Fátima Bezerra (PT/RN) com o ex-Presidente Lula |
Nova Palmeira ainda era um povoado paraibano, na segunda metade dos anos
1950, quando por muito pouco não foi cenário de uma tragédia. A tarde
seguia sem pressa até o instante em que um caminhão baú em alta
velocidade atravessou o sertão e passou por cima de uma das filhas do
artesão Severino e da parteira Luzia.
De sobressalto e em estado de choque, a família correu em desespero
imaginando o pior, ao mesmo tempo em que o motorista sumia na caatinga
sem rumo e sem prestar socorro.
Deitada, sem se mexer, a pequena Fátima abriu os olhos devagar quando
viu os irmãos, os pais e amigos aglomerados ao redor dela. O corpo da
menina tinha ficado posicionado entre as rodas do caminhão. A “neguinha”
de seo Severo, como o pai chamava a filha, saiu ilesa.
“Foi milagre!”, gritou a mãe, parteira do povoado e devota de Santa Luzia.
Seis décadas depois, a filha de Severino e Luzia, dada como morta por
poucos e intermináveis segundos naquela tarde dos anos 1950, é motivo
de festa mais uma vez em Nova Palmeira, embora o destino a tenha levado
para o vizinho Rio Grande do Norte, onde construiu uma trajetória que
começou na sala de aula, passou pelo movimento sindical, chegou ao
legislativo estadual, seguiu pela Câmara dos Deputados e Senado até
desembarcar no cargo político mais importante do Estado.
Nesta terça-feira (1º), Fátima Bezerra [PT/RN] consolida esse percurso. Será
empossada como a única mulher eleita em 2018 para administrar um estado
no país pelos próximos quatro anos. E com um adendo, como costuma
enfatizar desde a campanha eleitoral: será a primeira governadora de
origem popular no Rio Grande do Norte, estado que já contou com outras
duas mulheres na chefia do Executivo (Wilma de Faria e Rosalba
Ciarlini), mas ambas ligadas à famílias tradicionais e oligarquias
locais que se revezavam no poder até as eleições deste ano.
Em 63 anos, mudou muita coisa no país, na região Nordeste, no Rio
Grande do Norte e na vida da governadora eleita pelos potiguares. Os
seis filhos de Severino Bezerra de Medeiros e Luzia Mercês do Amaral –
Preta, Sebastião, Bêu (já falecido), Conceição, Fátima e Terezinha –
dormiam nos colchões de palha e lã feitos pelo pai, inicialmente dentro
da própria casa da família. Depois, em um galpão vizinho. Luzia muitas
vezes se ausentava por horas ou virava a noite para ajudar outras
mulheres a serem mães também.
Apesar da vida partidária de Fátima, a política não chega a ser uma
novidade para a família Bezerra. Preta, a irmã mais velha, foi
vice-prefeita e vereadora de Nova Palmeira. E a própria mãe, dona Luzia,
tinha o respeito dos políticos da região em razão do carinho popular
conquistado pelos partos gratuitos que realizava nas redondezas.
Quando Fátima confrontou Carlos Eduardo Alves (PDT) num dos debates
do 2º turno, afirmando que ele não sabia o que era uma seca de verdade,
a senadora e então candidata ao Governo olhava para o próprio passado e
voltava para um cenário conhecido, marcado pelos efeitos que a estiagem
deixava no chão de Nova Palmeira.
A irmã Conceição conta que quando eram criança, ainda na Paraíba, a região sofria com uma longa seca:
“Às vezes nossa mãe chegava nas casas e não tinha nem açúcar pra
fazer uma garapa pra dar força nas mulheres. Ela levava a comida, um
pedacinho de carne pra fazer pirão e só voltava pra casa quando a mulher
descansava”, relata.
Ceição, como é chamada, vê algo da matriarca na irmã mais famosa. “Fátima
hoje é essa mulher que – eu digo muito a ela – faz o que minha mãe
fazia, só que de outra forma, com outra roupagem. A vida dela é
trabalhar pelo povo”, diz com orgulho da mãe e da irmã. (...)
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