Voltamos a ser um país atrasado de um povo atrasado
Por Janio de Freitas, na Folha de SP*
A torrente de acusações judiciais que,
de repente, voltou a cair sobre Lula, Dilma Rousseff e até Fernando
Haddad —em contraste com o presente antecipado de libertação
do delator Antonio Palocci— até agora não teve êxito algum em sua
função extrajudicial. Não fez parecer que a continuidade de acusações
nega a finalidade, nas anteriores à eleição, de impedir a candidatura de
Lula e sua previsível vitória.
O próprio beneficiário do efeito
extrajudicial, Sergio Moro, facilitou o fracasso. Ao renegar a afirmação
de que jamais se tornaria político, e incorporar-se ao governo que
ajudou a eleger, mais do que desmoralizou o seu passado de juiz —como
disse que aconteceria, se passasse à política. Tornou mais desprezível a
imagem do futuro governo e do país exposta a cada dia pela imprensa
mundial.
Voltamos a ser um país com algumas
originalidades musicais, carnavalescas, geográficas, mas um país
atrasado de um povo atrasado. E não há o que responder.
Onde, no mundo não atrasado, um juiz
faria dezenas de conduções coercitivas ilegais, prisões como coação
ilegal a depoentes, gravações ilegais de acusados, parentes e advogados,
divulgação ilegal dessas gravações, excesso ilegal de duração de
prisões, e sua impunidade permanecesse acobertada por conivência ou medo
das instâncias judiciais superiores? Condutas próprias de ditadura, mas
em regime de Constituição democrática.
No mundo não atrasado, inexiste o país
onde um juiz pusesse na cadeia o líder da disputa eleitoral e provável
futuro presidente, e deixasse a magistratura para ser ministro do eleito
por ausência do favorito.
O juiz italiano da Mãos Limpas tornou-se
político, mas sua decisão se deu um ano e meio depois de deixar a
magistratura. Moro repôs o Brasil na liderança do chamado
subdesenvolvimento tropical, condição em que a Justiça se iguala à
moradia, à saúde, à educação, e outros bens de luxo.
A corrupção financeira tem equivalentes
em outras formas de corrupção. A corrupção política, com transação de
cargos ou postos no Legislativo, por exemplo. A corrupção sexual, a
corrupção do poder das leis por interesses políticos ou materiais.
Combater uma das formas não gera a inocência automática em outras.
A maneira mesma de combater a corrupção
pode ser corrupção imaterial. Ao falar dessa variedade de antiética e
imoralidades, no Brasil fala-se até do Supremo Tribunal Federal. A
transação do seu presidente, Dias Toffoli, e do ministro Luiz Fux com
Michel Temer, para um aumento em que os primeiros e maiores
beneficiários são os ministros do STF, ajusta-se bem a diversos itens daquela variedade.
Sergio Moro é dado como futura nomeação de Bolsonaro para o Supremo. Muito compreensível.
*Janio de Freitas (foto) é Jornalista. Publicado originalmente no jornal Folha de São Paulo.
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