09 janeiro 2020

Veríssimo: 'O nosso lado está com a razão mas o lado deles está armado'

Luis Fernando Veríssimo foi entrevistado na edição especial do Brasil de Fato Humor, realizado em parceria com a Grafar

O maior cronista brasileiro vivo driblou, com brilho, não apenas o Bolsonaro como a malícia dos entrevistadores / Fotos: Tânia Meinerz
Brasil de Fato RS e Grafar*

Por que o maior cronista brasileiro vivo aceitou esta entrevista? Não oferecemos grana nem glória – que glória, aliás, poderíamos oferecer a quem acaba de ter o romance O Clube dos Anjos traduzido para o mandarim? Aceitou pelo combate, o melhor deles, o combate à estupidez. Aí, deu no que deu: Luis Fernando Verissimo concedeu sua maior entrevista, tanto em número de perguntas como de respostas – para quem fala pouco, o homem fala pra chuchu. De quebra driblou, com brilho, não apenas o Bolsonaro como a malícia dos entrevistadores. Enfim, todos saímos ganhando, exceto o governo. Governo? Pobre palavra, como tantas outras, nas mãos dos brilhantes ustras da incomunicação. 
Ayrton Centeno – Lembro que, lá na virada do milênio, no auge do neoliberalismo, você disse que estávamos entrando em um novo século só não se sabia qual. E agora, já descobriu?
Luis Fernando Verissimo – A gente só conhece o futuro quando ele chega, e aí não é mais futuro, é presente, e irreversível. Quem diria que o século em que estávamos entrando, no Brasil, era o 19?
Ernani Ssó – Quando Bolsonaro disse I love you ao Trump não deveria estar vestido de rosa, conforme orientação da ministra Damares?
Verissimo – Dizem que o mais constrangedor foi o Bolsonaro pedir uma mecha do cabelo do Trump e oferecer, em troca, a Petrobras.
Centeno – Além do amor trumpiano, não lhe parece contraditório que o presidente, um homofóbico explícito, insista em tiradas como aquela quando disse querer “continuar transando” com o Alexandre Frota ou declare que “casou errado” com o vice Mourão e deveria ter “casado” com o príncipe?
Verissimo – O presidente estava obviamente usando linguagem figurada, como quando afirmou que mataria um filho que aparecesse namorando um bigodudo, ou o mandaria para um exilio na nossa embaixada em Washington. Só não ficou claro o que o presidente tem contra bigodudos.
Ernani – A propósito, é verdade que o Carlucho se tratou com o Analista de Bagé? O senhor teve acesso ao diagnóstico?
Verissimo – O Analista aceitou analisar o Carlucho e o recebeu com um joelhaço, causando inveja em grande parte da população.
Fraga – Pra fazer arminha, Bozo usa um marco evolutivo, o polegar opositor, e o indicador, o dedo mais acusatório de todos. Como o Analista de Bagé interpretaria esse gesto?
Verissimo – O dr. Freud diria que tem alguma coisa a ver com a tal inveja do pênis.
Santiago – No embalo em que vamos, achas que chegaremos a um estado teocrático evangélico com obrigatoriedade de saias maria-mijona para mulheres e proibição de Darwin nas escolas?
Verissimo – Deus criou o mundo em seis dias e aproveitou a folga do sétimo para calcular quanto as igrejas lucrariam não tendo que pagar impostos, não Lhe sobrando tempo para fazer a Terra redonda em vez de plana, como era no projeto original. Se você não acredita nisso prepare-se porque a Inquisição vem aí.
Fraga – Bozonaro morre (eba!) e, por engano qualquer na passagem da alma pro além, ele vai pro céu. Imagine o seguinte: como Ele receberia ele? O que Bozonaro ouviria de Deus?
Verissimo – Deus cobraria do presidente: “Que ministério é esse, seu Bolsonaro? Assim, nem Eu posso ajudar, o que dirá o dr. Olavo”.
Celso Schröder – Se o aquecimento global é marxista podemos deduzir que o período glacial tenha sido um momento weberiano da história?
Verissimo – Todo o mundo sabe que a Era Glacial teve inspiração comunista e os vulcões são controlados pelo Greenpeace. E que o óleo que deu nas praias grã-finas era um claro episódio da luta de classes. (...)
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