18 julho 2022

O fio da História que matou Vladimir Herzog alcançou Marcelo Arruda

"Inquérito de Foz confirma a sobrevivência de um princípio da ditadura: impedir toda investigação verdadeira sobre crimes políticos", diz Paulo Moreira Leite*

   Marcelo Arruda, petista assassinado em Foz do Iguaçu (Foto: Arquivo pessoal)

Brasileiras e brasileiros que compreendem a importância de estudar a Historia do  país, separando o essencial do secundário, devem reconhecer as semelhanças fundamentais que unem a morte de Marcelo  Arruda, em julho de 2022, num salão de festas improvisado onde comemorava seu aniversário, e a morte de Vladimir Herzog, em outubro de 1975, massacrado pela tortura no DOI-CODI paulista. 

Claro que, 47 anos depois,  as diferenças são enormes, no cenário do país e na cena da tragédia. Não se pode comparar o Brasil onde vigora a Carta de 1988, onde presidentes são eleitos pelo voto direto do povo, com aquela republica dominada pelos generais de um regime onde a tortura e o assassinato eram métodos triviais de governo e o porão militar irradiava uma força que ninguém ousava desafiar.  

Há meio século, os presidentes eram escolhidos pelo Alto Comando do Exército.  

No Brasil no qual Herzog foi morto, as greves de trabalhadores eram proibidas e derrotadas com violência e prisões de uma justiça subjugada.  Em 2022, o principal líder das lutas operárias do país disputa como favorito seu terceiro mandato a Presidência da República. Mas há uma semelhança importante, que se encontra num dos centros de poder do Estado. 

Em outubro de 1975, o comando do DOI CODI onde Herzog foi massacrado pertencia ao coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, patrono assumido da violência contra prisioneiros. No Brasil de 2022, a presidência da República está nas mãos de um discípulo assumido de Ustra, a quem dedicou seu voto num momento crucial de nosso retrocesso político -- a sessão em que o Congresso consumou o golpe parlamentar de 2016, que afastou Dilma Rousseff da presidência, primeiro passo para o retorno de um núcleo militar de extrema-direita ao Planalto. 

O fio de continuidade aqui reside num ponto conhecido -- O princípio Covarde de que ninguém será punido e muito menos investigado por crimes políticos.  No esforço para esconder responsabilidades pelo assassinato de Herzog, operadores do porão chegaram a forjar uma cena de suicídio -- com fotografia e tudo.  Embora ninguém tenha sido punido, muitos implicados no crime foram identificados e desmascarados. 

Em julho de 2022, o ambiente político não permite tamanha desfaçatez. Mesmo assim, a  linha da impunidade a todo custo permanece, num simulacro de investigação policial se inicia pelo descarte da hipótese óbvia de crime político, confirmada por diálogos filmados e gravados em vídeo, e termina pela decisão de deixar de periciar o celular de Jorge Guaranho, que disparou os tiros que mataram o petista Marcelo Arruda. A questão central permanece.

Está em vigor, no Brasil, a lei 13.260, de 16/3/2016, aprovada pelo Congresso e sancionada por Dilma Rousseff. Ali se define,  no artigo 2o, o que são "atos de terrorismo. "No item V, do parágrafo segundo, a questão está clara: "atentar contra a vida e integridade física de pessoa". 

Alguma dúvida?

*Jornalista - Fonte: Brasil247nça e nos EUA

Nenhum comentário: