Por Paulo Moreira Leite*
Depois da vitória correta de Azeredo no STF cabe perguntar
por que os réus da AP 470 não tiveram o mesmo direito.
Ao decidir, por 8 votos a 1, que Eduardo Azeredo deve ser
julgado em Minas Gerais pelas denúncias ligadas ao mensalão tucano, o
Supremo fez a opção correta entre a farsa e a justiça.
A farsa, como se sabe, consistia em negar a Azeredo o
direito de ser julgado em primeira instancia – e depois pedir um segundo
julgamento em caso de condenação, como a
lei assegura a todo cidadão sem prerrogativa de foro – apenas para manter um teatrinho coerente
com a AP 470.
Eduardo Azeredo teve seu direito reconhecido pacificamente,
por 8 votos 1, placar tão folgado que desta vez não se ouvirá o coralzinho de
quem culpa os “dois ministros da Dilma” por qualquer resultado que não lhe
agrada.
Em nome da mitologia
em torno do “maior julgamento da história” se poderia querer repetir uma
injustiça por toda a história.
Assim: já que nenhum
réu ligado ao PT teve direito a um julgamento em primeira instância, o que
permite a todo condenado entrar com um recurso para obter um segundo
julgamento, era preciso dar o mesmo tratamento a pelo menos um dos réus ligados
ao PSDB.
Para esconder um
erro, era preciso cometer um segundo – quando todo mundo sabe que isso não
produz um acerto, mas apenas dois erros.
Com decisão de ontem
ficou um pouquinho mais fácil reconhecer
um fato que já é reconhecido por um número crescente de estudiosos, de
que a AP 470 foi resolvida como um julgamento de exceção.
Nas fases iniciais
das duas ações penais, não custa
lembrar, o STF deu sentenças diferentes para situações iguais, o que sempre
pareceu escandaloso.
Desmembrou o julgamento dos tucanos. Apenas réus com mandato
parla
mentar – Azeredo e o senador Clésio Andrade – ficaram no
Supremo.
O mesmo tribunal, no
entanto, fez o contrário na AP 470. Todos – parlamentares ou não -- foram
julgados num processo único, num tribunal único.
Mesmo quem não tinha
mandato parlamentar foi mantido no STF,
onde as decisões não têm direito a recurso e, apenas em casos muito especiais,
é possível, entrar com os embargos infringentes.
Mesmo assim, na AP 470 havia até o risco, como se viu, de
negar embargos, não é mesmo?
Ao decidir que o
ex-deputado mineiro deve ser julgado nas regras que a Constituição e a jurisprudência sempre asseguraram a todos os réus em situação semelhante – a
única exceção foi o notório Natan Donadon, com
várias particularidades – o STF
coloca outro debate em questão.
Se Eduardo Azeredo
terá direito – corretamente -- a um segundo julgamento, caso venha a ser
condenado, por que os réus da AP 470 não podem fazer o mesmo?
Essa é a pergunta, desde ontem. Se os réus da AP 470 não
tiveram direito a um novo julgamento -- seja através de uma revisão criminal,
seja na Corte Interamericana de Direitos Humanos -- teremos a confirmação da
farsa dentro da farsa, a exceção dentro da exceção. Tudo para os amigos, nem a
lei para os adversários.
*Paulo Moreira Leite (foto) é jornalista. É Diretor da Sucursal da ISTOÉ em Brasília, é autor de "A Outra História do Mensalão". Foi correspondente em Paris e Washington e ocupou postos de direção na VEJA e na Época. Também escreveu "A Mulher que Era o General da Casa".
- Via http://www.istoe.com.br/
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