Lula vai se reunir semanalmente com núcleo da articulação política: “O balanço é que a gente precisa melhorar a nossa organização nesse processo de governo e Legislativo”, afirmou o líder no Senado, Jaques Wagner (PT-BA)
Bolsonaristas comemoraram manutenção do veto que criminalizaria fake news nas eleições
São Paulo – Por Tiago Pereira* - A série de derrotas na sessão do Congresso que analisou vetos presidenciais (28) acendeu o alerta na articulação do governo. Após reunião com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), disse que é preciso melhorar a “organização” na relação entre o Executivo e o Legislativo.
“Acabei de sair da sala dele (Lula), ele está absolutamente tranquilo. Ele tem 78 anos, já apanhou, já comemorou, já chorou, já riu, então, não assusta isso aí”, disse Wagner a jornalistas. “O balanço é que a gente precisa melhorar a nossa organização nesse processo de governo e Legislativo. Vai envolver uma sistemática de acompanhamento mais próximo, de conversa entre o governo”, acrescentou.
Nesse sentido, Lula vai passar a se reunir, a cada semana, com o núcleo da articulação do governo. Até então, apenas o ministro da Secretaria de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, mantinha conversas semanais com o presidente. Agora, tanto Wagner, como o líder do governo na Câmara, o deputado federal José Guimarães (PT-CE), e o líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (sem partido-AP), devem participar desses encontros periódicos.
Quando houver uma sessão de vetos, os articuladores do governo terão de se reunir uma semana antes e debater os acordos, exemplificou o líder do Senado. “É preciso um afinamento melhor para que o que aconteceu aqui (Congresso) seja totalmente absorvido lá (Planalto).”
Ainda antes sessão, Guimarães (PT-CE) defendeu uma renovação na Esplanada dos Ministérios e uma chacoalhada geral no PT para o enfrentamento do bolsonarismo nas ruas e nas redes sociais. “Toda renovação é bem-vinda. Evidentemente que o presidente é quem encaminha. Mas às vezes nós temos que evitar em qualquer governo a acomodação, a sensação de que está tudo bem. Se estivesse tudo bem, o Lula estava com seus 80% de aceitação. Não está tudo bem”, afirmou.
Derrotas amargas
O Congresso derrubou, por exemplo, o veto das saidinhas, que autorizava a saída dos detentos dos presídios para convívio familiar. A derrubada do veto se deu por 314 votos a 126 na Câmara, com 2 abstenções, e por 52 votos a 11 no Senado, com uma abstenção.
“É um parlamento majoritariamente conservador. Na saída temporária dos presos, tem um consolo: os presos do 8 de janeiro também não vão poder sair. Acho que aí eles vão se explicar com a base deles”, disse Randolfe.
Outra derrota foi a manutenção do veto do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) a um trecho da Lei de Segurança Nacional (LSN) que puniria a disseminação de fake news nas eleições. Assim, com 317 votos de deputados a favor, o veto em questão nem precisou passar pelo Senado.
Por outro lado, o governo conseguiu vitórias importantes, com quatro vetos que seguem valendo. Em votação apertada o Congresso manteve, por exemplo, o veto de Lula ao “cronograma” para o pagamento de emendas parlamentares.
No entanto, senadores e deputados decidiram pela derrubada do veto a outros pontos da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), como a proibição de financiamento público de cirurgias para mudança de sexo em crianças e adolescentes.
“Aqui tudo a gente vota como se fosse um Deus nos acuda. Todos sabemos que matéria econômica tramita de um jeito. Matéria, chamando genericamente de costumes, tramita de outro. Quando me perguntam ‘qual é a base (do governo)?’, depende do tema”, analisou Wagner.
Nesse sentido, ele chegou a classificar a sessão de ontem como uma “vitória limitada”, em função da aprovação das pautas econômicas, consideradas mais decisivas. Já as pautas de costumes, trata-se de uma questão partidária, segundo ele. “O que era essencial para a gente, que eram as questões orçamentárias, foram mantidas”.
Comunicação unificada
Para a deputada Jandira Feghali (PCdoB), vice-líder do governo na Câmara, é preciso uma estratégia de comunicação comum para enfrentar os bolsonaristas e conservadores. “Não sei se você viu ontem na sessão do Congresso, todos os deputados da extrema-direita subiram ontem para falar exatamente dos dois mesmos vetos (saidinha e fake news). Todos, sem exceção. Isso eles fazem todos os dias. Eles sobem à tribuna, combinados, e fazem o mesmo discurso o dia inteiro, todos eles”, disse ela em entrevista ao ICL Notícias.
“Como é que nós fazemos: um fala da Palestina, outro fala das fake news, outro fala do Minha Casa Minha Vida. Ou seja, não fica nada”, reclamou Jandira. Desse modo, ela disse que há tempo cobra do governo uma estratégia unificada de plenário. E que passa também pela comunicação desses temas com a sociedade.
“Se nós somarmos as nossas redes, a minha, a de outros deputados, a do (ministro da Fazenda) Fernando Haddad, a do Lula, dá mais de 60 milhões de pessoas. Se a gente tiver uma estratégia de comunicação comum, de falar a mesma coisa na mesma hora, na mesma semana, batendo na mesma disputa, disputando com conteúdo, começa a fazer algum efeito. O que não dá é fazer como a gente faz hoje”.
Papel do Supremo
Diante do retrocesso conservador no Congresso, o Supremo Tribunal Federal (STF) é a última linha de resistência na preservação dos direitos sociais e políticos. Randolfe, no entanto, disse que o governo não pretende recorrer, nem no caso das saidinhas, nem das fake news. Outras instituições, no entanto, como a Defensoria Pública da União (DPU) e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) têm autonomia para questionar as votações no Supremo.
Por outro lado, a professora de Ciência Política da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Mayra Goulart chama a atenção para a necessidade de “preservar” o STF, que já figura atualmente entre os alvos prioritários do bolsonarismo.
“Acho então que é válido, sob o prisma da legalidade acionar o Supremo nesse caso (saidinha)”, disse Mayra, em entrevista ao programa Onze News, comandado por Gustavo Conde. “O que tem que ser avaliado é se vale a pena o desgaste, porque essa não vai ser a derradeira vez que direitos fundamentais vão ser ameaçados por projetos de lei ou medidas propostas por esses deputados que representam essa maioria que se formou contra os direitos humanos”.
Ao mesmo tempo, ela defende que o campo progressista precisa se aproximar mais dos evangélicos, que poderiam se sensibilizar com pautas ligadas aos direitos humanos. Mas essa aproximação deve se dar com as bases do movimento evangélico, e não com suas lideranças, segundo ela.
“As lideranças evangélicas elas são mais ativas, elas foram mais ativadas pela extrema direita do que as bases. Essa conversa tem que ser feita nas bases, com os fiéis. É através de um tipo de comunicação que acesse os fiéis. Não pode tentar convencer o Silas Malafaia primeiro. Porque o Malafaia, ele já é uma liderança do campo da extrema direita. Ele não é mais um pastor, ele é uma liderança da Extrema direita e produz para isso”.
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