Por Raul Ellwanger (do livro Nas Velas do Violão)*
No meu horizonte de desconhecimento quase total da música latino-americana, tive o privilégio de assistir um concerto dos cantautores cubanos em Santiago do Chile no ano de 1972. Espanto imenso, alegria total, prazer, descoberta! Na barafunda da memória e na volúpia das descobertas, escalo Noel Nicola, Silvio Rodrigues e Pablo Milanés no elenco. Posso estar enganado, quiçá Vicente Feliú estivesse no grupo, mas não posso garantir. Não importa, a memória é um pouco louca, talvez eu deseje ter conhecido “el Tinto” Vicente desde aqueles dias heroicos.
Águas rolaram, moinhos rodaram. Eis que em 1984 Marilia Guimaraes instala na Rua Ipiranga do bairro de Laranjeiras, no Rio de Janeiro, uma bodega, pequena grande bodega. Por isto bodeguita, a filial do famoso restaurante e point Bodeguita del Medio havaneiro, celebrizada por Ernest Hemingway entre uma ressaca e o próximo highlander. Ali tocamos e compartilhamos com Vicente, Mirian Ramos, Carlos Luiz, Leticia Lins, dali saímos para as peladas do Chico no “estádio” do Politeama no km 18 da Rio-Santos, dali saímos para o Festival de La Paz em Canelones no Uruguai. Minha devoção pela música cubana crescia, com as gravações de temas de Silvio Rodrigues por Mercedes Sosa e Milton Nascimento, com Chico junto a Simone interpretando Yolanda, com os discos das composições de fillin de Marta Valdez, com Sindo Garay (Perla marina) e toda aquela geração criativa, uma espécie de prima-irmã da bossa-nova.
Eis que, redemocratizada a Argentina, arma-se uma temporada de um mês (repito: um mês) de Pablo e Silvio no ginásio Obras Sanitarias de Buenos Aires. Na folgas de segunda feira, viajavam a uma cidade grande do interior do país. Produzindo meu disco La cuca del hombre, Raul Porchetto ligou para Pablo em Córdoba e o convidou para participar. Assim fomos para o Estudio Ion com o trio caribenho que acompanhava a turnê, composto por Eduardo Ramos no baixo, Jorge Aragón (pai) no piano e Frank Bejerano na percussão, apoiado por Edu Avena.
Compositor de estirpe, Pablo faz canções muito acertadas, redondas, populares e criativas. Assim não tive problemas para fazer a versão do son de sua autoríaComienzo y final de una verde mañana. O problema veio depois, pois ingenuamente eu e Porchetto pensamos que Pablo cantaria em português, o que não ocorreu. O resultado saiu melhor, tipo mosaico, com partes em português, partes em castelhano e o dueto final com a letra original. Romântico até a medula (haja vista a fieira de filhos que gerou), compôs Pablo duas canções que estão em qualquer antologia das “dez melhores” do cancioneiro amoroso: este Comienzo (para Zoé) e Yolanda(para a própria).
Começo e final de uma verde manhã
Pablo Milanés – Versão Raul Ellwanger
Me deixa te despertar com um beijo
Na verde manhã que te espera
Me deixa celebrar a primavera
No espaço lindo do teu corpo
Na verde manhã que te espera
Me deixa celebrar a primavera
No espaço lindo do teu corpo
Dejadme recorrer ese universo
Que conozco sin limite y frontera
Dejadme descansar sobre tu pecho
Que calienta mi piel como una hoguera
Que conozco sin limite y frontera
Dejadme descansar sobre tu pecho
Que calienta mi piel como una hoguera
Me deixa repassar teus acidentes
Calmamente apalpar cada medida
Umedecer teus olhos e tuas fontes
E penetrar no fundo da tua vida
Calmamente apalpar cada medida
Umedecer teus olhos e tuas fontes
E penetrar no fundo da tua vida
Dejadme demostrar que diez noviembres
Purifican el alma y el deseo
Que al abrazarte aún mi cuerpo tiemble
Y relajado en paz me duerma luego
Purifican el alma y el deseo
Que al abrazarte aún mi cuerpo tiemble
Y relajado en paz me duerma luego
Dejadme al despertar tener la dicha
De hablar y compartir nuestros anhelos
Y en al mañana verde que termina
Volver a repetirte que te quiero
De hablar y compartir nuestros anhelos
Y en al mañana verde que termina
Volver a repetirte que te quiero
*Via Sul21 - http://www.sul21.com.br/
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