Na Folha, Janio de Freitas produz uma afirmação que condensa todo o
drama da eleição presidencial que se aproxima. Não há – e, ao que tudo
indica, não haverá – uma disputa entre candidatos, partidos, projetos. O
que há é um sistema de poder, que se expressa pelo Judiciário, que
interdita e quer manter interditado não apenas um homem, mas uma opção
de Brasil.
A disputa que decide
Janio de Freitas, na Folha*
A eleição presidencial está disputada, e
será decidida, entre o pré-candidato que, apesar de único a não estar em
campanha, detém descansada preferência do eleitorado, e de outra parte o
combinado STF-STJ. Acima da divergência em aspectos jurídicos, os
termos dessa disputa lançam uma interrogação sobre a legitimidade do seu
resultado como representação eleitoral democrática.
O eleitorado reúne cerca de 150 milhões
de cidadãos, mas os votos que vão decidir a disputa central são os de 11
ministros do Supremo Tribunal Federal e 33 do Superior Tribunal de
Justiça, aos quais caberá a palavra final sobre a possibilidade de que a
pré-candidatura preferida nas pesquisas busque sê-lo também nas urnas.
As condições vigentes há meses são claras
na indicação de que o problema de legitimidade do resultado eleitoral é
secundário, ou nem se apresenta, nas considerações do Judiciário
ocupado com o enlace condenação-prisão-candidatura.
A marcha rumo ao objetivo judicial, ou
assim invocado, não desacelerou nem diante de regras também judiciais,
superando-as sob a observação cúmplice dos que condenam cúmplices.
Marcha batida até chegar ao segundo êxito, consumado no encarceramento
com dupla significação: como ato judicial e, por consequência, como ato
político-eleitoral.
Em tais circunstâncias, o pedido e a
concessão de habeas corpus só podem ser vistos como atitudes impensadas
em favor de Lula. Não caberia a mais leve dúvida de que o habeas corpus
não daria ao preso mais do que algumas horas, se tanto, de liberdade
relativa.
Os bem-sucedidos condenadores não tinham
por que descuidar do seu êxito e tinham todos os meios, nas regras e
fora, para devolver Lula à prisão. Usaram todos, e nem o deixaram chegar
à porta.
Das seis pretensas razões citadas na
concessão do habeas corpus, só uma tem potencial efeito. A autorização
do Supremo para prisões já em condenação na segunda instância, e não no
esgotamento constitucional dos recursos, condicionou-as à fundamentação
da sua necessidade.
No caso, nem sequer foi apresentada
fundamentação. Com o farto tempo para elaborá-la, ou o desembargador
João Gebran e seus companheiros não encontraram fundamentos
convincentes, ou mais uma vez o Supremo foi relegado, e pronto. Mas que a
falta de fundamentação explicitada compromete a ordem de prisão, é tão
certo quanto a submissão do Supremo.
Ao que tudo indica, o momento menos
desfavorável a Lula, no Judiciário, será a avaliação de provas que devem
acompanhar a condenação. A etapa, se houver, se dará no Superior de
Justiça ou no Supremo. Neste, o ministro Edson Fachin tem repelido a
falta de provas e criticado a limitação dos procuradores da Lava Jato a
delações. Já são mais do que notórias, porém, as práticas exclusivas
para Lula.
Logo, a disputa eleitoral decisiva, entre
o líder das preferências eleitorais e o combinado STF-STJ, permanece. E
até que acabe, o processo nada significa para os demais pretendentes
nem para os eleitores, a 90 dias das urnas.
*Jornal Folha de São Paulo - Via Tijolaço
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