequência deste momento de desalento e retrocesso generalizado, estamos assistindo ao calvário de um
pai de filho brasileiro, pacato e culto cidadão italiano residente no
Brasil há mais de uma década, totalmente desvinculado de qualquer
participação política revolucionária (não que isso devesse ser
considerado crime): trata-se é claro, do já sexagenário Cesare Battisti.
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...repetindo as fanfarronices de seus grande ídolos. |
Sentenciado
num processo italiano que transcorreu à sua revelia, no qual foi
acusado sem possibilidade de defesa da prática de atos de guerrilha
urbana à época de Aldo Moro (até nos nomes a história se repete), se
localizado ele vai passar o resto de seus dias numa masmorra italiana ou
cumprirá a promessa de suicidar-se, de preferência a aceitar a
extradição.
Na esteira
dessa circunstância de crise econômica grave no Brasil, veio na última
6ª feira (14) uma decisão judicial monocrática, embora, pela relevância
do tema, a questão devesse ser submetida a um colegiado.
E tal decisão
foi na linha de dar-se um desfecho diferente à opção adotada pelo
presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 31/12/2010, como se isto fosse
possível em termos legais: as
circunstâncias atuais não são as mesmas do julgamento anterior e,
negada a extradição por Lula e transcorrido o prazo legal de cinco anos
sem que fosse apresentada nenhuma contestação, passou a ser matéria
processual preclusa com trânsito em julgado.
Mas, na Justiça, quando convém que
os tribunais superiores atendam a reclamos e interesses políticos (como
no caso Olga Benário), a vontade dos poderosos sempre prevalece e se
desencavam argumentos jurídico-processuais para justificar qualquer
decisão judicial teratológica, mesmo que isso afronte o Estado de direito tão solenemente defendido pela hipocrisia estabelecida.
Corremos o
risco de mais uma vez entregarmos de bandeja a cabeça de um antigo
ativista político aos algozes, no caso os italianos belusconicistas, a
quem seus pares brasileiros servem docilmente.
Ontem eram Hitler e Getúlio, hoje são Giuseppe Conte e Boçalnaro, o ignaro, todos profundamente identificados com os ideais fascistizantes, de triste memória e repulsivo presente.
Pobre povo a
seguir cegamente esses salvadores da pátria que guilhotinam os
revolucionários com o beneplácito da cegueira conscienciosa judiciária! (por Dalton Rosado)