Por Lenio Streck*
Eis uma saia justa para o judiciário brasileiro.
E, como mostrarei, para a PGR.
Explico: Está pacificado no Supremo Tribunal que tratados sobre direitos humanos valem mais do que leis.
Por
exemplo, o Código de Processo Penal poder ser superado por um tratado. O
que importa, mesmo, é que o artigo 5º., § 2º., da CF, dá azo a que se
dê obrigatoriedade a tratados que tratem de direitos humanos.
É o
que se chama de bloco de constitucionalidade. Por essa tese – que
chamamos de monista - é possível sustentar a obrigatoriedade quando se
trata de direitos humanos. É o caso da decisão do Comitê de DH da ONU.
O
Brasil firmou esse pacto que trata da competência do Comitê de direitos
Humanos da ONU sobre assuntos desse tipo. É uma obrigação jurídica,
politica e moral.
O artigo primeiro é claro. Não esqueçamos que o
então Presidente do Senado Federal, José Sarney, por aprovação do
Congresso Nacional, promulgou o Decreto Legislativo nº 311, de junho de
2009, incorporando o Pacto ao ordenamento brasileiro.
Isso é muito sério.
Como
sempre, essa discussão acabará no STF. Claro que os advogados do
ex-Presidente podem usar a decisão da ONU como preliminar na defesa das
impugnações ao registro. De todo modo, o competente para dizer a palavra
final é o STF acerca do cumprimento ou não da decisão. Mas deveria ser
pacífico esse cumprimento.
Ou seja, há um fato: existe decisão
internacional que, no caso, em caráter provisório, dá um comando à
justiça brasileira, por mais contestações que isso venha a gerar no meio
politico e jurídico. O comitê da ONU decidiu o tema-Lula baseado no
Protocolo Facultativo ao Pacto de Direitos Civis e Políticos. Esse
tratado foi ratificado pelo Brasil em 1992. O STF diz que esse tipo de
tratado é supralegal, ou seja, o tratado vale mais do que qualquer lei.
Simples assim.
E tem mais um detalhe interessante: na ADPF 320,
que o PSOL impetrou sobre uma decisão da Corte Interamericana que
condenou o Brasil à época, a posição da Procuradoria Geral da República
vai nessa linha da obrigação de cumprimento de decisão internacional. Há
uma parte no parecer de Rodrigo Janot em que ele diz: "não é admissivel
que, tendo o Brasil se submetido à jurisdição da CIDH, por ato de
vontade soberana, despreze a validade e a eficácia da sentença. Isso
significa flagrante descumprimento dos compromissos internacionais do
país". A ver, pois. Não é desarrazoado afirmar que a decisão do Comitê
da ONU, ainda que provisória, é equiparável à decisão da CIDH. Portanto,
vamos ver o que dirá a PGR, agora. Se levarmos em conta a posição de
Janot, então chefe da PGR, cabe ADPF junto ao STF para fazer cumprir a
decisão do comitê da ONU. O Brasil deve tomar cuidado para não ficar
mal no contexto internacional.
*Lenio Streck, professor e
advogado, ex-Procurador de Justiça, membro catedrático da academia
brasileira de direito constitucional.
Fonte: Carta Maior
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