31 julho 2019

Glenn responde Bolsonaro: “Eu não vou fugir desse país, eu vou ficar aqui”

Jornalista afirma que pode ser preso, mas que resistirá; "Temos muito para divulgar e reportar"

Em atividade realizada no Rio de Janeiro, o jornalista Glenn Greenwald falou para milhares de pessoas / Foto: Clívia Mesquita

Brasil de Fato* - por Igor Carvalho - Glenn Greenwald, fundador do site The Intercept Brasil, recebeu a solidariedade de 3 mil pessoas que ocuparam a área interna e externa da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), no Rio de Janeiro (RJ), nesta terça-feira (30). Durante o ato, o jornalista falou sobre a ameaça de prisão feita pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL). “Nós sabemos que todos nós podemos sair do país e ir para outro país publicar nossas reportagens, longe de Sérgio Moro e Bolsonaro. Porém, nós decidimos que não faremos isso, eu não me importo com isso. Eu não vou fugir desse país, eu vou ficar aqui”, afirmou o jornalista.
No último sábado (27), Bolsonaro disse que Greenwald pode “pegar uma cana aqui no Brasil”. A declaração veio após o decreto 666, assinado por Sérgio Moro, ministro da Justiça e Segurança Pública, que visa facilitar a extradição de estrangeiros. 
Durante o ato, Greenwald respondeu ao ministro. “Se Moro pudesse me ameaçar ou prender por causa de uma reportagem que estou fazendo, podem fazer isso com todos vocês. Todos os jornalistas, mesmo os que não amam o jornalismo que eu faço”, ponderou. 
Entre os presentes na homenagem ao jornalista, estavam políticos e artistas, como Chico Buarque, que também saiu em defesa de Greenwald. “Moro foi eleito homem do ano, o homem que faz a diferença e hoje sabemos qual a diferença. É ‘Lula tá preso, babaca’, ‘Dilma caiu, babaca’. Eu, dentro da minha babaquice, quero manifestar minha solidariedade pelas ameaças que Glenn está sofrendo do presidente de ‘pegar cana’ e por Moro de ser deportado”, declarou o músico. 
Greenwald afirmou que o Intercept Brasil seguirá divulgando as conversas entre Sérgio Moro e a força tarefa da Lava Jato. Segundo o jornalista, há farto material sobre o tema. “Temos muito para divulgar e reportar. Os vazamentos ainda vão demorar muito mais tempo”.
“O nosso trabalho é dedicado para confirmar que escolhemos o caminho certo, o da democracia, e que vamos enfrentar os autoritários”, finalizou defendendo a liberdade de imprensa.
Assista ao trecho final do ato em apoio ao jornalista:
*Edição: Vivian Fernandes - https://www.brasildefato.com.br

"Espiral de Infâmias"



Editorial (trechos) do jornal Folha de S. Paulo* - "Numa escalada sem precedentes de insultos às normas de convívio democrático, aos fatos históricos, às evidências científicas e aos direitos humanos, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) aguçou nos últimos dias as tensões e incertezas em torno de sua administração.

Se no início de mandato declarações e medidas estapafúrdias ainda podiam, com boa vontade, ser vistas como tentativa de satisfazer o eleitorado mais fiel e ideológico, o que se verifica agora é um padrão de atitudes que ofendem o Estado de Direito, reforçam preconceitos e aprofundam as divisões políticas. 

Além de expor o despreparo do chefe do Executivo para desempenhar suas funções num quadro de coexistência com as diferenças, a insistência na agressão e na boçalidade revela uma personalidade sombria que parece se reconhecer, com júbilo, nas trevas dos porões da ditadura militar. 

As insinuações sórdidas acerca do pai do presidente da OAB, Felipe Santa Cruz —morto, segundo as investigações, sob a guarda do poder autoritário—, são um exemplo da pequenez e da leviandade a que pode chegar o presidente. 

Não espanta, aliás, que tenha classificado como “balela” documentos oficiais sobre abusos cometidos pelo regime. Já eram, afinal, conhecidos seus elogios ao torturador Carlos Alberto Brilhante Ustra, bem como suas simpatias pelas violações praticadas no submundo dos órgãos de repressão. 

Enganou-se, infelizmente, quem esperou que a condição de presidente da República levaria o ex-deputado nanico a moderar o discurso e buscar alguma conciliação.

Pelo contrário, são os traços intolerantes e obscurantistas do mandatário que saltam aos olhos (...) Talvez transtornado com as críticas à indicação vexatória de um filho à embaixada em Washington, ou com as investigações que envolvem outro, Bolsonaro aprofunda a estratégia populista e acentua a retórica de confrontação.

Com índices de aprovação aquém dos obtidos por seus antecessores em igual período do mandato, o presidente desperta crescente apreensão quanto a seu desempenho nos anos vindouros.

Para alguns analistas, os destemperos verbais já começam a fornecer munição para um eventual enquadramento em crime de responsabilidade, por procedimentos incompatíveis com a dignidade, a honra e o decoro do cargo." (...)
...

30 julho 2019

Hora de conter a besta


"Com a frase sobre o pai do presidente da OAB, Bozo saiu da fase da demência, propriamente dita, para a da desumanidade, pura e simples", escreve Leandro Fortes, do Jornalistas pela Democracia; "A OAB tem a razão e a oportunidade para encabeçar um movimento de impeachment desta besta incontrolável"




Por Leandro Fortes, do Jornalistas pela Democracia*

Está claro que conter e calar Jair Bolsonaro se tornou uma urgência civilizatória. 

Com a frase sobre o pai do presidente da OAB, Bozo saiu da fase da demência, propriamente dita, para a da desumanidade, pura e simples.

Trata-se um animal de carga à frente de uma nação. O mais terrível é a impressão real de que ele sequer tem a dimensão da própria cretinice. 

Mesmo se colocarmos cabresto e freio em sua boca medonha, e pô-lo, sob chicote, a carregar a enorme quantidade de esterco verbal que ele produz, Bolsonaro, ainda assim, permanecerá na ignorância. 

Bozo é obsecado pela própria insensatez e não à toa. Cada vez que ele mexe a bocarra para arrotar absurdos, uma claque de dementes altamente motivados se contorce, zurra, relincha e muge, num êxtase freudiano.

São pessoas que sabiam, por avisadas continuadamente, que se tratava de uma cavalgadura simpatizante da tortura. Então, não adianta esperar nada delas.

Agora, a OAB tem a razão e a oportunidade para encabeçar um movimento de impeachment desta besta incontrolável.

O País precisa, ao menos, se recompor, para seguir adiante.

*Via Brasil247

29 julho 2019

Líder do PT, Paulo Pimenta assume a bandeira do impeachment de Bolsonaro



"Não podemos mais tapar o sol com a peneira. Bolsonaro tem que ser impedido. Ele é um criminoso que idolatra genocidas, torturadores e ditadores. Ele e seu clã miliciano conduzem o país para um estado policial autoritário que corrói a democracia e as instituições da república", postou o deputado Paulo Pimenta (PT-RS), líder do partido na Câmara.

CLIQUE AQUI para ler na íntegra (via 247)

28 julho 2019

Solidariedade a Glenn Greenwald: em defesa da democracia



A ABI convida os associados, jornalistas e a sociedade, em geral, para um ato em solidariedade ao jornalista Glenn Greenwald, que vem sofrendo uma autoritária campanha de perseguição, por parte do governo Bolsonaro. O evento será na 3ª. feira, 30 de julho, às 18h30, no Auditório do 9º andar.


The Intercept Brasil: SERGIO MORO DÁ FORMA A UM NOVO ESTADO POLICIAL NO BRASIL*




SEM NENHUMA explicação, militares filmaram palestra de um cientista na Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, SBPC. A palestra era sobre as ações do governo Bolsonaro na área de ciência e tecnologia.
Também sem nenhuma explicação, uma reunião do sindicato dos professores de Manaus foi invadida por policiais rodoviários, que sentaram à mesa portando metralhadoras e iniciaram um interrogatório. A ordem veio do Exército brasileiro, disseram os policiais. A reunião tratava dos preparos para as manifestações contra Bolsonaro durante sua visita à cidade.
Na quinta-feira, o ministro da Justiça baixou uma portaria que autoriza a deportação sumária de pessoas “perigosas para a segurança do Brasil”, violando a presunção de inocência para estrangeiros, o que é escancaradamente inconstitucional.
Na sexta-feira, um deputado federal do PSL protocolou junto à Procuradoria-Geral da República (PGR) um pedido de prisão temporária contra o jornalista Glenn Greenwald. Ontem, sem nenhuma justificativa legal, o presidente da República fez uma ameaça velada ao insinuar que o jornalista pode ser preso.
Esses episódios ocorridos nesta semana têm se tornado cada vez mais frequentes. Aos poucos, o estado policialesco vai se consolidando no país, virando o novo normal. É a consequência natural de um governo autocrático, que rejeita as mediações democráticas, e cujo super ministro da Justiça viola as leis em defesa própria. E, ao que parece, estamos apenas no começo.
O ex-juiz, que foi pego corrompendo o sistema judicial, é hoje o chefe máximo da Polícia Federal. E, como já era de se esperar pelo histórico, não está tendo o mínimo pudor em usar a máquina para tentar colocar os seus esqueletos de volta para o armário. Ele segue infringindo leis e jogando areia nos olhos da opinião pública, sempre buscando consolidar a narrativa do mocinho perseguido por bandidos. A transparência é a kryptonita do nosso super herói.
A forma como Sergio Moro agiu nos dias seguintes à prisão dos hackers não foi diferente de como agia enquanto juiz. Dessa vez, as ilegalidades não foram tramadas no escurinho do Telegram, mas cometidas à luz do dia. É natural que, quando o estado policial vai se assentando, a preocupação das autoridades em cumprir as leis vá diminuindo. Na Operação Spoofing, Moro tem atuado como ministro da Justiça, chefe da operação, acusador, investigador e, vejam só, vítima. O homem bateu o escanteio, correu para a área para cabecear, fez gol de mão e confirmou a legalidade no VAR. Sergio Moro é mesmo um herói quântico.
Curiosamente, ele resolveu tirar férias justamente nos dias que antecederam a prisão dos hackers. Foi descansar nos EUA e, quando voltou, não escondeu que sabia mais sobre a Operação Spoofing do que a lei permite:

Parabenizo a Polícia Federal pela investigação do grupo de hackers, assim como o MPF e a Justiça Federal. Pessoas com antecedentes criminais, envolvidas em várias espécies de crimes. Elas, a fonte de confiança daqueles que divulgaram as supostas mensagens obtidas por crime.

O ministro afirmou com todas as letras que os hackers presos foram a fonte do arquivo obtido pelo Intercept. Acontece que nem a Polícia Federal nem o juiz do caso haviam feito essa relação até então. Ou Moro estava blefando ou recebeu informações de uma ação que corre sob sigilo. As duas possibilidades são graves. Não foi a primeira vez que o ministro violaria um segredo de justiça. De acordo com o próprio presidente da República, Moro lhe enviou uma cópia do inquérito sobre os laranjas do PSL, que corre sob sigilo. Nada aconteceu.
No dia seguinte, a imprensa noticiou que um dos hackers confessou ter passado as informações para Glenn Greenwald. Aos poucos foi se construindo uma narrativa perfeita para quem deseja descredibilizar a Vaza Jato: um bando de estelionatários do interior de São Paulo hackearam autoridades, movimentaram uma grana preta sem justificativa e repassaram o fruto do crime para o Intercept. Pronto! Um prato cheio para quem, como o ministro Sergio Moro, tenta nos colocar o rótulo de “site aliado a hackers criminosos”.
Invasões virtuais são crimes e, claro, devem ser investigadas. O fato é que hackeamentos acontecem aos montes no mundo, são quase corriqueiros. Já a descoberta do conluio de um juiz com procuradores para influenciar o jogo político é rara e muito mais nociva para uma democracia. Sergio Moro inverteu essa lógica óbvia e desviou o foco para o espantalho dos hackers. O noticiário se virou para o grupo de barnabés estelionatários do interior de São Paulo e ofuscou o caso de escândalo de corrupção judicial do qual Moro é protagonista.
Quando foi dar explicações na Câmara sobre os diálogos vazados, Moro desafiou jornalistas a entregarem para as autoridades o arquivo para ser periciado. “Aqueles que têm as mensagens, hackers criminosos ou veículos da imprensa, que as apresentem. Apresentem a mensagem para uma autoridade independente. Apresentem lá, por exemplo, se não confiam na Polícia Federal, no Supremo Tribunal Federal. Aí tudo vai poder ser examinado e vai poder ser verificada a autenticidade. Agora, eu não posso demonstrar ou reconhecer a autenticidade de um material que eu não tenho.”
Agora, de posse do arquivo, o ministro não teceu um comentário sequer sobre a autenticidade dos diálogos publicados pela Vaza Jato. Nenhuma palavra sobre perícia. Nada. Pior ainda: ele ligou para autoridades que foram vítimas da invasão para alertá-las e tranquilizá-las. E disse que os arquivos serão destruídos.
Mais uma vez, o ministro atropelou a lei. Ele não poderia ter acesso à lista de hackeados, já que ação está sob sigilo. Não é tarefa de ministro decidir o destino de provas apreendidas no âmbito de um processo penal que está sob as ordens de um juiz. Mas o que é o cumprimento da lei para Sergio Moro senão uma mera alegoria do seu heroísmo fake?
Como é natural em um estado policial, o perfil institucional do STJ no Twitter tratou a ilegalidade com a maior naturalidade do mundo, como se fosse normal um ministro da Justiça, sem ordem judicial, ordenar a destruição das provas de um crime do qual ele é uma das vítimas:


O ministro disse que está tranquilo porque não tem nada a esconder e também utilizava pouco o Telegram.
Ministro Moro disse durante a ligação que o material obtido vai ser descartado para não devassar a intimidade de ninguém. As investigações sobre o caso são de responsabilidade da Polícia Federal, a quem cabe responder sobre o caso.

Em um estado de direito, a ação de Moro deveria ser classificada como obstrução de justiça, prevaricação ou queima de arquivo. No Brasil 2019, o direito freestyle de Sergio Moro é endossado até por um tribunal superior.
A coisa ganhou contornos de ridículo depois que a própria Polícia Federal contestou o ministro da Justiça. A instituição emitiu nota dizendo que as provas não serão destruídas, ao contrário do que tem dito seu chefe. “Caberá à justiça, em momento oportuno, definir o destino do material”, tentou consertar a instituição. Chegamos a esse ponto bizarro em que temos que decidir entre escolher acreditar na Polícia Federal ou no chefe da Polícia Federal. A farra que Sergio Moro faz com as leis brasileiras parece mesmo não ter hora pra acabar.
Conhecendo todas essas violações, quem poderá garantir que uma cópia desses arquivos apreendidos não ficará nas mãos de Sergio Moro ou alguém envolvido na operação? Essa é a dúvida de um ex-integrante de um tribunal superior ouvido pelo jornalista Kennedy Alencar, “isso é complicado. Se alguém diz que destruirá oficialmente um arquivo sobre boa parte da República, mas mantém uma cópia em segredo, o Brasil poderá estar diante de um novo John Edgar Hoover”. Hoover foi um dos fundadores do FBI e comandou a instituição por 48 anos. Usou o poder para espionar, perseguir e chantagear adversários políticos, sempre atropelando a Constituição americana.
Esse empenho em descobrir como ocorreram os vazamentos é inédito na carreira de Sergio Moro. Durante a Lava Jato, o que não faltou foi vazamento ilegal, mas ele preferia evitar a fadiga. Simplesmente nenhum vazamento da operação foi investigado, e isso nunca pareceu ser uma preocupação. Em 2017, quando esteve em Harvard, ele explicou o desinteresse:
“Realmente ocorreram vazamentos e muitas vezes se tenta investigar isso, mas é quase como se fosse uma caça a fantasmas, porque normalmente o modo de se investigar isso de maneira eficaz seria, por exemplo, quebrando sigilos do jornalista que publicou a informação. E isso nós não faríamos, porque seria contrário à proteção de fontes, à liberdade de imprensa. E eu não estou reclamando destas proteções jurídicas, acho importante.”
Está claro que essa repentina obsessão por investigar vazamento é uma questão pessoal. E é curioso lembrar como ele achava importante proteger fontes e a liberdade de imprensa. Agora, como vítima de vazamento, ele trabalha em sentido contrário.
Na sexta-feira, um dos presos confessou ter pedido o contato de Glenn Greenwald para Manuela D’ávila (PCdoB). A ex-deputada admitiu ter feito a intermediação, o que é absolutamente legal. Até esse momento, muita gente suspeitava que essa história poderia ter sido plantada pela Polícia Federal. Tudo indica que não foi, mas, convenhamos, depois do que já se viu até aqui, é natural que se trate com ceticismo qualquer investigação que tenha Sergio Moro no comando.
Se tudo o que foi apurado — e vazado ilegalmente para a imprensa — pela Polícia Federal até aqui é verdade, então ninguém mais poderá ter dúvidas quanto à legalidade da publicação dos vazamentos. Os procedimentos jornalísticos do Intercept e veículos parceiros seguem em consonância com a lei. As reportagens continuarão sendo publicadas, amparadas pela Constituição. Esperamos que ministro da Justiça siga o exemplo e também trabalhe dentro da lei.
Os últimos sinais do governo Bolsonaro indicam que o país está caminhando em direção ao totalitarismo: reuniões de sindicatos vigiadas por policiais armados, palestra de cientista filmada por soldado do Exército, presidente da República ameaçando prender jornalista, e um ministro da Justiça que não tem medo de transgredir a lei para defender seus interesses e descredibilizar a imprensa. Em uma democracia, Sergio Moro já teria sido demitido por desvio de função e pelas sucessivas ilegalidades cometidas. Em um estado policial, ele faz o que quer.
*Por João Filho, no The Intercept Brasil

27 julho 2019

Aqui estou, Sr. Inverno!




"sou veterano de cem vigílias,
sou tapejara de mil insônias"

Já sei que chegas, Inverno velho!
Já sei que trazes - bárbaro! O frio
e as longas chuvas sobre os beirais.
Começo a olhar-me, como em espelho,
nos meus recuerdos... Olho e sorrio
como sorriram meus ancestrais.

Sei que vens vindo... Não me amedrontas!
Fiz provisões de sábias quietudes
e de silêncios - que prevenido!

Vão-se-me os olhos nas folhas tontas
como simbólicos ataúdes
rolando ao nada do teu olvido.

Aqui me encontras... Nunca deserto
do uivo dos ventos e das matilhas
de angústias vindo sem parcimônias.
Chega ao meu rancho que estou desperto:
- sou veterano de cem vigílias,
sou tapejara de mil insônias.

Aqui estarei... Na erma hora morta,
junto da lâmpada, com que sonho,
não temo estilhas de funda ou arco.
Tuas maretas de porta em porta,
os teus furores de trom medonho
não trazem pânico ao bravo barco.

Na caravela ou sobre a alvadia
terra do pampa - cerros e ondas
meu tino e rumo não mudarão.
No alto da torre que o mar vigia,
ou, sem querência, por longas rondas,
não me estrangulas de solidão.

Tua estratégia de assalto e espera
conheço-a muito, fina e feroz:
de neve matas; matas de mágoa;
derramas nalma um frio de tapera;
nanas ausências a meia voz
e os olhos turvos de rasos d'água.
Comigo, nunca... Se estou blindado!
Resisto assédios, que bem conduzes,
no legendário fortim roqueiro.
Brama as tuas fúrias de alucinado!
- Fico mais calmo que as velhas cruzes
braços abertos para o pampeiro.

Os meus fantasmas bem sei que animas
para, num pranto de vãs memórias,
virem num coro de procissão
trazer-me o embalo de velhas rimas.
- À intimidade dessas histórias
tenho aço e bronze no coração.

Então soluças pelas janelas,
gemes e imprecas pelos oitões,
galopas louco sobre as rajadas,
possesso, ululas entre procelas.
E ébrio, nas noites destes rincões
lampejas brilhos de punhaladas.

Inútil tudo! Vê que estou firme.
Nenhum receio me turba o aspeto,
nenhuma sombra me nubla o olhar.
Contigo sempre conto medir-me
frio, impassível, bravo e correto
como um guerreiro que ia a ultramar.

Reconciliemo-nos, velho Inverno!
Nem és tão rude! Tão frio não sou...
Venha um abraço muito fraterno.

Olha...

Esta lágrima que rolou
não a repares...

É de homenagem

a alguém que aos céus se fez de viagem,
e nunca... nunca! Nunca mais voltou...

             Aureliano de Figueiredo Pinto*

*Expoente maior da poesia regionalista gaúcha. Médico, poeta, político e romancista nascido em Tupanciretã, santiaguense 'de coração'. (Repostado deste Blog)

Moro desmancha




A gula pecuniária de Deltan Dallagnol, já é uma certeza, derrubou o procurador e é só uma questão de tempo e de grau o seu afastamento de suas funções.
A gula política de Sérgio Moro, mais cedo ou mais tarde, também o levará à ruína e, já agora, o transformou num personagem em desagregação.
Sua maneira arbitrária e abusiva em conduzir-se na função pública, para os que não o percebiam ou fingiam não ver, por conveniência, aflorou de tal maneira neste caso Vaza Jato/hackers que o reduziu – assim mesmo a contragosto de alguns – apenas ao campo do bolsonarismo mais incondicional.
O pavão de toga agora tem pouco mais que os “pavões misteriosos” da internet.
Do futuro brilhante de potencial candidato a presidente ou a cátedra “garantida” no Supremo Tribunal Federal restam apenas saudades, talvez apenas nele próprio e nos grupos que ele reuniu em seu projeto de poder, no Ministério Público, na Justiça e na Polícia Federal.
Cevado pela mídia para construir a derrocada da esquerda, perdeu a unanimidade e só é herói nacional para os grupelhos minguantes dos camisas amarelas.
Era previsível, sendo ele a bananeira que já deu cacho – e que cacho, a prisão de Lula e a absurda eleição de Bolsonaro! – e não tem perspectivas adiante, senão a de murchar.
Moro já não é mais algo que agregue na política: um projeto de poder.
Ao contrário, virou um apêndice do bolsonarismo que pretendeu suceder.
Pior: perdeu a blindagem perdeu a capa de herói que tinha na opinião pública e na imprensa e tudo o que faz, agora, se evidencia como desespero de quem luta pela sobrevivência.
“Moro está encurralado. E homens encurralados e afoitos sempre fazem besteira. Ele está fazendo uma atrás da outra”, diz dele hoje no Painel da Folha o deputado Marcelo Ramos, do Centrão.
Moro as fez e perdeu o campo de força da quase unanimidade que o protegia.
Está sem suas vestes de herói, sem o manto que o protegia.
Não tem mais como resistir a dois ou três fatos que venham à tona, preparando o que, inevitavelmente, será o golpe de misericórdia.
(Por Fernando Brito, jornalista - no Tijolaço)