Tal como a andorinha solitária não faz o verão, também os acontecimentos passam a significar mais quando se sucedem e se completam.
Três chamadas, uma abaixo da outra, hoje, na capa do site da Folha, que reproduzo aí ao lado, explicitam muito bem o que esta por vir, no já muito curto espaço de tempo que temos para evitá-lo.
São negação de tudo aquilo por que o Brasil lutou e, ironicamente, até do que dizem os que, envergonhados de assumirem a pregação de um golpe, camuflam sua vilania em discursos sofisticados sobre “perda de legitimidade” e “constitucionalidade” de sua consumação.
“Temer convém por evitar a eleição, que não interessa ao andar de cima“, diz o insuspeito Elio Gaspari, em sua análise sobre a eventual ascensão do vice, já em desabrida montagem:
Temer é um estuário de esperanças. Junta os cidadãos que detestam o PT, os eleitores que passaram a detestar a doutora Dilma, os empresários atônitos com a paralisia do Estado e sobretudo os políticos e fornecedores do governo, aterrorizados com a atividade do Ministério Público.
Temer é acima de tudo conveniente. Vota-se o impedimento da doutora, ele assume, reduz a tensão, forma um ministério de celebridades, consegue uma trégua (sobretudo na imprensa), leva para o governo gente que perdeu a eleição e impõe seu estilo tolerante, tranquilizando os comissários depostos. Se for possível, ajuda a preservar a vida pública de seus correligionários que temem a chegada dos rapazes da Federal. Essas seriam as esperanças.
Discordo em vários pontos da descrição, embora não da conclusão. Porque as tais “celebridades” seriam, para quem tem alguma memória do passado recente do Brasil, um circo de horrores: Armínio Fraga, José Serra, Ronaldo Caiado e o onde mais sua imaginação quiser chegar para amansar a “tropa de Cunha. Quanto ao “estilo tolerante”, dele tivemos e estamos tendo provas ao ver o vice sem voto dedicar-se por meses a demolir os alicerces de sua companheira de chapa. Haverá lugar – e subalterníssimo – num Governo Temer apenas para os petistas de ocasião, delcidianos, que roeram e se fartaram nos porões das administrações do PT.
O segundo título é o da reportagem “Réu na Lava Jato, Cunha participa de passo a passo do impeachment“.
Nela, os repórteres Rainer Bragon e Paulo Gama descrevem como Cunha articulou e dirige o funcionamento da comissão da Câmara que vai julgar (julgar, o que digo eu!?) o pedido de impeachment motivado por “algo-que-já nem-lembro-mais”, agora, ao que se anuncia, robustecido por um “aditamento” que junta os alhos das “pedaladas” aos bugalhos da denúncia sem provas, sobre fatos distintos, de um vilão como Delcídio Amaral, o “facilitador de fugas”.
Ora, ter alguém como Eduardo Cunha a ser o “Sergio Moro” da instrução criminal do processo de impeachment – ele é um processo criminal, de crime de responsabilidade – é, francamente, o mesmo que convidar Paulo Roberto Costa para ser titular da 13a. Vara Criminal de Curitiba. Por mais que eu critique o doutor, por seus métodos e espertezas jurídicas, tenho de reconhecer que não se pode chamá-lo do que o país inteiro chama Eduardo Cunha, malgrado suas ações se completem.
A terceira matéria é a cereja do bolo do entendimento do que é um golpe de Estado: “Com 50 anos, PMDB pode voltar a presidir o Brasil pela via indireta”
É isso, meus amigos, assim nuzinho e pelado.
Voltaremos ao tempo da “democracia da ditadura”, onde o voto do “Colégio Eleitoral” define quem presidirá o país, sem que este tenha sequer de se submeter a tocar na mão de qualquer um destes pobres imundos, aos quais as elites brasileiras fazem o favor de dar alguns empregos e uma esmola aqui e ali,
E que, em boa hora, foram contidos nas suas torpes aspirações de progredirem, de terem dignidade, de formarem um povo. Certo que também por culpa dos que não lhe avisaram que havia um antipovo à espreita para lhes barrar o caminho e que aquela belezinha do “todos e todas” ia converter as almas perversas.
E da primeira escolha indireta, talvez passemos a segunda – se Temer não for bonzinho, Gilmar tira-lhe a faixa no TSE, com a pressurosa ajuda de Dias Toffoli – e, finalmente, ao “diretas nunca”, com a implantação do parlamentarismo.
Numa tripa de jornal, cabe o resumo da ópera bufa da implantação de uma ditadura.
(Por Fernando Brito, no Tijolaço)
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