Por Fernando Brito*
O “remendo” que os jornais querem fazer para “aliviar” a situação de Sérgio Moro, com o placar de 8 a 2 com que o Supremo manteve em Brasília os inquéritos dobre Lula é apenas uma meia verdade. Este é o placar formal, em nada semelhante ao placar real, em que a atitude de Moro não teve o apoio de nenhum ministro do STF.
Quem assistiu à sessão do Tribunal que os votos de Marco Aurélio Mello e Luiz Fux ficaram mais numa questão teórica que calcados na situação específica.
A de que a declinação de competência quando surgem eventos envolvendo pessoas com prerrogativa de foro – no caso, Ministros e a própria Presidente da República – é obrigatória, sim, mas pode ser parcial por exclusiva iniciativa do próprio juiz, não por cisão de procedimentos necessariamente decidida pelo Supremo.
É uma questão procedimental, que não toca na questão objetiva que estava posta: Moro poderia ter feito o que fez?
A resposta de ambos foi claramente que não, segundo o Estadão:
Ambos defenderam que, como Lula não tem foro privilegiado, as investigações contra ele deveriam ser mantidas em Curitiba, e Moro deveria enviar a Brasília apenas as partes que envolvam Dilma e outras autoridades com prerrogativa de serem investigadas pelo Supremo. Fux e Mello concordaram, no entanto, que Moro não poderia ter divulgado os áudios.
“Não há justificativa plausível para uma divulgação como a que ocorreu nesse processo, divulgação que a meu ver colocou mais lenha em uma fogueira cuja chama já estava muito alta em prejuízo da nacionalidade, da paz social, da segurança jurídica”, disse Mello sobre o caso.
Fux defendeu a atuação de Moro no caso e sustentou que Dilma não estava sendo investigada. No entanto, ele admitiu que, caso a presidente tenha sido interceptada sem autorização do Supremo, a gravação deve ser anulada. “É evidente é que se houvesse algum procedimento, essa interceptação em relação à presidente da República teria que ser nulificada, porque não foi obtida com autorização do Supremo Tribunal Federal”, disse.
Portanto, não fica nenhuma dúvida de que a divulgação foi indevida e ilegal. E se é ilegal, não pode servir para, sobre ela, tomar-se uma decisão legal.
E foi sobre a divulgação dos áudios, e nada além disso, que Gilmar Mendes fundamentou sua decisão liminar de impedir a posse de Lula no Ministério,
O que irá – já deveria ter ido, aliás, mas Mendes tomou uma semana de férias para conspirar em Portugal – a exame do Supremo é essa decisão liminar. Não será o mérito da ação onde, sim, poderão ser levadas em contas as gravações que agora estão – mas não estavam – de posse do Supremo e cuja legitimidade é questionada até pelos dois ministros que votaram pela permanência do inquérito sobre Lula com Moro.
É óbvio que não pode ser validada a liminar, pois seria a revogação de um princípio sólido da Suprema Corte: é nula qualquer decisão tomada sobre prova inválida e, no momento da decisão, independente de qualquer outra questão, o Supremo firmou hoje o entendimento que o era, mesmo que a valide a posteriori.
Lula só não é ministro porque o STF, em má hora e com resistência de muitos dos seus integrantes, criou uma regra de que decisão singular de um de seus Ministros, seja qual for, não pode ser objeto de habeas corpus. O caso de hoje mostrou que não só pode como deve, porque está prevalecendo, por isso, uma decisão patentemente ilegal, tomada sobre prova até agora inválida e, naquele momento, por isso, inexistente.
Salvo por tropelia ou ódio, na semana que vem Lula será ministro e inexiste, no mundo do Direito, a possibilidade de que prevaleça o arranjo midiático proposto pelo Procurador Geral da República de que ele seja ministro mas seu caso siga com Sérgio Moro, na primeira instância.
É isso o que tentarão evitar, para que ele não possa ser, dentro do governo, o comandante da luta contra a manobra espúria do impeachment na Câmara e, à frente, o grande orientador de Dilma no reerguimento da administração.
E tomara que a presidenta compreenda, como parece que compreendeu, que não era apenas um slogan, mas a própria fonte de sua legitimidade, o que se dizia desde 2010 e de novo se disse em 2014.
Se Lula era Dilma, é porque Dilma era Lula.
*Editor do sítio Tijolaço, fonte desta postagem.
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