Ex-presidente chorou diversas vezes, agradeceu o carinho recebido, mas também cobrou “desculpas” de pessoas que “levantaram leviandades” contra a ex-primeira dama, com quem foi casado durante 43 anos
Da RBA*
No lugar onde se conheceram, no
final de 1973 – casariam apenas sete meses depois, em maio do ano seguinte –, o
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva despediu-se na tarde de hoje (4) de sua
mulher, Marisa Letícia, em um lotado salão do Sindicato dos Metalúrgicos do
ABC, em São Bernardo do Campo, palco de inúmeras assembleias. Agradeceu o
carinho recebido, chorou diversas vezes e também cobrou desculpas por parte de
quem a perseguiu com “leviandades”, usando o termo “facínoras”.
“Minha vida não seria um décimo
do que é se não fosse este sindicato. Aqui eu aprendi a falar, aqui eu perdi o
medo do microfone. Eu não esqueço os acontecimentos deste salão. Aqui eu
conheci a Marisa. Aqui a Marisa sustentou a barra para que eu me transformasse
no que eu sou”, disse Lula, emocionado. “Ela praticamente criou os filhos
sozinha…”, acrescentou, interrompendo a fala. “Na verdade, ela foi mãe, pai,
filha, foi avó, foi tudo.”
A ex-presidenta Dilma Rousseff,
governadores, ex-ministros, representantes de diversos partidos e de movimentos
sociais e muitos antigos companheiros de Lula estiveram desde cedo na sede do
sindicato. O velório foi aberto ao público às 10h, após um momento reservado
para a família. Até as 15h, aproximadamente, a fila vinha do térreo até o
terceiro andar do prédio. Lula permaneceu três horas em pé, ao lado do caixão,
até sair para uma área mais retirada, ao lado. A cerimônia terminou às 15h30. O
corpo seria levado para o cemitério Jardim da Colina, também em São Bernardo,
para ser cremado, em cerimônia reservada à família.
O discurso do ex-presidente não
estava previsto. Ele falou após as manifestações de Dom Angélico Sândalo
Bernardino – que há dois dias administrou o sacramento dos enfermos –, do bispo
da Diocese de Santo André, dom Pedro Carlos Cipollini, e do padre Júlio
Lancelotti, da Pastoral do Povo de Rua. Foram evitados discursos políticos, mas
dom Angélico fez referências às reformas trabalhistas e da Previdência Social,
para que não sejam “contra os trabalhadores, contra os pobres”. E pediu a Lula
que descanse a partir de amanhã, “pois o Brasil vai precisar muito de você”.
“A Marisa Letícia está viva. Foi
uma guerreira na luta a favor da classe trabalhadora. Ela está dizendo ao povo
para continuar mobilizado na rua”, acrescentou o bispo, citando trechos do
bíblico Sermão da Montanha: , exclamou“Bem-aventurados os que têm sede e fome
de justiça, serão saciados”. “Quem ama é imortal. Quem ama não morre jamais.
Marisa sempre” padre Júlio. As milhares de pessoas rezaram o Pai-Nosso, depois
de gritos de “Lula, guerreiro do povo brasileiro”, “Marisa, guerreira da pátria
brasileira”.
Lula lembrou de quando conheceu
Marisa e disse que o casamento é “o maior exercício de democracia” que existe,
acrescentando que eles nunca brigaram. “Ela certamente vai encontrar figuras
extraordinárias lá em cima”, afirmou, citando dona Regina, mãe da
ex-primeira-dama, usando o chamativo familiar “Regineta”.
Também enfatizou o papel político
de Marisa ao seu lado, como companheira e conselheira. “No fundo, ela era mais
do que uma ministra. Ela tinha muito mais importância que os ministros. Ela
dizia ‘ não esqueça nunca de onde você veio e para onde você vai voltar”,
lembrou.
E recordou de uma passagem no
Palácio da Alvorada, residência presidencial, quando a então primeira-dama
começou a rir sem parar. Ela explicou depois, ainda rindo, que provavelmente os
funcionários da cozinha nunca imaginariam que teriam um presidente da República
e uma primeira-dama pedindo para cozinhar “pé de frango”. Segundo ele, era uma
“galeguinha que parecia frágil, mas quando ficava brava botava medo”. Olhando
para a companheira, disse que iria agradecer por toda a vida. Contou ter ele
mesmo escolhido o vestido, vermelho. “A gente não tinha medo de vermelho quando
era vivo, não tem medo de vermelho quando morre”, falou, sob aplausos. Também
pôs a tradicional estrelinha do PT no vestido: “Eu tenho orgulho”.
Dizendo esperar que os
“facínoras” tenham a humildade de pedir desculpas, repetiu ter a consciência
tranquila e se emocionou mais uma vez na despedida: “Marisa, descanse em paz,
que o seu Lulinha paz e amor vai continuar para brigar por você…”
*Via http://www.sul21.com.br/
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