Por Janio de Freitas*
A privatização de partes da Petrobras, até deixar apenas o talo, é
um dos poucos itens de política econômica confirmados pelos planejadores
do futuro governo e pelo próprio Jair Bolsonaro, mas outra vez com
dispensa de uma obrigação preliminar. Tal como nos negócios do governo
Fernando Henrique com empresas do Estado.
Por que à época
vender a Vale, de alta lucratividade e, portanto, de dupla contribuição
para os cofres públicos, em impostos e em rentabilidade de acionista?
Não foi dito ao país. E o destino prometido para o resultado da venda
era falso, jamais se informando ao país o fim dado à dinheirama.
A ideia de esquartejar a Petrobras não é nova. Subiu à tona nas águas
da Lava Jato e começou a se efetivar na ilusória salvação que Michel
Temer impôs à empresa. A BR Distribuidora e as refinarias, agora citadas
para iniciar a privatização das mutilações, são duas minas de lucros.
Equipadas, organizadas, com matéria-prima e clientela garantidas, sem
exigir investimento algum, não pedem mais do que a atividade atual para
produzir altos lucros. Não dão motivo para sua venda.
A Petrobras
as perderá com motivos para mantê-las. A rentabilidade da distribuidora
e das refinarias deu forte contribuição às montanhas de recursos
financeiros necessários à prospecção e à exploração do pré-sal.
Reprimido no seu "tudo vai ser privatizado" —em resposta como candidato
sobre o futuro da Petrobras—, Bolsonaro diz que "a empresa vai se
dedicar só à produção de mais petróleo". Mas depois de perder duas
fontes dos recursos necessários a tal objetivo. E os cofres públicos
deixam de receber os lucros do Estado como acionista da Petrobras e suas
subsidiárias.
A sanha das privatizações, imposta pelo
neoliberalismo e seu "capitalismo financeiro", já postos sob acusações
graves por danos a muitos povos, tem muito o que privatizar, ou mesmo
fechar, antes de suprimir fontes de recursos adicionais para a carente
administração pública.
Ainda assim, voltados para um lado, os
neoliberais gritam pelo corte de gastos, por falta de recursos;
viram-se, e berram pela extinção de fontes de recursos. Não é de
economia, sua pretensa especialidade, que estão falando. É de política,
de necessidades da população, de objetivos do país —e de interesses de
grupos nacionais e internacionais.
Chegar ao governo, seja por
eleição ou nomeação, não autoriza a pensar e conduzir-se como novo
possuidor do que, sob a guarda do Estado, continua a ser patrimônio
público. No Brasil essa noção, fraca no passado remoto, esvaiu-se por
completo em nosso tempo.
Meia dúzia de governantes e
planejadores decidem à vontade a destinação de patrimônios, vitais
tantos deles, que custaram sacrifícios, esforços e muito tempo às
gerações.
É o caso do conhecimento e das riquezas alcançadas
pela Petrobras. E de certa paz, mantida à distância a ferocidade das
ambições e disputas dos grupos magnatas do petróleo.
Integrados
na brava campanha "O petróleo é nosso", que teve o Clube Militar como
sua fortaleza, os militares foram decisivos para a existência da
Petrobras e, daí, para a potência petrolífera que o Brasil é hoje. Não é
irônico que sejam militares a ameaçar a existência da Petrobras e mesmo
a riqueza petrolífera do pré-sal.
*Jornalista - publicado originalmente no jornal Folha de S. Paulo.
(Edição final deste Blog)
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