Por Fernando Brito*
Durante 24 horas, a Ordem dos Advogados do Brasil, tão afoita em
mergulhar no apoio aos arreganhos do golpismo no Brasil, assistiu
passivamente a onda monstruosa de suspeição ao sujeito – é bom repetir,
aparentemente fanático e desequilibrado – que agrediu a faca o senhor
Jair Bolsonaro.
Quem o estaria pagando? A “esquerda”, a “Ursal”?
Foi tanta a pressão que o advogado teve de vir a público indicar quem o contratara:
– Uma pessoa ligada à igreja dos testemunhas de Jeová de Montes Claros me telefonou na quinta pedindo para eu pegar o caso
Ufa! Que alívio: ninguém vai colocar as Testemunhas de Jeová no meio
de uma conspiração comunista, ou será que vai. Porque se fosse católico,
ah, claro que ia entrar na conta dos “padres comunistas” dos quais tanto
esta camada de energúmenos vive falando.
No nosso déficit democrático – sobretudo na mídia, que levanta sempre
esta suspeita e dá repercussão aos delírios fascistas – o advogado,
direito universal de qualquer ser humano, é imediatamente transformado
em cúmplice de seu cliente e vira “defensor de bandido”, alguém que deve
“ir pro saco” junto com seu constituinte.
A simplificação – monstruosa como sabem ser as simplificações – da
ideia de Justiça como os “bons” contra os “maus” cria, nas palavras do
professor de Direito Criminal Salah Khaled Jr, “um perigoso nó de forças [que]
converge para de forma sistemática aviltar, desprestigiar e aniquilar a
própria ideia de defesa, como se ela fosse um obstáculo indesejável
para a concretização de uma justiça que é identificada com o poder
punitivo”.
Essa monstruosidade, cada vez com mais frequência, é praticada pelo
próprio Judiciário e suas cercanias, no MP e na Polícia, porque
desqualificar o defensor e sua atividade são abrir caminho para a
afirmação de uma pseudojustiça, moldada unilateralmente pelos detentores
do poder de Estado.
Sob o inexplicável silêncio e omissão da advocacia e de sua Ordem,
que assistiu quase muda as maiores violências, como a praticada na “Lava
Jato”, quando se grampeou os telefones do escritório que fazia a defesa
de Lula, por ordem de Sérgio Moro e pedido da turma do Dallagnol.
Os advogados, expostos nos jornais à sanha dos fanáticos, estão
sujeitos à detratação pública e até às próprias famílias e amigos terão,
constrangidamente, de explicar porque atuam na defesa de um “bandido”
e, já que delírio não tem limite, de “um “comunista de Jeová”.
Na ditadura da farda, quantos foram bater à porta da OAB, pedir
socorro a gente como Modesto da Silveira, Nilo Batista, Délio dos
Santos, Raimundo Faoro, Evaristo de Morais Filho e tantos outros.
Agora, na ditadura da toga, melhor passarmos a conhecer gente das
Testemunhas de Jeová, capazes de fazer a defesa de acusados com mais
senso jurídico que a Ordem dos Advogados.
Ou nos prepararmos para a ideia de que direito de defesa é portar uma pistola.
*Jornalista, Editor do Blog Tijolaço
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