Por Antônio Escosteguy Castro*
Estas primeiras eleições posteriores ao golpe que depôs Dilma e sob a égide da Lava-jato prometiam surpresas. Mas nem minhas mais pessimistas previsões apontavam que seriam tão deletérias para o país e sua jovem democracia.
Em condições normais, uma eleição serve para consolidar e fazer avançar o regime democrático. Não foi o que se viu no Brasil de 2016. Em primeiro lugar, a Reforminha eleitoral de Eduardo Cunha, que tirou tempo de TV e proibiu quase todo tipo de propaganda, impediu que se constituísse no país um clima eleitoral e com isso eliminou o debate político. A proibição da propaganda, muito mais que as limitações financeiras (eis que foram vedadas até propagandas baratas, como cavaletes e placas) mantiveram as cidades “limpas” e o debate ausente. A troca do horário eleitoral gratuito por “spots” de propaganda também impediu que pudesse evoluir um debate de propostas.
Sem clima eleitoral e sem debate, a campanha midiática de judicialização e criminalização da política e dos políticos correu solta, sem qualquer contrapartida. O resultado é cristalino: em Belo Horizonte, a soma de abstenções, votos nulos e brancos superou 43% do eleitorado; em São Paulo, esta soma superou a votação de João Dória, que venceu no 1º turno e em Porto Alegre cresceu quase 70% em relação a 2012. Foi a derrota da política, um passo firme em direção ao abismo.
Os partidos saíram mais fragilizados, crescendo enormemente a fragmentação eleitoral do país. Mesmo o PSDB, mais claro vencedor das eleições, que até ampliou o número de prefeituras conquistadas, perdeu quase 1 milhão de votos em relação às eleições de 2012. Isto ganhando em São Paulo…
O Governo Temer não conseguiu se consolidar. O PMDB do núcleo central do Planalto foi derrotado. O PSDB, sócio menor, até agora, do Governo, cresceu e tudo indica um “golpe dentro do golpe”, na melhor tradição da elite brasileira. A esquerda foi severamente derrotada, mas não foi aniquilada e mostra ainda capacidade de resistência.
O Brasil saiu das eleições mais instável do que entrou.
Decorrido tão pouco tempo da votação, só são possíveis algumas considerações preliminares sobre os resultados, que impulsionem uma reflexão mais aprofundada mais tarde. Mas vamos lá:
1. O PSDB é o maior vencedor e o golpe judicial/policial vai recrudescer:
A vitória em São Paulo, os resultados em Porto Alegre e BH, o aumento do número de prefeituras, tudo leva à conclusão da vitória do PSDB nestas eleições. Isto terá como consequências a ampliação da pressão sobre Temer e o recrudescimento da perseguição judicial ao PT e mesmo ao PMDB, eis que os setores da Judiciário, do MP e da Polícia que vem atuando se identificam com os tucanos, sistematicamente blindados, não importa o que aconteça.
2. O PT é o maior derrotado e deverá se reinventar:
O PT sofreu uma derrota fragorosa, retornando a níveis eleitorais anteriores ao Governo Lula, embora não tenha sido aniquilado como desejava a direita e trombetearam alguns órgãos de imprensa. Mas o Projeto Democrático-Popular, que orientava o partido desde os anos 80, afundou de vez e o PT deverá evoluir para novas formas de organização e relação com suas bases sociais e produzir um novo programa. O Congresso da legenda, convocado para o primeiro semestre de 2017 deverá ser um novo ponto de partida. Não se consolidaram novas opções à esquerda nesta eleição e se o PT se jogar na campanha de Marcelo Freixo no Rio dará um importante passo em sua reinvenção.
3. Temer perdeu as eleições e o PMDB é um coadjuvante secundário:
O núcleo central do Governo Temer amargou pesadas derrotas nesta eleição. O PMDB foi varrido no Rio e em SP, e no Rio Grade do Sul só um milagre do Negrinho do Pastoreio tira a vitória de Marchezan na capital. O PMDB manteve aproximadamente o mesmo número de prefeitos, mas vê reforçada sua condição de federação de caciques regionais, já que seu núcleo central não ganhou nada e ficou enfraquecido. O PSDB atacará o centro do governo e buscará criminalizar mais nomes do PMDB. Temer continuará disposto a fazer todo o trabalho sujo para Alckmin aproveitar em 2018?
4. No RGS, o PT sobreviveu e Sartori saiu ainda mais fraco:
A derrota do PT no RGS foi um foi um pouco menor do que no resto do Brasil. No país, o PT perdeu 2/3 das prefeituras, aqui menos da metade. A queda nos vereadores foi menos de 1/3 e o Partido conquistou prefeituras importantes como Rio Grande e São Leopoldo e está no segundo turno de Santa Maria e, como vice, em Canoas. Mas isto não se deu por uma pretensa superioridade do PT gaúcho. Creio que a fragilidade do governo Sartori concedeu ao PT um protagonismo distinto aqui , não ficando apenas como vidraça, que lhe permitiu manter mais espaços que no resto do país. Já o PMDB de Sartori, se conseguiu manter o número de Prefeituras, encolhe, e muito, politicamente. Deverá perder Porto Alegre, onde Marchezan inaugurará um novo pólo político conservador; ficou com apenas 6 dos 50 maiores municípios (e em Gravataí ainda depende do tapetão, ou Daniel Bordignon lhe tira mais uma prefeitura) e certamente o PDT, que pagou um preço caríssimo por manter-se junto ao PMDB na capital, vai se distanciar ainda mais do Piratini. Sartori está mais isolado do que nunca.
O Brasil sai destas eleições mais conservador, sim. Este é , inclusive, um fenômeno internacional. Não foi por mera coincidência que neste mesmo domingo, na Colômbia, o Tratado de Paz com as FARC foi rejeitado em plebiscito, com enorme abstenção (60%). Mas , principalmente, nosso país saiu mais instável, despolitizado e fragmentado. Não são eleições para comemorar. O Brasil perdeu.
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*Antônio Escosteguy Castro é advogado. Fonte: Sul21
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