Por Janio de Freitas, na Folha de S. Paulo*
A par das causas físicas e empresariais, a Procuradoria-Geral da
República, os Ministérios Públicos federal e de Minas e o Judiciário
destacam-se entre os responsáveis pela segunda tragédia causada por
ruptura de barragem.
Sentenças rigorosas, e em tempo admissível, para os culpados pela
tragédia em Mariana levariam os administradores de barragens a
fiscalizações sérias e permanentes.
E à prevenção devida aos habitantes, seus bens e áreas produtivas atingíveis por possível ruptura –caso óbvio de Brumadinho.
Faltaram ainda àqueles poderes providências, por exemplo, para que
todas as empresas administradoras de barragens fizessem, em seguida ao
desastre de Mariana, inspeções e laudos formais em prazo determinado.
Talvez evitassem em Brumadinho o desaparecimento de tantas pessoas,
colhidas na ingenuidade perversa do perigo. E por certo o fariam em
outras barragens também deixadas ao seu potencial ameaçador.
Já sabemos como aqueles poderes procederão outra vez.
ESTÁ NO AR
Excluído do Exército, sob ponderações no Superior Tribunal Militar
que puseram em dúvida até seu equilíbrio mental, Bolsonaro ficou à
distância de sua classe por muito tempo. Embora refletindo-a nas
opiniões e, proveito também eleitoral, nas reivindicações.
A perspectiva da candidatura à Presidência mudou sua relação com o passado.
Por utilitarismo, sem dúvida, Bolsonaro empenhou-se em ser dado como
capitão, representante legítimo de todas as idiossincrasias e da
radicalidade conservadora, anticultural e patrioteira da caserna. O
candidato identificado com as Forças Armadas.
Os comandos do Exército aceitaram o risco dessa identificação, apesar
da preocupação até revelada. Os da reserva, categoria em que as
pretensões de superioridade e os sectarismos podem se mostrar mais,
regozijaram-se com a atitude de Bolsonaro.
O então comandante do Exército, general Villas Bôas, que se
reconhecera como um dos preocupados, formalizou a aceitação do risco,
aparentando dá-lo por extinto.
Em duas semanas após a posse, a preocupação voltou a muitos. Pelo avesso, porém.
Como preocupação com a possibilidade de identificação, aos olhares
internos e sobretudo externos, dos militares e seus generais com
Bolsonaro, suas ideias irrealistas e o círculo familiar-religioso
insustentável.
Desde a terceira semana, o lento desenrolar do caso Flávio Bolsonaro e
seus tentáculos até o próprio Bolsonaro tiveram a contribuição do
vexame no Fórum Econômico Mundial para agravar o estado de coisas.
Se cá fora, sem comprometimento com a situação, seus possíveis
desdobramentos causam inquietações, é fácil imaginar o que se passa com a
maioria dos generais, inclusive como contribuintes da identificação
militar com o novo e caótico poder.
Nos últimos dias, as interpretações, análises, deduções, dos mais
diversos calibres, povoaram as mentes e conversas dos próximos e dos
mais atentos às várias movimentações no poder e arredores.
Admitidas exceções, entre os generais do governo militarizado e Jair Bolsonaro o ar já não é o mesmo.
Apesar do esforço, a poluição é perceptível.
Ainda não se conhece poluição que não deixe consequências.
*Via Viomundo
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