12 setembro 2013

Desabafo sobre o ‘mensalão’

'O que fica claro para mim é que o que a direita não conseguiu ganhar no voto tenta ganhar nesta aliança de uma mídia comercial desqualificada com um segmento do poder judiciário. Quando gritam “pega ladrão”, eu começo dando uma boa olhada em quem está gritando.'


Este negócio do Supremo Tribunal Federal simplesmente não passa no filtro do bom senso. Se houvesse alguma prova concreta de mensalão, não seriam necessárias milhares de páginas nem tantos anos. Um documento bastaria.

Se fosse justo, não estariam recorrendo a argumentos tão tortos do “deveria saber”, como denuncia Bandeira de Mello. Se fosse honesto, não trataria de maneira tão desigual o processo de Minas Gerais e o atual. Se fosse de bom senso jurídico, seria um julgamento técnico, discreto e direto, e não um teatro nacional, novela de batalha do bem contra o mal. 

Se fosse decente, não montariam todo este espetáculo para coincidir com a campanha eleitoral de 2012, culminando numa sexta-feira, véspera da eleição. O que, aliás, pelos resultados, nem deu certo. Se fosse imparcial, como se imagina que a Justiça deveria ser pelo menos um pouco, não seria o processo tão claramente politizado contra o Partido dos Trabalhadores. 

Se fossem tão corruptos, um Genoíno ou um José Dirceu, pelo menos teriam enriquecido um pouquinho. Sequer são acusados disso, não faria sentido. E se o dinheiro foi efetivamente aplicado nas campanhas publicitárias, como está provado com notas fiscais e como todo mundo viu na TV, como pode ter financiado o dito mensalão? Sobraria o “bônus de volume”, uma merreca, que faltou provar que seria dinheiro público. 

Na falta de crime, ou de provas, sobrou ódio ideológico. A grande justificativa final de tanta falta de justiça foi repetida por Miguel Reale no Roda Viva: estavam comprando os deputados para votar as leis que queriam, portanto estavam deturpando a política, apropriando-se do poder.

Bem, primeiro, estavam eleitos. Segundo, a própria lógica revela santa simplicidade, ou santa hipocrisia. A moeda de troca com os parlamentares não é nenhum mensalão, mas os cerca de 15 bilhões de reais (só em 2007) que são as emendas parlamentares, com as correspondentes “rachadinhas”, legalmente instituídas, generalizadas a partir de 1993 com os “anões do orçamento”. São 25 emendas por parlamentar. 

O que fica claro para mim é que o que a direita não conseguiu ganhar no voto, tenta ganhar nesta aliança estranha de uma mídia comercial desqualificada com um segmento do poder judiciário. E esta mídia, agitando para um povo que anseia por ética, de que finalmente “pegamos os corruptos”, é realmente abaixo da crítica, e não quer ver a corrupção real.

Quando gritam “pega ladrão”, eu prudentemente, com muita coisa vista, e tendo estudado suficiente direito, começo dando uma boa olhada em quem está gritando. Justiça não é teatro.

*Ladislau Dowbor é professor titular no departamento de pós-graduação da PUC/SP e da Universidade Metodista de São Paulo, e consultor para agências das Nações Unidas, governos e municípios.

Debate sobre o PED do PT

Situação crítica na cúpula do PT

Diretório Nacional do PT se reuniu nesta segunda-feira, em São Paulo (Fotos: Luciana Santos/PT)
Da crise de regime à crise de direção
Do sítio de 'O Trabalho', corrente interna do PT Nacional: 'A “crise de regime” aberta em junho corresponde a uma crise de direção no PT. A reunião extraordinária do Diretório Nacional, dia 29, examinou três recursos de Valter Pomar, Markus Sokol e Renato Simões, feitos contra o desmantelamento das regras do PED, decidido pela maioria do mesmo DN no dia 20. A discussão sobre o PED terminou por um acordo.
Gleber Naime (da corrente Construindo um Novo Brasil – CNB/MG) propôs interromper o debate, com apoio do presidente Rui Falcão – ambos em dissonância com outros que reafirmavam as decisões , como Florisvaldo, Paulo Ferreira, deputado Devanir e Jorge Coelho –, para construir um acordo entre as chapas em reunião com a presidência. Entre as decisões, se destaca a revogação da dispensa do “registro de pelo menos uma atividade partidária” como condição de participação no PED, dando-lhe maior abrangência (todos inscritos em chapa que pagaram o partido no prazo de 30 de agosto são aptos, além dos que assinam o abaixo-assinado da reforma política, já que a exigência de pelo menos uma reunião do PT no último ano já havia sido “flexibilizada”). O fundo eleitoral interno foi redividido: 35% em partes iguais para as várias chapas. A reunião do DN anterior havia rebaixado esse total de 50% para 20% do fundo (o resto é proporcional às vagas no diretório correspondente). O acordo é o recuo obrigado da cúpula do CNB que “passou o trator” no DN passado.
Na nova situação, a ameaça do PED ser questionado em sua legitimidade por várias forças foi o fator expresso para o recuo. Mas justamente a pressão da situação das ruas é um dos fatores que levou o CNB a abrir as porteiras do PED e endurecer no financiamento. Buscavam uma “participação” ainda maior que os 500 mil votantes do PED de 2009, através do carregamento de eleitores, sem debate partidário, quando a sua política agora é contestada nas ruas. Tudo se resumiria a demonstrar a “força” inflada de eleitores.' (...)
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O “ministro” Merval entrega os pontos e diz que decisão foi “política” (Fernando Brito)



Depois de sustentar, durante semanas a fio, a tese de Joaquim Barbosa – cuja formulação original, por “mérito”, cabe ao “jurista” Reinaldo Azevedo, o blogueiro da Veja – de que o regimento do Supremo, no que tange aos embargos infringentes, havia sido revogado, o ministro informal do STF, Merval Pereira admite que esta batalha está perdida, por seis a cinco ou, talvez, sete a quatro.
É curiosa a tese de que a decisão, diz ele, tem “um viés claramente político”.
Quem ouviu o voto da Ministra Rosa Weber, deve ter notado que ela começou sua fala – após o ministro Luis Alberto Barroso ter votado na linha da tradição “garantista” do STF e de Teori Zavasscki tê-lo seguido com fundamento na história deste tipo de recurso – marcando uma linha de corte na sua interpretação do caso:
- Esta é uma questão essencialmente técnica!
E, a partir daí, montou quase que um esquema a ser usado num curso de Direito.
1. O Regimento do STF foi recebido com força de lei pela Constituição e, portanto, o que ele dispõe tem força legal;
2. Os embargos infringentes, previsto no art. 333 deste Regimento tem, assim, força de lei e só por lei pode ser revogado;
3. A Lei 8.038/90 não revogou expressamente o artigo 333, inciso I, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal; nada dispõe em contrário à norma regimental e não disciplina inteiramente nem o processo da ação penal originária, nem taxativamente os recursos da competência do Supremo como exige, para a revogação,  a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro.
Ponto.
Será, por acaso, que Merval está acusando de terem ”um viés claramente político” ex-ministros de tribunais superiores, como Carlos Mário Velloso, Hamilton Carvalhido e Celso de Mello, que se manifestaram publicamente pelo cabimento destes embargos e, salvo uma triste surpresa, este último voltará a fazê-lo hoje, apesar das pressões que lhe fazem, inclusive as dele próprio, Merval?
Os três, como se sabe, chegaram a ministros nomeados por Fernando Henrique Cardoso, mas nem por isso alguém questiona o saber ou a independência de suas opiniões jurídicas.
O que já não ocorre com o “saber jurídico” de Merval, acostumado a juízes que, sem luz própria, querem brilhar com os holofotes da mídia.
*Por Fernando Brito, no  (ótimo) sítio 'Tijolaço'  http://tijolaco.com.br

11 setembro 2013

“Espero que os embargos infringentes sejam aceitos e possam, ao menos, mitigar muitas injustiças e erros”


Por Conceição Lemes*

Celso Antônio Bandeira de Mello, sem favor algum, é reconhecido, aqui e no exterior, como um dos mais brilhantes juristas brasileiros.

Professor Emérito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-S), Bandeira de Mello sempre esteve à frente de causas progressistas, tais como a luta contra as privatizações realizadas no governo do então presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB-SP).

Desde o início do julgamento da Ação Penal 470 (AP 470), o chamado mensalão, desejava entrevistá-lo.  E quanto mais casuísmos foram aparecendo ao longo do processo, mais essa vontade aumentava. Mas o professor relutava por questões pessoais. Finalmente nessa terça-feira 10, às vésperas do final do julgamento da AP 470, consegui que  o mestre Bandeira de Mello me concedesse esta entrevista.

Viomundo — Professor, qual a sua avaliação do julgamento da Ação Penal 470? 

Bandeira de Mello – Eu considero que o processo foi todo viciado. Por várias razões. A  começar pelo fato de que ele não respeitou a necessidade de aplicar o duplo grau de jurisdição. O Supremo julgou todos os denunciados como se estivessem incursos no único dispositivo que permite isso — o artigo 101 da Constituição.

Na verdade, a regra dos dois graus de jurisdição é universal, por assim dizer. Os ministros do Supremo passaram por cima dessa regra, eles não quiseram nem saber sua importância. É um absurdo na minha opinião. Esse é o primeiro ponto.

O segundo ponto é que os ministros do Supremo adotaram um princípio, a meu ver, é incabível. O princípio de que as pessoas são culpadas até que se prove em contrário. A regra é outra: as pessoas são inocentes até que se prove o contrário.

No caso do José Dirceu, eles partiram do princípio de que o Dirceu era culpado, porque ele era hierarquicamente superior às outras pessoas. E isso bastaria para configurar a responsabilidade dele.  Portanto, uma responsabilidade objetiva.

Viomundo — Do ponto de vista jurídico, isso não é um absurdo? 

Bandeira de Mello — Claro que é um absurdo. Isso cria uma inseguridade jurídica enorme. Esse julgamento contrariou a tradição jurídica ocidental, talvez até universal. Mas, com certeza, a tradição jurídica ocidental.

E o caso paradigmático disso é justamente o do José Dirceu. Esse julgamento  foi levado a circunstâncias anômalas.  Tanto que o ministro Barroso [Luís Roberto Barroso], antes de ser empossado no Supremo, disse que aquela decisão era um ponto que ele considerava fora da curva.

O que ele quis dizer com isso? Que alguma coisa estava fora da linha de julgamento do Supremo.  Foi casuístico na minha opinião.

Viomundo — Por que o Supremo agiu assim?  

Bandeira de Mello — Acho que foi impacto emocional da pressão maciça e unânime da chamada grande imprensa.

Viomundo — Até hoje o Supremo diz que os recursos do Fundo de Incentivo Visanet eram do Banco do Brasil, portanto públicos. Só que, na verdade, os recursos financeiros eram da Visanet, o Banco do Brasil nunca colocou um centavo no Fundo.  Como é que fica, professor?

Bandeira de Mello — A meu ver essa é outra posição errada que eles adotaram. Na verdade, esse julgamento, a meu ver, está cheio de posições erradas.

Eu respeito o pensamento dos outros, que não precisam coincidir com o meu. Ninguém pode achar que é o dono da verdade.  Mas, na minha visão, esse aí [o do Fundo de Incentivo Visanet] é um outro equívoco dos ministros.

Viomundo — Qual a consequência disso? 

Bandeira de Mello — Tira a confiabilidade do Judiciário.  Aqui, não posso deixar de registrar que um ministro eminente, como o Lewandowski,  procurou chamar a atenção para vários erros cometidos ao  longo do julgamento. E posteriormente, agora, o ministro Teori, recentemente nomeado,  foi específico nas maneiras de se pronunciar. Inclusive considerou que estava errado o que ele tinha julgado.  Como você vê, um homem corretíssimo.

Com todo o meu respeito pela Corte Suprema, que é a posição que todo advogado deve ter em relação à mais alta Corte do país, eu diria que eles erraram.  Errar é humano. Todos os seres humanos erram. E, no caso do julgamento da Ação Penal 470, eles erraram e muito.

Viomundo — Vários réus da Ação Penal 470, como  José Dirceu, José Genoino e Henrique Pizzolato, correm o risco de passar um bom tempo na prisão por causa desse julgamento.  O que pode ser feito, já que o julgamento está cheio de erros, como o senhor acaba de assinalar? 

Bandeira de Mello — Tudo isso pode ser mitigado agora com o julgamento pelos embargos infringentes.   Se esses erros forem admitidos, eles podem ser corrigidos, ou, pelo menos, mitigados. Vamos ter de aguardar. Não dá para a gente se desesperar antes das coisas acontecerem.

Viomundo — Supondo que os ministros do STF rejeitem os embargos infringentes, a quem recorrer?

Bandeira de Mello -- Aos tribunais internacionais. Seria o caminho natural.

Viomundo — O que senhor gostaria de acrescentar algo? 

Bandeira Mello — Eu disse o que penso. A minha esperança, enquanto cidadão, é que os embargos infringentes sejam recebidos e eles possam, pelo menos, mitigar as injustiças e os erros que são muitos.

*Conceição Lemes é jornalista, co-Editora do sítio Viomundo (fonte desta postagem)

10 setembro 2013

'Tenho a certeza que meu sacrifício não será em vão' (Presidente chileno Salvador Allende)


Quarenta anos depois

Somando e subtraindo, hoje, exatamente quarenta anos depois da morte de Salvador Allende, o balanço é muito claro e desafiador: a geração de esquerda dos anos 60 e 70 chegou finalmente ao poder, mas já não tem mais do seu lado a força do sonho e da utopia que levou Salvador Allende à resistência, ao silêncio e à morte. Por José Luís Fiori, na Carta Maior.


“Aprendam a lição... (porque) muito mais cedo do que tarde, se abrirão novamente as grandes alamedas por onde passará o homem livre, para construir uma sociedade melhor.. Tenho a certeza que meu sacrifício não será em vão.”

Salvador Allende, às 9,30 horas da manhã do dia 11 de setembro de 1973.

O golpe militar, a morte de Salvador Allende e o fim do governo da Unidade Popular, na manhã nublada, fria e melancólica de Santiago do Chile, daquele 11 de setembro de 1973, foi um momento trágico da história política da esquerda latino-americana, e foi também um momento de mudança irreversível do pensamento crítico e progressista do continente. (...)

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09 setembro 2013

Mensalão, Embargos Infringentes e Duplo Grau de Jurisdição


Na sessão de hoje (5/9/13) o ministro Joaquim Barbosa rejeitou a possibilidade de embargos infringentes, contra decisão do STF, em caso de competência originária (casos julgados originariamente em razão do foro por prerrogativa de função). Fomos honrados, Valério Mazzuoli e eu, com a citação por ele da nossa doutrina a respeito do duplo grau de jurisdição (aliás, trata-se de citação feita originalmente pelo min. Celso de Mello, que foi reproduzida no voto do min. Joaquim Barbosa). Duas observações importantes: (a) eu, particularmente, apesar de todos os argumentos contrários, discordo do min. Barbosa e entendo que os embargos infringentes são cabíveis (a polêmica, no entanto, é grande); (b) Valério Mazzuoli e eu afirmávamos na terceira edição do nosso livro Comentários à CADH (RT) que o sistema europeu (europeu!) não admite o duplo grau de jurisdição quando o caso é julgado pela máxima corte do país. Vamos aos nossos argumentos e fundamentos:
(a) Por que entendo cabíveis os embargos infringentes?
De acordo com a minha opinião, não há dúvida que tais embargos (infringentes) são cabíveis. Dois são os fundamentos (consoante meu ponto de vista): (a) com os embargos infringentes cumpre-se o duplo grau de jurisdição garantido tanto pela Convenção Americana dos Direitos Humanos (art. 8º, 2, “h”) bem como pela jurisprudência da Corte Interamericana (Caso Barreto Leiva); (b) existe séria controvérsia sobre se tais embargos foram ou não revogados pela Lei 8.038/90. Sempre que não exista consenso sobre a revogação ou não de um direito, cabe interpretar o ordenamento jurídico de forma mais favorável ao réu, que tem, nessa circunstância, direito ao melhor direito. 

Haveria um terceiro argumento para a admissão dos embargos infringentes? 
Sim. A esses dois fundamentos cabe ainda agregar um terceiro: vedação de retrocesso. Se de 1988 (data da Constituição) até 1990 (data da lei 8.038) existiu, sem questionamento, o recurso dos embargos infringentes (art. 333 do RISTF), cabe concluir que a nova lei, ainda que fosse explícita sobre essa revogação (o que não aconteceu), não poderia ter valor, porque implicaria retrocesso nos direitos fundamentais do condenado. De se observar que tais embargos, no caso de condenação originária no STF, cumprem o papel do duplo grau de jurisdição, assegurado pelo sistema interamericano de direitos humanos.
Pelos três fundamentos expostos, minha opinião é no sentido de que o Min. Joaquim Barbosa (que já rejeitou os embargos infringentes de Delúbio) não está na companhia do melhor direito. O tema vai passar pelo Plenário, provavelmente na próxima seção (de 12/9/13). A controvérsia será imensa (ao que tudo indica). (...)
-Continue lendo o artigo do jurista e professor *Luiz Flávio Gomes (foto)  Clicando Aqui   

08 setembro 2013

A esquerda ganhou a primeira partida



Esquerda 1 vs. Direita 0

No fla-flu aberto com as demonstrações de junho, a esquerda ganhou a primeira partida. Não me refiro à redução no preço das passagens, pois esta foi concedida no susto, sob o impacto de protestos que mobilizaram o espectro ideológico inteiro. A vitória “gauche” se deu no campo da medicina.

Provavelmente orientado por pesquisas, o governo percebeu que a saúde unificava os jovens das passeatas à insatisfação popular expressa na queda de apoio aos governantes. Resolveu, então, desengavetar o Mais Médicos, apresentando-o como resposta à voz das ruas. Embora não se dirigisse às grandes cidades, onde os movimentos foram mais fortes, o programa tinha a sensibilidade social necessária para o momento.

Movida por um sentimento de força conjuntural, talvez pela presença massiva de bandeiras brasileiras e cartazes contra a corrupção nas avenidas, a direita encampou o corporativismo de uniforme branco, estimulando as associações de classe a uma oposição frontal ao projeto do Executivo. Engrossadas ainda pela irritação da classe média a tudo que venha do PT, as primeiras reações ao plano de trazer estrangeiros foram tão veementes que pareciam condenar a iniciativa a não sair do papel.

O erro da direita foi não ter percebido que a força da proposta estava na sua fraqueza. Com efeito, o Mais Médicos não vai reverter as graves deficiências vigentes nas extensas periferias metropolitanas. Para tanto, é provável que só uma reforma tributária, profunda o suficiente para gerar recursos de monta, fosse capaz de realizar o preceito constitucional de um verdadeiro sistema único e público de saúde.

Mas, justamente por se dirigir a comunidades afastadas — onde, aliás, está hoje a base eleitoral do lulismo — nas quais não há atendimento algum e os profissionais brasileiros não querem ir, a proposta tem legitimidade inquestionável. Em poucas semanas, as corporações ficaram isoladas, sendo obrigadas a recuar para um obsequioso silêncio. Enquanto isso, a aprovação governamental voltava a subir.

Para coroar, houve o condimento simbólico. Embora duramente criticada pelos setores democráticos da esquerda, Cuba ainda mora no coração de boa parte dos que sonham com uma sociedade igualitária. O despojamento e a disposição dos médicos cubanos que aqui desembarcaram, alvos de preconceitos absurdos, deu um quê de superioridade moral ao time vermelho.
Contudo, atenção: as batalhas decisivas se darão no terreno da política econômica, no qual, cumpre ressaltar, nada indica que o resultado, qualquer que seja, venha a ser obtido de modo tão ameno. O campeonato prenuncia-se longo.

*Por André Singerna Folha de S. Paulo (via Viomundo)
 http://www.viomundo.com.br

07 setembro 2013

CANTO GERAL




* Canto Geral - Geraldo Vandré

"E vós, que vireis na crista da onda em que nos afogamos, quando falardes de nossas fraquezas, lembrai-vos do tempo sombrio a que haveis escapado”. Bertold Brecht

A histórica fuga de Punta Carretas

A fuga de Punta Carretas – Pepe Mujica: o porta-voz da má sorte

Madrugada de uma segunda-feira, 6 de setembro. Nesse dia, há 42 anos, o Movimento de Liberação Nacional – Tupamaros produzia mais um duro golpe na ditadura uruguaia, com a fuga de vários presos do cárcere de Punta Carretas.
O MLN foi uma organização guerrilheira uruguaia nas décadas de 1960 a 1970 e combateu a ditadura militar no Uruguai. O termo Tupamaro era um pejorativo que os espanhóis designavam seus adversários quando da ocupação da América. Está associada ao nome Tupac Amaru, imperador Inca que combateu os espanhóis durante a ocupação.
O presídio de Punta Carretas fica localizado no bairro do mesmo nome a uma quadra da costa do Rio da Prata, na quadra formada pelas ruas José Elleuri, Francisco Solano Garcia, Guipúzcoa e Garcia Cortinas. Hoje está transformado num shopping center que preservou alguns dos prédios originais, como a entrada principal.
Um dirigente Tupamaro, Eleutério Fernández Huidobro, preso em Punta Carretas descreve em seu livro (1) o que foi a vida na prisão, suas misérias, seu cotidiano, suas limitações, e os vários planos de fuga que engendraram durante este tempo.
Eleutério, conhecido popularmente como “El Ñato”, foi um dos fundadores do MLN e um de seus principais dirigentes. Tornou-se político, jornalista e escritor e hoje é Ministro da Defesa do Governo de Pepe Mujica. (...)

-Continue lendo esta interessante, esclarecedora e oportuna postagem de Mogli Veiga  no Sul21,  Clicando Aqui

06 setembro 2013

Julgamento político, 'desproporcional e inaceitável': Ministro do STF denuncia superestimação de penas

O ministro Ricardo Lewandowski afirma que, para garantir cadeia para réus como José Dirceu e José Genoino, o STF superestimou as penas impostas aos condenados por formação de quadrilha. Enquanto em crimes como corrupção ativa as penas foram majoradas de 15% a 20%, no de formação de quadrilha chegaram a inusitados 75%. “É uma desproporção inaceitável”, apontou o revisor.

Brasília - O Supremo Tribunal Federal (STF) encerrou a análise dos embargos declaratórios da ação penal 470, nesta quinta (5), da mesma forma que deu início ao julgamento do mensalão, em agosto do ano passado: cercado por contradições e incongruências que, por muitos anos, ainda irão assombrar a credibilidade da mais alta corte do país. 

Uma das mais graves, sem dúvida, foi a denunciada pelo ministro revisor da ação, Ricardo Lewandowski: para garantir cadeia para os principais condenados, os ministros superestimaram as penas para o crime de formação de quadrilha, criando uma desproporcionalidade que avilta qualquer princípio de justiça.

Enquanto as penas para o crime de corrupção ativa foram majoradas de 15% a 20%, as aplicadas ao de formação de quadrilha variaram de 63% (caso do ex-presidente do PT, José Genoino) a 75% (no do ex-ministro José Dirceu). “É claro que isso ocorreu para superar a prescrição e impor regime fechado a determinados réus. (...) É uma desproporção inaceitável”, denunciou Lewandowski.

A majoração excessiva prejudicou também o ex-tesoureiro do PT, Delúblio Soares (63%), os três sócios da agência de publicidade identificada como operadora do esquema: Marcos Valério (75%), Ramon Hollerbach (63%) e Cristiano Paz (63%), e os diretores do Banco Rural, apontado como braço financeiro da quadrilha: Kátia Rabello (63%) e José Roberto Salgado (63%).

Por meio de tabelas distribuídas aos ministros, Lewandowski justificou a necessidade de revisão nos votos. Teori Zavascki, que havia apontado o problema na sessão da quarta (4), acompanhou o voto proposto pelo revisor. Dias Toffoli e Marco Aurélio Mello também. Os outros sete ministros mantiveram os votos originais e, portanto, o resultado não foi alterado.


Embargos infringentes
Embora a tese de Lewandowski tenha sido derrotada por 7 votos a 4 na sessão desta quinta, conseguiu quórum suficiente para reabrir a discussão do problema, caso a corte decida pela admissibilidade dos embargos infringentes, recurso que permite novo julgamento aos réus condenados com pelo menos 4 votos contrários. A decisão sobre os infringentes, entretanto, foi adiada para a próxima sessão, na quarta-feira (11).

05 setembro 2013

Marlene Dietrich




Marlene Dietrich -  "Frag nicht warum ich gehe"   - AustraliaTV Magic of Marlene - 1965

(Postagem 'inspirada' em  recente post do amigo Ruy Gessinger)  

04 setembro 2013

Black Blocks e PMs



Por Wladimir Pomar*

Marilena Chauí está sendo criticada por haver feito uma palestra na Academia da Polícia Militar do Rio de Janeiro, onde teria declarado que os Black Blocks têm mais inclinações fascistas do que anarquistas. Segundo notícias publicadas na Folha de S. Paulo, ela teria afirmado que esses “grupos têm como foco o ataque a indivíduos”, e “não apresentam um plano de organização social futuro, em substituição à estrutura social vigente”. Eles se apresentariam como anarquistas, mas, ao contrário destes, seriam fascistas por terem as “pessoas..., tanto quanto as coisas", como alvo.

Ainda segundo a matéria da FSP, Marilena Chauí teria dito que as manifestações de junho em nada se assemelharam aos protestos de maio de 1968, na França, porque “as reivindicações atuais dialogam com o poder constituído, o Estado”. Enquanto as manifestações de 1968 não teriam reivindicado nada, as de junho, no Brasil, teriam se dirigido “ao poder, ao Estado”, e pedido “diminuição da tarifa, mais verba para educação, saúde, CPIs e auditorias contra a corrupção e contra a Copa”. Teriam feito “demandas institucionais ao poder”. A professora teria, ainda, falado sobre "o mito da não violência brasileira", descrevendo a estrutura social como "opressiva" em relação aos mais pobres.

Retornando aos "Black Blocks", ela teria considerado que eles não utilizam a “violência revolucionária”, porque esta “só se realiza se há um agente revolucionário que tem uma visão do que é inaceitável no presente e qual a institucionalidade futura que se pretende construir". Em vista disso, o modelo "Black Block" seria “uma mescla de partidos de extrema esquerda à procura de uma linguagem intempestiva de reconhecimento social e nacional" e "essa coisa anárquica". Ela teria defendido, ainda, que as manifestações previstas para setembro empunhem como bandeiras as reformas política e tributária.

Em resumo, ela está sendo criticada por haver feito, segundo alguns, uma “palestra aos 'companheiros' da PM”, sem que se saiba ao certo se ela pretendia “conscientizar os jovens oficiais relativamente aos princípios ético-políticos” que balizam os verdadeiros revolucionários, ou “simplesmente incentivar que se baixe o cacete nos cândidos mascarados”. Ainda segundo os críticos, na reportagem da FSP (cuja veracidade, acrescento eu, é sempre necessário colocar em dúvida), teria ficado evidente que Marilena Chauí apenas teria constatado o óbvio. Isto é, o que os ultraesquerdistas se recusariam a ver. Portanto, embora no conteúdo tenha estado certa, Marilena Chauí teria falado “o certo para as pessoas erradas”.

Esses críticos talvez não estejam tratando a questão como deveriam. Em relação à primeira crítica, a esquerda deve ou não travar a batalha ideológica e política no aparato do Estado, em particular no aparato que utiliza as armas? Não esqueçamos que a esquerda está à frente do governo federal e de governos estaduais e municipais, ou faz parte deles. O que há de errado em falar aos membros das corporações militares e militarizadas? Talvez filósofos, economistas, sociólogos e políticos da esquerda devessem ser criticados não por participarem de palestras e debates nas corporações militares, mas por participarem pouco, ou não participarem.

É evidente que não devem falar somente o que os homens das armas e cassetetes querem ouvir. Devem falar, justa e principalmente, o que quase certamente eles não querem ouvir. Isto é, que é antidemocrático, reacionário, opressivo e covarde baixar o cacete, espancar e atirar, mesmo que sejam balas de borracha, no povo em manifestação. E que a esquerda desconfia, e muito, que entre os Black Blocks haja policiais infiltrados, para realizarem o quebra-quebra, as depredações e saques, com a finalidade de desmoralizar as manifestações e retirar o apoio que a maior parte da população dá a elas.

Portanto, mesmo que entre os Black Blocks existam os que se intitulem anarquistas, socialistas, revolucionários, ou lá o que seja, e até carreguem cartazes com a foice e o martelo, não devemos esconder que a esquerda sabe e denuncia que eles são fascistas. E que entre eles se encontram policiais, porque foi assim que as legiões de Mussolini e Hitler se apresentaram e agiram para estabelecer o poder ditatorial de extrema-direita.

Portanto, quanto mais a PM se jogar, com balas e cassetetes, sobre os manifestantes sem máscaras ou capuzes, ao invés de utilizar seu poder investigativo para processar sem violência a minoria Black Block, mais evidente ficará sua articulação com essa facção.

A reportagem da FSP não informa se Marilena Chauí disse algo que os aspirantes a oficiais da PM não queriam ouvir. Se não disse, perdeu uma boa oportunidade que, tenho certeza, não desperdiçará de uma próxima vez.

*Wladimir Pomar é escritor e analista político. Via http://www.correiocidadania.com.br

03 setembro 2013

MAIS MÉDICOS NO RS

Governador recebe médicos formados no exterior



Porto Alegre/RS - Uma recepção calorosa, com coquetel e música, marcou a apresentação dos 44 médicos estrangeiros inscritos no Programa Mais Médicos - do Governo Federal - que estão no Rio Grande do Sul. Do total, 39 vão trabalhar no Estado e cinco em Santa Catarina. Recebido nesta segunda-feira (2) pelo governador Tarso Genro, secretários e deputados da base aliada, no Salão Alberto Pasqualini, do Palácio Piratini, o grupo reforçará, num primeiro momento, as equipes do Sistema Único de Saúde (SUS) de 21 municípios gaúchos. 

Acompanhado do secretário da Saúde, Ciro Simoni, o governador afirmou que os incidentes registrados em Fortaleza (CE) na última semana - quando médicos cubanos foram vaiados no aeroporto - não devem se repetir em outros estados. "Aqui eles serão muito bem recebidos. Tenho certeza de que a ampla maioria dos médicos do Rio Grande do Sul também vai recebê-los com respeito, com carinho e atenção, porque eles não estão tirando o lugar de trabalho de ninguém. Estão ocupando os espaços que não foram desejados por médicos do nosso país", disse Tarso. 

Para o governador, a recepção no Palácio Piratini simboliza o respeito aos profissionais. "Algumas pessoas vêm de tão longe para a trabalhar no SUS do nosso pais, para ajudar nos projetos dos nossos governos", frisou. 

Durante a recepção aos médicos - a maioria formado na Escola Latino-Americana de Medicina de Cuba -, Ciro Simoni ressaltou o trabalho de atenção básica desenvolvido no Estado, especialmente a Estratégia de Saúde da Família (ESF). O secretário garantiu que o RS ampliou os serviços no setor. "Nosso projeto é chegar a 70% de abrangência na atenção básica e isso só pode ser atingido se nós tivermos mais profissionais à disposição", disse. 

Apesar de reconhecer que a chegada de profissionais do exterior não resolve os problemas da área no país, Simoni garantiu que eles serão aproveitados nas equipes da ESF. Até o final do ano, pelo menos 119 médicos devem reforçar os municípios. "A falha na atenção básica é responsável pela ampliação da necessidade de vagas e hospitais. Quanto mais atenção básica tivermos, quanto mais o paciente ou usuário for tratado antes da doença, menos pessoas serão dirigidas aos hospitais", afirmou. 

Estrangeiro 
Casado com uma brasileira, o palestino Tareq Abuiyada escolheu o município de Esteio, na Região Metropolitana, para começar a trabalhar no país. Aos 34 anos, Tareq reconhece o desafio da sua tarefa, mas afirma que a ideia é ajudar a melhorar o atendimento na saúde. "Temos sido criticados por alguns colegas, mas temos muita aceitação do povo. Estou seguro que quando nossos colegas brasileiros perceberem que o Programa (Mais Médicos) vai dar certo, que vai ajudar o seu povo, eles vão nos apoiar". 

Os médicos vão reforçar as seguintes cidades: Bagé, Viamão, Porto Alegre, Quarai, Uruguaiana, Santa Vitória do Palmar, Chuí, Torres, São José do Norte, Tramandaí, Parobé, Garibaldi, Itaqui, Novo Hamburgo, Esteio, São Borja, Eldorado do Sul, Pelotas, Lajeado do Bugre, Flores da Cunha e Rio Grande. 

Homenagem 
Primeira criança nascida em um acampamento do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), Marcos Tiaraju Correa da Silva foi homenageado pelo governador. Formado em Medicina pela Escola Latino-Americana de Medicina de Cuba, Marcos destacou a importância do curso. "Desde o ano passado, graças à ótima formação que eu recebi em Cuba, pude chegar aqui no Brasil e enfrentar o exame de revalidação do diploma (Revalida) e aprovei na primeira tentativa", relatou.

Aos 27 anos, Marcos trabalha desde abril na atenção primária de saúde no município de Nova Santa Rita. Ao ser citado pelo governador, o médico lembrou da infância pobre e da perda da mãe: "Depois de ter nascido debaixo de uma lona preta, ter perdido minha mãe num conflito agrário, ter nascido da pobreza e da contradição desse país, poder ter me tornado médico e ser reconhecido agora publicamente é um momento de alegria". 

*Texto: Felipe Bornes Samuel - Foto: Caco Argemi/Palácio Piratini 
Edição: Redação Secom (51) 3210.4305 -  Grifos deste Blog - http://www.estado.rs.gov.br

'Americanos, o que está errado com vocês? Nós estamos mentindo desde o começo!'




Desabafo de uma cidadã norte-americana sobre mais um  anuncio belicista do  presidente Obama (de que os EUA, em breve,  atacarão a Síria)

(Pescado do Blog de um Sem-Mídia)

02 setembro 2013

Espionagem dos EUA equivale a ato de guerra. Mas a resposta é política.



'Os Estados Unidos tornaram-se um país criminoso'
Diante da lei brasileira, o crime cometido pelo Governo dos EUA ao espionar e-mails e telefonemas da Presidenta Dilma Rousseff pouco ou nada se diferencia de um ato de guerra.

Muito embora eletronicamente, trata-se de violar as comunicações da Chefe de Estado, de Governo e a comandante-em-chefe das Forças Armadas do Brasil.
Mesmo antes da revelação deste crime, diante das informações sobre coleta de dados no Brasil, o governo brasileiro já havia solicitado que os Estados Unidos só realizassem interceptações telefônicas ou cibernéticas com autorização judicial.
Semana passada, os EUA negaram-se a assumir este mínimo compromisso.
Não se trata, como se vê, de uma ação antiterrorismo.
É vigilância ilegal sobre outros países e governos, numa despudorada violação do direito internacional.
Só há uma maneira eficaz de responder a ela.
Suspender viagem da Presidenta aos EUA, chamar o embaixador, apresentar queixa na ONU, tudo isso pode e será feito, na hora adequada, e que não vai tardar.
Mas o essencial é que chegou o momento da confrontação entre a velha ordem internacional e a que emerge no século 21.
Cabe-nos provocar e coordenar a reação dos chamados Brics – além de nós a Rússia, a Índia, a China e a África do Sul.
Somos, juntos,  42% da população global, 40% da superfície terrestre, 75% das reservas monetárias internacionais, e cerca de 20% do PIB, muito próximo dos 23% representados pelos EUA.
Chegou o momento de termos um peso geopolítico correspondente a essa força econômica.
O mundo unipolar dos últimos 24 anos, desde que o desaparecimento da União Soviética abriu caminho para o mando unilateral dos norte-americanos sobre o planeta, já não pode mais prosseguir, porque significou guerra, recolonização econômica, supremacia bélica intimidante e, agora, um intervencionismo ‘eletrônico” sobre os governos nacionais.
Não pretendemos – embora tivéssemos o direito internacional ao nosso lado – sermos um rato que ruge, como certamente não seremos, como já fomos, um gatinho que apenas mia, contrafeito.
Devemos ser – e é pena que não possamos (será mesmo que não podemos?) contar com a projeção internacional do ex-presidente Lula para o fazermos com o peso que isso mereceria – os estimuladores de uma mudança de patamar da influência mundial dos países em desenvolvimento.
As transformações não acontecem apenas porque as queremos, é preciso que as estruturas ultrapassadas revelem a profunda contradição entre o que dizem ser e o que são, na realidade.
Sem arroubos retóricos, apenas à luz dos fatos: os Estados Unidos tornaram-se um país criminoso.
E é dever da comunidade internacional por fim à esta atividade criminosa.
Não pelos métodos americanos de combater o que diz serem crimes contra as liberdades e os direitos civis, com seus mísseis de cruzeiro.
Mas com a força econômica e moral da maior parte da humanidade, que não aceita ser monitorada, vigiada e violada pela ânsia americana de poder.
*Por: Fernando Brito - via Tijolaço   http://tijolaco.com.br

´Desculpem nossa falha´: a Globo piscou


"O meu erro foi crer que estar a seu lado bastaria...'


Por Rodrigo Vianna*

As instituições, da mesma forma que as pessoas, cometem erros. E é salutar que – quando possível – venham a público e peçam desculpas pelas faltas cometidas. Mas o caso da Globo é estranho: o jornal da família Marinho acaba de publicar editorial reconhecendo que o apoio ao golpe de 64 “foi um erro”. O reconhecimento, diz o próprio jornal, vem após as manifestações de junho, em que as ruas do Brasil foram tomadas por gente que gritava palavras de ordem; e entre elas uma das mais ouvidas era: “a verdade é dura, a Rede Globo apoiou a ditadura”.

Ou seja, a Globo levou quase 50 anos (!) para reconhecer o erro. E o fez não a partir de uma avaliação honesta, mas sob o impacto de ter virado alvo do povo.

As organizações Globo não estiveram sozinhas no apoio à ditadura. Isso é fato. E o editorial se escora malandramente nesse fato para criar uma justificativa, na base do “eu fiz, mas todos fizemos”. Quase todos os jornais brasileiros, isso é fato também, clamaram pela derrubada do presidente constitucional João Goulart, em 1964. Era (e é) o legítimo PIG – Partido da Imprensa Golpista. Alguns jornais  acreditavam, como diz o próprio editorial de “O Globo”, que os militares vinham para uma intervenção “cirúrgica”, e que logo a institucionalidade estaria a salvo, com eleições retomadas em 1966. Mas reparem: o “Estadão” em São Paulo, por exemplo, conservador até a medula, não levou 50 anos pra pedir desculpas. Quando percebeu que a ditadura viera pra ficar, a família Mesquita enfrentou os militares e pagou o preço por isso. O jornal sofreu censura prévia, jornalistas e direção foram ameaçados, e passaram a lutar contra o regime que haviam ajudado a instaurar.

“O Globo”, não. Aliás, o editorial é importante pelo que diz, mas é importante também pelo que esconde. O apoio à ditadura, no caso da Globo, não foi apenas uma parceria ideológica – num momento em que o mundo estava cindido pela Guerra Fria. Não. “O Globo” – e “a” Globo, sobretudo – colheu dividendos empresariais por ter mantido fidelidade canina aos militares. A família Mesquita do “Estadão” terminou a ditadura com menos poder do que tinha em 64. “O Globo” – e “a” Globo – terminou com muito mais força. E com mais dinheiro no bolso.

Os militares ofereceram à Globo a estrutura do Estado para a criação de uma rede efetivamente nacional (daí, por exemplo, o nome do “Jornal Nacional”). A história da Globo é inseparável da ditadura. É a história de um quase monopólio midiático construído às sombras de uma relação incestuosa com os milicos. E isso não há pedido de desculpas que resolva.

Roberto Marinho e a Globo enriqueceram sob a ditadura. E soa estranho que 50 anos depois do golpe de 64, surja este reconhecimento envergonhado do erro cometido. Aliás, pedido de  desculpas propriamente não há ali. Não foi um pedido de desculpas… Mas um recado.

Na verdade, a Globo piscou. O reconhecimento envergonhado do “erro” em 64 (com “apenas” meio século de distância) é um sinal: as “Organizações Globo” estão preocupadas com certas nuvens que se acumulam no horizonte…

Há uma conjunção de fatores. Vamos a eles:

1 – o avanço das grandes corporações internacionais de mídia, que chegam ao Brasil com a força da internet, especialmente o Google (para entender o que se passa nesse mercado, leia esse texto publicado pela Revista Forum);
2 – o fato de a Globo ter-se transformado em alvo de manifestações populares em todo o Brasil (o laser no rosto do apresentador em São Paulo é um símbolo de que o povo ameaça, simbolicamente, “invadir” os estúdios globais; e o estrume lançado contra a porta da Globo em São Paulo é também metáfora dos novos tempos malcheirosos para os Marinho);
3 – as denúncias de Miguel do Rosário, no blog “O Cafezinho”, sobre o processo contra a Globo por milionária sonegação fiscal (o processo foi roubado, já sabemos; mas sob ordem de quem? O que havia de tão comprometedor ali?);
4 – as denúncias contra Ricardo Teixeira (elas ameaçam o produto mais rentável no jogo de poder das comunicações – o futebol).

Tudo isso fez com que emissários da família Marinho tenham procurado gente próxima ao lulismo nos últimos meses, para sugerir que as “Organizações Globo” aceitam conversar sobre algum tipo de “compromisso”. A Globo, nos bastidores, aceita sim regulação da mídia. Mas a regulação que a Globo quer é para segurar o Google. Não é a regulação por mais democracia. Não. A Globo, nos bastidores, utiliza um discurso malandramente “nacionalista” para pedir garantias contra os gigantes da internet…

A Globo está com medo. O cenário empresarial ainda é amplamente favorável à família Marinho: BV, poder político no Congresso e a covardia de certos setores governistas garantem conforto à maior emissora do país. 

Mas o sinal amarelo acendeu. O cenário pode mudar rápido. E a Globo é grande demais, “pesada” demais…

O reconhecimento do “erro” pelo apoio ao golpe de 64 pode ser lido como um sinal de boa vontade que a Globo envia ao lulismo: “podemos ser nacionalistas e democráticos, vamos conversar!”

Claro que a Globo é uma empresa grande, e por isso há espaço para idas e vindas e para posições diversas na estrutura interna de poder. Aliás, o diretor geral da Globo Carlos Schroder acaba de fazer uma reestruturação interna de cargos, que ocorre exatamente nesse momento em que a Globo busca dar respostas ao conjunto de fatores que geram incômodos e preocupações.

Nesse balanço de forças interno,  Ali Kamel, Merval e os ideólogos do Jornal da Globo – entre outros – são a face dura: representam a facção que defende o combate aberto. Mas há os pragmáticos, que sabem da necessidade de alguma aproximação com o governo e o lulismo: sabem que águas turbulentas podem dificultar a navegação desse imenso transatlântico. As turbulências vêm da concorrência internacional, mas vêm também das ruas.

O “revisionismo” histórico de reconhecer o erro cometido em 64 segue essa lógica. É o envio de um sinal ao campo adversário… Se a situação piorar, será que a Globo reconhecerá também o erro histórico que foi ter nomeado um diretor de Jornalismo como Ali Kamel, que nega a existência de racismo no Brasil?

Será que a Globo, daqui a 20 ou 30 anos, vai-se desculpar pela cobertura criminosa da campanha das Diretas-já em 1984? Ou pela perseguição insidiosa a Brizola? Ou ainda pela edição do debate Lula/Collor em 89? E o que dizer da cobertura das eleições em 2006 (vi de perto, eu estava lá) e em 2010 (com a exploração da bolinha de papel no JN, para ajudar Serra na reta final)?

Aguardemos novos sinais. Esse é um jogo bruto que se joga nos bastidores. Longe das telas e das tribunas.

*Rodrigo Vianna  é jornalista e Editor do Blog Escrevinhador, fonte desta postagem.