04 junho 2022

A aliança lucrativa do agro, sertanejo e direita dá as caras de novo

Desde Collor, sertanejos estão lado a lado com políticos de direita. Agora se sentaram no colo da extrema direita.

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Ilustração: Amanda Jungles/The Intercept Brasil


NÃO É DE HOJE que artistas sertanejos estão associadas com os políticos de direita. No início da década de 90, durante o governo Collor e o boom da música sertaneja nas rádios, cantores sertanejos eram vistos com frequência na Casa da Dinda, residência oficial do então presidente Fernando Collor em Brasília. Só em 1992, o programa Sabadão Sertanejo, apresentado por Gugu Liberato no SBT, levou os nomes mais badalados do sertanejo para fazer uma roda de sertanejo no quintal da Casa da Dinda em duas oportunidades.

Naquele ano, diversos escândalos de corrupção envolvendo Collor pipocavam no noticiário e o colocavam nas cordas. A cena sertaneja se mobilizou para demonstrar apoio ao presidente que teria o mandato cassado meses depois (Collor renunciou antes do impeachment). Não é de hoje, portanto, que o grosso dos artistas sertanejos apoia a direita.

É uma relação simbiótica que vem sendo construída há décadas entre sertanejos, agronegócio e políticos da direita, um consórcio em que todos saem ganhando. Agora, com o agronegócio sentado no colo da extrema direita golpista e negacionista, a cena sertaneja se sentou também. E está faturando horrores vendendo shows para cidades administradas por prefeitos ligados ao bolsonarismo.

O esquemão bolsonejo veio à tona depois que o cantor Zé Neto, da dupla Zé Neto e Cristiano, aproveitou um dos seus shows para fazer uma patrulha moral sobre uma tatuagem feita por Anitta em uma parte íntima. Ele disse no palco para milhares de pessoas que não depende da Lei Rouanet para fazer shows, insinuando que a artista, uma feroz crítica ao bolsonarismo, dependeria.

Ocorre que a Lei Rouanet até pouco tempo atrás determinava um limite de R$ 45 mil para o cachê de um artista. Hoje, esse limite caiu para R$ 3 mil. No show em que usou o microfone para bancar o bedel do bolsonarismo, Zé Neto e Cristiano faturaram R$ 400 mil dos cofres públicos. O show foi feito na Exposorriso, uma feira agropecuária anual com leilões, shows e rodeios de Sorriso, Mato Grosso. A cidade mato-grossense é administrada por um prefeito tucano que é bolsonarista ferrenho. Tão bolsonarista que contrariou orientação do PSDB e anunciou apoio à reeleição de Bolsonaro.

A hipocrisia de Zé Neto ficou exposta e foi o estopim para que se passasse um pente fino em todas as contratações de shows de cantores sertanejos feitas com dinheiro público. Reportagens com levantamento de gastos indecentes das prefeituras com shows fez a “CPI do Sertanejo” virar um dos assuntos mais comentados nas redes sociais.

As investigações só estão começando e, por enquanto, nada de ilegal foi encontrado no esquemão bolsonejo. A coisa ainda está apenas no campo da imoralidade. O Ministério Público de diversos estados já está investigando a farra sertaneja com verbas públicas.

Um dos casos mais emblemáticos é o de Teolândia, Bahia, cidade com 14 mil habitantes, recentemente arrasada pelas enchentes. Apesar não ter grana para pagar o salário mínimo dos professores e socorrer às vítimas de enchentes, a prefeita bolsonarista decidiu torrar R$ 1,2 milhão dos cofres municipais para bancar artistas sertanejos. Só Gusttavo Lima receberá R$ 704 mil.

Segundo a prefeita do Progressistas, conhecer o artista era um sonho pessoal. Há poucos meses, essa mesma prefeita pediu para que a população mandasse PIX para a conta da prefeitura para ajudar os desabrigados pelas fortes chuvas que atingiram a cidade no começo do ano.

‘Enquanto ele ostenta carrões, mansões, iate e fazendas, o povo pobre dessas cidades sofre com serviços públicos precários’.

Gusttavo Lima é um caso à parte. O sertanejo mais famoso da cena é o que mais recebe verbas públicas para fazer shows em cidades do interior. É também o mais bolsonarista. Assim como Teolândia, diversas cidades com baixo orçamento pagaram cachês gordos para o cantor milionário. Enquanto ele ostenta carrões, mansões e fazendas, o povo pobre dessas cidades sofre com serviços públicos precários. O cantor cobrou R$ 800 mil da cidade de São Luiz, que tem o segundo pior PIB de Roraima. Já a cidade de Conceição de Mato Dentro, Minas Gerais, que tem pouco mais de 17 mil habitantes, iria desembolsar R$ 1,2 milhão para contratar o cantor. (...)

CLIQUE AQUI para ler, na íntegra, a postagem de João Filho no site The Intercept Brasil

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