por Rachel Duarte, do Sul21
O resultado da investigação da Polícia Civil sobre a
tragédia que matou 241 pessoas na boate Kiss, em Santa Maria foi divulgado na
tarde desta sexta-feira (22). Foram 35 indicativos de responsabilizações, entre
eles, os donos e sócios da boate, bombeiros e comandante da corporação,
gestores municipais e o prefeito de Santa Maria, Cezar Schirmer (PMDB). Apesar
de ter sido apontado entre os responsáveis, o chefe do executivo não foi
indiciado por prerrogativa de função. O caso irá para o Tribunal de Justiça do
Rio Grande do Sul (TJ-RS).
Foram 16 indiciamentos criminais, sendo 10 indícios de
crime (9 encaminhados para a Justiça Militar e 1 para o Tribunal de Justiça) e
9 pessoas indiciadas por improbidade administrativa. O inquérito do incêndio
foi concluído 55 dias após a tragédia. São cerca de 13 mil folhas, com mais de 800 oitivas de
testemunhas, em uma investigação que envolveu
22 agentes de polícia e cinco delegados e teve a colaboração da Polícia
Federal.
A Polícia Civil indiciou por homicídio doloso (dolo
eventual): o cantor da banda Gurizada Fandangueira, Marcelo de Jesus dos
Santos, e o produtor Luciano Bonilha Leão; os dois sócios da boate, Elissandro
Spohr e Mauro Hoffmann; o gerente da Kiss, Ricardo de Castro; além da mãe,
Marlene Teresinha Calegaro, e da irmã de Kiko Spohr, Angela Calegaro que também
aparecem como proprietárias. Por homicídio culposo, foram indiciados os
secretários municipais de Mobilidade Urbana, Miguel Caetano Passini e de Meio Ambiente,
Luiz Alberto Carvalho Júnior, bem como o chefe de fiscalização, Beloyannes
Orengo de Pietro Júnior, e Marcus Vinicius Bittencourt Biermann, que emitiu
alvará de funcionamento da boate Kiss.
Entre os nove bombeiros que serão indiciados e
julgados pela Justiça Militar está o comandante regional do Corpo de Bombeiros
de Santa Maria, coronel Moisés Fuchs. Também foram indiciados bombeiros que
assinaram a liberação do alvará de funcionamento da Boate Kiss.
Segundo o delegado responsável pela investigação,
Marcelo Arigony, o documento mais relevante à investigação não foi entregue
pela administração municipal: teve que ser retido mediante mandado de busca e
apreensão, com apoio do Ministério Público do Rio Grande do Sul (MP-RS). “A
prefeitura não encaminhou o documento do engenheiro de carreira da prefeitura
apontando 19 irregularidades que impediam o funcionamento da boate”, contou o
delegado.
Apesar de destacar a relevância do documento, a
Polícia Civil não trabalhou com uma única causa para explicar a tragédia. Foram
apontadas inúmeras circunstâncias e também fatores que influenciaram
diretamente a tragédia. As conclusões do inquérito apontam que o fogo iniciou
às 03h17min, no canto esquerdo do palco, iniciado pelo vocalista da banda
Gurizada Fandangueira, Marcelo de Jesus Santos. “Cerca de 50 pessoas declararam
que o vocalista utilizou a mão para acender o artifício e ergueu o material
para cima. Era um material mais barato, que lançava uma chama muito mais alta”,
conclui Arigony.
Na hora da explicação, um vídeo gravado durante o
incêndio e recuperado pela Polícia Federal foi exibido para demonstrar que além
de começar o fogo, os músicos da banda não informaram sobre o incêndio na hora
em que o extintor não funcionou.
Neste momento, familiares que acompanhavam a coletiva
se emocionaram. Alguns deixaram o local. Em apenas 30 segundos o fogo e a
fumaça preta dos gases tóxicos que matou todas as vítimas por asfixia tomaram
conta da cena gravada. Os gritos de pânico e outros ruídos demonstraram o caos
instalado na madrugada do dia 27 de janeiro.
Segundo o delegado Arigony, nas imagens foi possível
perceber que os músicos, ao ver que o fogo não iria cessar, optam por deixar o
palco pelo lado. “Eles deveriam tentar salvar as pessoas avisando no microfone.
É possível notar que enquanto o fogo se alastrava, alguns compravam cerveja no
bar. Ninguém acreditava que era um incêndio”, disse.
Nas provas documentais foi possível concluir as falhas
de segurança e irregularidades da gestão da boate. O Plano de Prevenção Contra
Incêndio também apresentou inúmeras falhas. Os laudos apontaram que a espuma de
isolamento acústico era inadequada, a boate estava superlotada e os extintores
não funcionaram. Conclui-se também que as grades de proteção dificultaram a
saída das vítimas. “Tinhamos uma boate funcionando em absoluta irregularidade”,
definiu o delegado Marcelo Arigony.
Cópias do inquérito policial serão encaminhadas ao
Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura (CREA), a fim de averiguar
eventuais responsabilidades profissionais dos engenheiros e arquitetos que
prestaram serviços à Boate KISS.
Também para as Câmaras Legislativas Federal e Municipal (Santa Maria). E ainda, um ofício será encaminhado pela Polícia Civil ao Ministério Público do RS para notificar as possíveis práticas de improbidade administrativa dos gestores municipais e do prefeito Cezar Schirmer. (...)
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